Notícias admin 4 de novembro de 2014 (0) (71)

Duas maratonas, duas vitórias!

Depois de correr a Maratona de Boston em abril deste ano, aproveitei para passear na região com a minha esposa, Cristina, e no final de semana seguinte, fomos para Nova York. Aproveitei para pesquisar se haveria alguma prova no Central Park nessa data e descobri que no domingo seria realizada uma corrida de 4 milhas. Até então, sempre segui o que é recomendado por quase todos e esperei pelo menos uns 20 dias para voltar a competir depois os 42 km. Mas como estava por lá mesmo e a distância era curta, achei que valeria a pena correr com seis dias de intervalo e ver o que aconteceria. O resultado foi animador: fiz meu melhor tempo na distância, terminando os 6,43 km em 23:38, com média de 3:40/km.
Quando comecei a traçar o roteiro para uma viagem no segundo semestre, encontrei duas pequenas maratonas na Califórnia, em finais de semana consecutivos, e com a distância entre elas possível de ser coberta de automóvel. Apresentei a ideia para a Cristina, que apoiou de imediato; afinal de contas, é difícil resistir a um convite para passear na Califórnia.
A primeira prova seria em 20/10 em Cloverdale, cidade de 8.500 habitantes, situada 140 km ao norte de São Francisco, às margens da rodovia US-101. A segunda, em 27/10, em Paso Robles, uma cidade maior, com população de 35 mil pessoas, e situada no meio do caminho entre São Francisco e Los Angeles, e às margens da mesma rodovia US-101.
Embora as cidades distem quase 500 km uma da outra, a região entre elas tem muito coisa interessante para se conhecer e, por isso, com apenas uma semana disponível, é necessário selecionar apenas parte das atrações, deixando muita coisa boa para uma próxima vez.
Cloverdale e Paso Robles apresentam algumas características em comum: ambas estão em regiões produtoras de vinho e o clima nessa época do ano é muito parecido: extremamente seco, noites frias – com a temperatura na faixa de 5 a 8°C – e muito sol durante o dia – com os termômetros atingindo a faixa de 28 a 30°C.
Os dois eventos também têm suas semelhanças: ambos contam com a palavra "harvest" (colheita) em seus títulos, já que esta é a época da colheita da uva, os percursos não são planos e percorrem estradas rurais asfaltadas, ladeadas de vinhedos e com belas paisagens. A principal diferença é a localização das maiores subidas: em Cloverdale elas ficam no final do trajeto e, em Paso Robles, na primeira parte. As largadas e chegadas são em vinícolas, o trânsito não é fechado e todo o pessoal que trabalha nas provas é voluntário. Nas duas maratonas, existe também a opção de distâncias mais curtas: 21 e 5 km. Em Cloverdale, a meia encoraja a participação de caminhantes, sendo o tempo limite de 5 horas.

POUCOS PARTICIPANTES. O número de concluintes nos 42 km é pequeno (neste ano foram 42 em Cloverdale e 59 em Paso Robles) e os tempos dos ganhadores, nos anos anteriores, foram ligeiramente superiores a 3 horas, o que me permitia sonhar com uma boa colocação na classificação geral, pelo menos na primeira delas. Antes de viajar, eu brincava com os amigos, dizendo que, com certeza, eu chegaria entre os 100 primeiros colocados.
Embarquei em São Paulo na quinta à noite e após uma cansativa viagem que levou mais de 24 horas, chegamos em Cloverdale para o jantar de sexta-feira. Considerando o cansaço da viagem e a diferença de 5 horas no fuso, pensei que era melhor ter previsto pelo menos um dia a mais para descansar antes da corrida. A retirada do kit foi no sábado, logicamente sem filas ou confusões, existindo ainda a possibilidade da retirada e até da inscrição serem feitas logo antes da largada, como é comum em provas norte-americanas, com exceção das grandes maratonas.
A largada aconteceu às 7h30, logo após o dia clarear, e o organizador, depois de saudar os competidores e dar algumas explicações sobre o evento, disse que neste ano dois competidores tinham viajado milhares de quilômetros para estar ali e solicitou que o inglês e o brasileiro levantassem a mão para se identificar e receber as saudações dos demais participantes. A largada era em conjunto com a meia e, mesmo assim, depois do segundo km, eu e outro maratonista, bem mais jovem, estávamos correndo juntos na ponta da prova. A partir do km 5, ele começou a ficar para trás e, quando passei novamente próximo da largada, no km 18, a vantagem já era suficiente até para saudar minha esposa, parando para um rápido beijo antes de seguir para o sul na segunda parte da prova.
A temperatura começou a subir, o sol estava muito forte, e nessa parte percorri longos trechos absolutamente desertos – só via alguém nos postos de hidratação, ou seja, a cada 3,5 km. Tive medo de me perder, mas o percurso era muito bem sinalizado e não houve problemas. No km 30, o trajeto tinha um retorno, permitindo medir a vantagem, que, nesse momento, era maior que 1 km para o competidor que estava na segunda posição. Mesmo assim, devido à pouca familiaridade com a liderança de uma competição, corri os últimos 12 km com receio de ser alcançado e continuei forçando o ritmo, terminando em primeiro lugar geral com o tempo de 2:58:04; o segundo colocado fechou em 3:15:00. Depois de fazer uma boa refeição pós-conclusão e dar entrevista para um jornal local, recebi a premiação: um pequeno troféu, quatro garrafas de vinho e duas de cerveja.

42 KM AFERIDOS. Seguimos viagem e, durante a semana, só treinei por 12 km na quarta e na quinta-feira, principalmente pelo prazer de correr em lugares diferentes. Nos outros dias procurei não me cansar muito e, na medida do possível, não pensar na segunda maratona.
Chegamos em Paso Robles no sábado e fomos direto para retirar o kit na vinícola, a mesma onde seria dada a largada, às 7h no domingo. Nesse momento já foi possível notar que essa prova seria mais "profissional", tanto pelo nível dos participantes como pela sua organização. Apesar de também ser uma maratona modesta (como inúmeras nos Estados Unidos, por vezes sem qualquer premiação), o percurso é oficialmente aferido e qualifica para Boston.
No domingo, com o dia ainda escuro, ao chegar para a largada, notei que a temperatura estava mais baixa do que o esperado, mas mesmo assim resolvi iniciar de regata e sem luvas, uma vez que o sol logo iria aparecer e a temperatura aumentar. Sofri um pouco apenas no início, principalmente nas mãos, que doíam um pouco e dificultavam os movimentos necessários para hidratação e alimentação.

ERRO DE PERCURSO. Depois de uns dois quilômetros, quando as posições começaram a estabilizar, eu estava na terceira posição, porém o batedor de bicicleta que vinha ao meu lado informou que os dois que estavam na frente eram atletas da meia. No km 8 há uma separação e, para os que estão na maratona, começam as subidas. A partir daí, com pouca gente por perto, deu para notar que havia outro atleta me seguindo e mantendo uma distância de uns 50 metros. No km 18, havia um cone no meio da estrada e duas mulheres ao lado de um carro no acostamento. Nesse momento, o batedor que me acompanhava estava um pouco mais atrás, as mulheres não se manifestaram e segui em frente. Depois de uns 70 metros, comecei a ouvir gritos e, ao olhar para trás, vi o batedor e o segundo colocado me chamando. Aquele cone era um ponto de retorno.
Com isso, perdi a liderança e tive de apertar um pouco o ritmo para alcançar o primeiro colocado. Começamos então a correr praticamente juntos, alternando posições às vezes, mas sempre mantendo apenas alguns metros de distância. Eu estava temendo o final da prova, nunca havia corrido duas maratonas seguidas e não sabia o que poderia acontecer. Por outro lado, o adversário tinha uns 30 anos e eu sabia que se a decisão ficasse para o final, minhas chances seriam pequenas.
A partir do km 30, percebi que ele estava falando menos com o pessoal dos postos de hidratação e, no km 37, ele deixou a distância aumentar ligeiramente. Como estava me sentindo relativamente bem, era hora de tentar forçar o ritmo. A estratégia funcionou. Ele não acompanhou e, depois da última curva, quando já é possível avistar o pórtico da chegada, embora ainda faltem quase 2 km, dei uma olhada para trás e o batedor me tranquilizou, dizendo que eu estava só. Terminei novamente em primeiro, com o tempo de 2:56:33, e o segundo colocado, que tinha vencido no ano anterior, concluiu em 2:57:52. Um fato interessante foi que o batedor mantinha contato com o locutor da prova, que assim ia informando para as pessoas que estavam na chegada o andamento da maratona.

PRÊMIO: VINHO E CERVEJA. Também dessa vez tinha muita comida e música na chegada e os prêmios foram uma medalha, uma garrafa de vinho de dois litros autografada pelo produtor e uma caixa com 24 garrafas de cerveja de outro produtor local. O vinho deu para trazer, mas as cervejas tivemos de tomar algumas e distribuir a maior parte para a alegria dos funcionários dos hotéis.
Meu treino para essas provas foi baseado em grande volume, estratégia que venho seguindo desde que tive duas contusões no ano passado, durante treinos intervalados. Estou com 54 anos e penso que os treinos muito intensos representam um risco maior para mim do que para atletas mais jovens. Fiz de agosto a outubro 16 longos acima de 32 km e, na semana de pico, que terminou três semanas antes da primeira maratona, o volume chegou a 170 km. A intensidade ficou por conta de treinos de ritmo que fiz nas três semanas que antecederam as provas, simultaneamente a uma redução nos volumes de treino.

DICAS DO CAMPEÃO. Minhas recomendações para quem for viajar e quiser fazer mais de uma prova, mantendo a performance, são:
– Treinar adequadamente para as distâncias das competições.
– Descansar e se alimentar bem antes, durante e depois das provas.
– Escolher eventos com pelo menos uma semana de intervalo.
A emoção de ganhar duas maratonas foi muito grande, principalmente por ser uma conquista que jamais eu poderia imaginar um dia acontecer!

INFORMAÇÕES. Os sites para informações sobre as provas são:
Cloverdale – www.runthewinecountry.org
Paso Robles – www.harvestmarathon.com
Maratonas no exterior – www.marathonguide.com
Corridas nos EUA – www.runningintheusa.com

João Theoto Júnior é assinante de Jundiaí.

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