Algumas maratonas têm como público predominante os chamados "corredores sérios", ou seja, aqueles que vão para os 42 km devidamente treinados ou que acreditam terem se preparados o melhor possível. Lá fora, podemos citar Boston, Roterdã e Berlim nessa categoria, enquanto aqui o destaque é sem dúvida Porto Alegre.
Em comum entre elas a dobradinha percurso e clima favoráveis, sabidamente os dois principais fatores que influenciam os resultados tanto de profissionais como amadores. Com as maratonas de São Paulo e Rio acontecendo este ano em épocas não muito propícias (abril e maio, respectivamente), aqueles que tinham como meta um novo recorde pessoal, uma marca rápida ou uma estreia menos difícil foram à capital gaúcha, e não devem ter se arrependido.
O frio até exagerado (em torno de 5 graus na largada às 7 horas) não chegou a prejudicar, bastando sair mais agasalhado. No percurso quase todo plano, praticamente nenhum público, o que igualmente não chega a ser um fator muito importante para quem está correndo focado no ritmo. Aliás, ao contrário de outras maratonas que já fiz, chamou a atenção o "silêncio" entre os participantes, especialmente na segunda parte, quando os maratonistas já não tinham a companhia dos que faziam os 21 km. Plateia mesmo apenas nos 200 metros finais.
Largada ainda no escuro, com os inscritos das provas menores atrapalhando um pouco a chegada ao pórtico, mas como o que vale é o tempo líquido, tudo bem. A baixa temperatura estimulava todo mundo a correr rápido e eu não fugi a essa regra; procurei me "policiar" para começar perto do ritmo médio de 6 min/km, que era a meta para conseguir o índice para Boston (4h20). Mas acabei passando os 10 km em 55 minutos, sem forçar, o que me animou, mas também me deu um sinal de alerta, já que em Santiago e Punta tinha feito a primeira metade abaixo do que devia, e depois quebrei.
Então reduzi o ritmo e assim fui até a marca da meia-maratona, que cruzei em 1h59, novamente animador, mas agora sentindo maior segurança, apesar do sempre fantasma das cãibras, que me persegue. Como prevenção, estava excepcionalmente usando calça legging, o que dá uma proteção muito boa e não incomoda. O último longão, de 37 km, feito duas semanas antes, no ritmo de 5:50/km, me dava enorme confiança, e efetivamente tudo seguiu muito bem, fazendo a parte final com tranquilidade, já que tinha uma grande folga em relação ao meu objetivo, finalizando em 4h03, portanto 20 minutos a menos que o necessário para garantir a inscrição em Boston 2017.
ELITE E AMADORES. Premiação fraca não atraiu africanos e nem mesmo atletas de elite nacionais de expressão. A vitória foi de João Marcos da Fonseca, em 2:21:37, seguido de Mateus Trindade (2:23:27), Elson Gracioli (2:25:10), Vinicius Bernardo (2:27:25) e Raphael Magalhães (2:30:54). No feminino, Valquíria Marques Oliveira venceu em 2:56:37, vindo depois sua treinadora Dione D´Agostini (3:01:58), Luciana de Lima (3:03:45), Daine Moreira (3:07:48) e Elizabeth Esteves (3:07:59).
No total, completaram 2.209 corredores, sendo 1.710 homens e 490 mulheres. Um crescimento de 14,5% sobre os 1.929 concluintes de 2015, confirmando a maratona gaúcha como a terceira maior no país, depois do Rio e São Paulo, mas próxima com a de Curitiba, prevista para o dia 20 de novembro.
Prós e contras
Pela terceira vez corri a Maratona de Porto Alegre. Neste ano, um ponto positivo foi a mudança do início e término da prova para o Parque Harmonia, bem mais centralizado e de fácil acesso aos hotéis. Como boa parte dos corredores vêm de fora, essa alteração foi importante. O percurso ficou ainda mais plano, com os primeiros 21 km muito rápidos, pelas longas retas e poucas curvas. No segundo, vários retornos em 180 graus atrapalhava um pouco os mais velozes.
A edição 33 de Porto Alegre pode ser dividida em duas partes. Uma altamente positiva e que merece elogios: o dia da corrida. A prova foi "redonda", com largada no horário, marcação correta dos quilômetros e placas bem visíveis, e boa hidratação com água e isotônico (além de banana e mexerica).
Na sexta-feira, a entrega dos kits foi tranquila, porém acabou cedo, às 19h, e muitos foram obrigados a voltar à loja do shopping no dia seguinte. Mas a amadora estrutura montada não comportou a demanda no sábado, e longas filas se formaram, obrigando muito gente a esperar até 2 horas!
No domingo, o problema teve relação com o pós-prova, não se divulgando os resultados na arena do evento, nem realizando a premiação por faixas etárias e tampouco no geral da maratona; apenas nos 21 km houve a solenidade. Muita gente passou horas esperando. Após a divulgação dos resultados na internet, na segunda, muitos corredores comentaram que não apareciam na relação.
Depois de Boston, em abril, quando o clima não ajudou com uma mudança climática forte de um dia para o outro, com calor e vento, fui para Porto Alegre com o objetivo de mais um sub 3h. Dessa vez, a temperatura foi uma aliada e consegui fazer uma prova controlada, do início ao fim, fechando em 2:55:52.
Vamos torcer para que a organização de Porto Alegre corrija os problemas em 2017, já estando pré-marcada a maratona para dia 11 de junho, com promessa de uma expo para a entrega dos kits.
(André Savazoni)
A sonhada estreia nos 42 km
Havia feito as mais diversas distâncias em corridas de rua. Porém, a maratona era uma prova que ainda não tinha conseguido inserir no currículo. Iniciei um treinamento em 2014 para enfrentar os 42 km, mas que acabou sendo frustrado por uma lesão. O sonho continuou, porém ficou por um período adormecido. Acabei inserindo outras atividades físicas em minha rotina, como natação, ciclismo e a musculação que já fazia como forma de fortalecimento.
Pela saúde utilizo o esporte como forma de controle, já que sou diabético tipo 1. Desta maneira, consigo monitorar de forma eficiente minha glicemia para deixá-la mais estável. Em 2015, comecei a treinar novamente corrida, foi aí então que no começo de 2016 estipulei como meta participar da Maratona de Porto Alegre. Foi um treinamento extenso, onde o treinador Marcelo Diniz teve bastante cuidado para que a lesão não surgisse novamente.
Quando iniciamos a preparação, a data da prova parecia muito distante, mas o tempo foi passando, os treinos fechando, alguns com dores e outros não. Devido ao diabetes, nos treinos longos, testei muita coisa com a finalidade de manter a glicose estável. Além da alimentação, tinha também que saber a dose de insulina que iria aplicar. Este controle requer certa logística, que deve ser bem pensada, conversada e debatida. Os testes foram feitos até terminar os treinos mais fortes.
Chega o tão sonhado dia da estreia nos 42.195 m. Logística para prova pronta, números de sachês de gel definidos. Optei em levar os géis de carboidratos todos comigo, pois iria utilizá-los a cada 40 minutos. Durante a prova fiz algumas reposições com Coca-Cola. Medi a glicemia durante a maratona para verificar a situação da glicose, que se encontrava sempre estável, para minha alegria.
Percorri a distância de forma conservadora, não tinha noção de como meu corpo iria se comportar e reagir. Afinal, nunca havia feito uma maratona, somente sonhado. Larguei com um amigo mais experiente em longa distância, o que ajudou para o controle do ritmo. Percorremos grande parte da prova juntos. Estava me sentindo motivado, talvez por estar correndo em casa, podendo dar um gás a mais para completar a prova, e foi o que fiz. Resolvi aumentar um pouco a velocidade, o corpo respondeu bem ao novo estímulo e segui em frente.
A chegada foi mágica, com centenas de pessoas incentivando nos metros finais. Era impossível não se emocionar. Em questão de segundos, vem à cabeça todo o período de preparação, as dificuldades encontradas durante essa fase e também todas as recusas que somos obrigados a fazer. Passado o pórtico de chegada, a sensação de dever cumprido e sonho realizado foram muito fortes.
(Luciano Vieira Martins)