O conceito de consumo máximo de oxigênio durante exercício é atribuído a A. V. Hill, e suas pesquisas datam de 1920. Hill foi o primeiro cientista a medir o consumo de oxigênio (o seu próprio), enquanto corria. O que ele percebeu foi que quando corria a 16 km/h seu consumo de oxigênio era mais alto que em todas as velocidades menores, e pela sua sensação de desconforto parecia não haver nada além disso.
Independente da falha metodológica de não haver testado velocidades mais altas, Hill idealizou o conceito de que, durante o exercício, o consumo de oxigênio aumenta de acordo com a intensidade, até que atinja um ponto máximo, onde alguma parte da cadeia de oferta e extração de oxigênio pelo sangue e músculos será exigida em sua máxima capacidade.
Este conceito foi desevolvido por outro pesquisador, Taylor, com um famoso estudo publicado em 1955. Taylor mostrou que quando corredores faziam testes de 3 minutos de corrida, sempre correndo a 7 milhas por hora, porém aumentando a inclinação da esteira em 2,5% a cada teste, o consumo de oxigênio crescia até um certo ponto, e a partir daí mudava nada ou muito pouco, até que o teste atingisse um nivel de inclinação em que os corredores fossem incapazes de correr por 3 minutos.
Este trabalho foi o responsável pelo conceito de platô do consumo máximo de oxigênio. Ou seja, durante um teste de esforço onde as cargas aumentam progressivamente, o consumo de oxigênio irá crescer de acordo com a intensidade, atingindo um ponto em que a capacidade do organismo em utilizar oxigênio chega ao seu máximo, e a partir daí, mesmo que a intensidade aumente (demanda por oxigênio elevada) o consumo permance o mesmo.
COMO FAZER O TESTE? Não é meu propósito (nesta edição) discutir a validade desse conceito. O fato é que esta é a teoria dominante e milhares de corredores realizam este teste para saber mais sobre seu consumo máximo de oxigênio e outras variáveis obtidas durante a avaliação. O melhor a fazer, então, é informar os leitores sobre o que relamente esperar dos resultados e como saber qual o teste mais indicado a se fazer.
A primeira preocupação obviamente é a modalildade em que o teste será feito. Para corredores, independente do objetivo do teste, não faz o menor sentido ser testado em uma bicicleta se uma esteira estiver disponível. A próxima preocupação deve ser o protocolo (normas e dados referenciais) da avaliação, a forma com que a velocidade e a inclinação da esteira irão variar. Existem alguns protocolos clássicos para testes de esforço, como o teste de Bruce, mas na verdade em corredores saudáveis as possibilidades são inúmeras.
O importante é que seu teste seja compatível com sua realidade de corrida, caso o objetivo seja utilizar as informações para obter parâmetros de treinamento. Por exemplo, por que fazer um teste em baixa velocidade e com a inclinação aumentando aos montes em cada novo estágio se você jamais corre em subidas? O teste deve ser, dentro das possibilidades da esteira, similar à sua realidade de treino e competição, envolvendo as velocidades em que você normalmente se exercita. É aceito que um teste ideal para atingir o consumo máximo de oxigênio deve durar entre 6 e 12 minutos, então é importante levar em consideração a intensidade inicial e o grau de aumento e duração de cada estágio para tentar ficar dentro destes parâmetros.
COM E SEM FREQUENCÍMETRO. Uma vez definido o teste, é hora de saber o que estará sendo medido. Para medir a frequência cardíaca, a eletrocardiografia é sempre preferível ao uso de um frequencímetro comum. Isso porque através do eletrocardiograma (gráfico indicando as diferentes fases da contração e relaxamento cardíaco) é possível verificar a existência de falhas no coração que só aparecem após determinados níveis de esforço.
Esta, aliás, é a razão pela qual todos devem se submeter pelo menos a um eletrocardiograma de esforço antes de começarem a treinar: alguns males podem ficar ocultos durante o repouso, se manifestando apenas durante o exercício. Por outro lado, fazendo o teste com um frequencímetro somente lhe dará a frequência cardíaca ao longo do teste, sem qualquer informação sobre a "qualidade" dos seus batimentos cardíacos.
Muitas vezes os eletrocardiogramas de esforço sugerem um valor para o VO2max. Isto é feito a partir de equações que irão combinar a idade da pessoa, o estágio atingido durante o teste e a frequência cardíaca. Neste caso a informação é de pouco valor para o treinamento, apesar de servir relativamente bem para categorizar indivíduos quanto à sua aptidão física geral.
Testes que realmente façam a medida do consumo de oxigênio requerem que o corredor utilize uma máscara ou um bocal para que o ar expirado seja coletado. O raciocínio por trás da medida é relativamente simples: nesta máscara há uma pequena turbina. A turbina gira cada vez que o ar passa por ali, durante as inspirações ou expirações. Com isto um software irá calcular qual é o volume de ar expirado a cada respiração. Essa será sua informação de ventilação por minuto.
Após passar por esta turbina, o ar expirado irá passar por sensores capazes de detectar sua concentração de gás carbônico e oxigênio. Como a concentração do ar ambiente (que você inspira) é conhecida, o sistema calcula a diferença de concentrações entre o ar expirado e o inspirado para chegar à quantidade consumida de oxigênio e a produzida de gás carbônico. Com isso, a maioria dos sistemas é capaz de informar os valores de consumo de oxigênio, produção de gás carbônico e outras variáveis respiratórias a cada respiração.
No entanto, a fim de reduzir possíveis erros de medida, estas informações geralmente são utilizadas como médias de 1 minuto ou 30 segundos. Os valores de VO2 são geralmente expressos em litros por minuto ou então em mililitros por quilograma de massa corporal por minuto, para fazer frente à grande diferença de massa corporal entre as pessoas. Corredores de elite geralmente apresentam valores altos, na casa de 70 a 85 ml.kg-1.min-1. Apesar disso, não é incomum encontrar valores abaixo destes e é incorreto pensar que o maior VO2max vence a prova.
Veja no gráfico, um exemplo de um teste de VO2 apresentado com médias de 5 segundos ou 30 segundos. Repare como a média de 30 segundos "suaviza" os valores. Repare também como neste teste o consumo de oxigênio perde a linearidade ao final do teste, de encontro à teoria de que o consumo de oxigênio atinge o seu máximo.
NEM TODOS CHEGAM AO MÁXIMO. As informações de VO2 podem ser usadas de diversas formas. Geralmente, quando um teste se parecia com o da figura se dizia que o corredor atingiu seu VO2max, enquanto que caso não houvesse esta perda de linearidade se chamava de VO2 de pico, pois o corredor não havia sido capaz de chegar ao seu "teto" fisiológico. Felizmente inúmeras pesquisas já desmancharam esta idéia, apesar de ela ainda ser vendida por aí.
Ao que parece, algumas pessoas simplesmente não chegam a este platô, e isto ocorre mesmo com atletas olímpicos, enquanto que corredores amadores (como o da figura) podem mostrar este comportamento. A razão para isto é desconhecida, mas a mensagem importante é que ninguém deve ser desencorajado por ter atingido um platô não muito alto ou por não ter atingido o ponto esperado.
Os valores de VO2 durante o teste devem ser comparados com futuros testes de esforço, que dentro do possível devem ser sempre realizados com o mesmo protocolo. Com isto é possível fazer diversas comparações sobre os valores máximos: o tempo de exaustão e velocidade máxima atingida lhe darão uma idéia de seu condicionamento como corredor, e o valor de VO2max pode ser comparado junto, para avaliar o quanto suas mudanças em performance são dependentes das mudanças no consumo máximo de oxigênio.
Além disso, o consumo de oxigênio durante os estágios submáximos também pode ser comparado, para que se avalie sua "economia de corrida", que é basicamente o quanto você usa de oxigênio para correr numa velocidade. Em tese, se sua economia melhorar você passa a ter mais oxigênio para utilizar em estágios posteriores, mesmo que seu valor máximo não mude.
Existem outras possibilidades de avaliação e limitações nos testes, mas estas ficam para a edição de outubro. Caso algum leitor tenha alguma dúvida mais específica, mande para o e-mail que tentarei incluí-la na próxima matéria!