Especial Performance e Saúde Redação 10 de julho de 2012 (0) (588)

Correr uma meia uma semana antes da maratona é recomendável?

Quem está se preparando para uma maratona sabe da dedicação necessária, da sequência de longões progressivos, chegando a até 30 ou 32 km, na maioria dos casos. Mas aí, surge uma dúvida: é interessante correr uma meia-maratona uma semana antes dos 42 km? A maioria dos treinadores ouvidos pela CR é contrária, mesmo que a planilha do final de semana anterior tenha 21 ou 24 km. Alguns até admitem fazer uma adaptação, dependendo das necessidades e da experiência do aluno, porém todos são unânimes ao afirmar que, correr a meia para tempo, nem pensar.

Tomaz Lourenço, editor da Contra-Relógio, pretende adotar a dobradinha três vezes nos próximos meses na busca pelo índice para a Maratona de Boston de 2013. Em julho, deverá fazer a Golden Four Asics Rio no dia 1º e a Maratona do Rio no dia 8, para já tentar o sub 4h10 exigido por Boston para corredores de 65 a 69 anos. Em agosto, no dia 5, correrá a Asics São Paulo para resultado e no dia 12 provavelmente a Maratona de Blumenau para rodagem e, em setembro, no dia 2 a Meia-Maratona da Praia Grande, para ritmo, e no dia 9 a Maratona de Punta del Este (Uruguai), visando melhorar o índice para a centenária maratona americana.

Há muitos leitores que também adotarão a medida, pelo menos em uma maratona prevista para os próximos meses, especialmente corredores cariocas. Pensando nisso, nesta edição, publicamos, além deste texto, uma planilha com as explicações do treinador Marcelo Augusti, colunista da CR. E fora aquelas 3 dobradinhas, surgiu mais uma, com a confirmação da Maratona de Londrina dia 26 de agosto, portanto uma semana depois da Meia-Maratona Internacional do Rio de Janeiro…

 

DUAS SEMANAS ANTES SIM. Júlio Góis, de Cuiabá e há cinco meses radicado em Florianópolis, é um dos treinadores que não indica correr uma meia-maratona na semana anterior aos 42 km. "Durante uma prova, a adrenalina, o entusiasmo, a competitividade e mais alguns outros fatores geralmente influenciam o corredor a ir um pouco mais além, a se esforçar mais do que deveria, então, faltando uma semana para a maratona, principalmente se o objetivo é tentar um recorde pessoal nos 42 km ou um bom resultado, não acho prudente, a não ser que seja um corredor muito experiente que saiba dosar o ritmo na meia para chegar na maratona descansado e na sua melhor forma", afirma Góis.

O treinador, porém, faz uma exceção. "Caso o atleta queira correr a prova, o ritmo ideal que julgo seria fazer no ritmo pretendido na maratona ou até dez segundos acima desse pace." De acordo com a metodologia adotada por Góis, o ideal seria participar de uma meia faltando duas semanas para a maratona. "Correndo no ritmo pretendido para os 42 km. Uma semana antes, prego como professor e atleta, rodar 16 km no ritmo previsto para a maratona."

 

APENAS TREINOS LEVES. Zeca Florentino, de João Pessoa, é outro treinador que não acha producente participar de uma meia a sete dias da competição principal, de uma maneira geral. "Baseado na periodicidade do treinamento, a semana que antecede uma maratona trata-se de um período de polimento, ou seja, aliviar a intensidade dos treinos para que o organismo possa se revigorar e sentir-se forte para a prova-alvo. Por essa razão, não se faz uma meia-maratona uma semana antes da maratona. Entretanto, dependendo do volume de treinos utilizado por atletas experientes, aqueles cujo volume semanal é muito alto e tendem para a ultramaratona, correr 21 km torna-se fácil", afirma Zeca. "Na preparação dos meus orientandos, a última semana consiste de treinos leves, adotando trotes até o penúltimo dia. Esse tipo de preparação tem dado certo, pois nossos alunos que resolveram encarar os 42 km obtiveram resultados expressivos, considerando o nível de condicionamento de cada um."

Segundo o treinador da Paraíba, na preparação que adota, uma meia é utilizada sempre como prova-teste para a maratona. "Porém, em um período que varia entre seis e quatro semanas antes da maratona. Já os longões têm distâncias bem maiores do que os 21 km, chegando até 32 km."

Para Paulo Santos, treinador e corredor em Vargem Grande Paulista, vários fatores influenciam a definição de correr uma meia na reta final da maratona e precisam ser analisados individualmente. "O nível do aluno, tempo de treinamento, objetivo na maratona, histórico de lesão, histórico de corridas anteriores, se é ansioso… enfim, eu precisaria conhecer muito bem o aluno para deixá-lo fazer uma meia na semana da maratona", explica.

De uma maneira geral, Santos pede para que seus alunos não corram uma meia a sete dias da prova-alvo, mesmo que esteja previsto um treino de rodagem de 20 km na semana anterior. "Em uma prova, mesmo não estando com o foco de competição pessoal, há necessidades que estressam muito, cansam demais, como acordar muito cedo, ficar ansioso, se locomover até o local da competição, a competitividade que a prova proporciona (levando o aluno a forçar o ritmo, mesmo não estando com este objetivo); enfim, acredito que não é recomendável a participação", afirma Santos. "Na minha equipe, utilizamos uma prova de meia-maratona pelo menos de três semanas a um mês antes da maratona. Como faremos para a Maratona do Rio do dia 8 de julho, quando participaremos de uma prova, com perfil intervalado (utilizando ritmo de rodagem e o ritmo que será utilizado na maratona) no dia 17 de junho, nos 25 km da Maratona de SP."

 

DILEMAS NA PERIODIZAÇÃO. O técnico Manuel Lago, do Rio de Janeiro, lembra que muito se fala, muito se faz e pouco se conclui sobre a preparação específica para os 42 km. "Até hoje, muitos treinadores discutem qual a melhor forma de periodizar uma planilha de treinos visando à maratona. Alguns consensos: ter feito entre 3 e 4 meias-maratonas e ter mais de 1 ano de corrida, além de não estar com sobrepeso corporal", diz. "Pairam dúvidas sobre qual maior quilometragem a ser rodada, 32, 35, 37 ou até mesmo 42 km, inclusive em qual semana anterior à prova seria esse pico. Eu gosto de trabalhar numa pirâmide que sobe – 21, 24, 27, 30 e 32 km – e desce – 30, 27, 24, 21 e maratona'"

Em relação ao ritmo de corrida nos longões, Lago pede para seus alunos correrem de 15 a 20 segundos acima do ritmo que querem fazer a maratona. "Isso porque treinos longos são desgastantes e vão reduzindo nossas reservas, visto que os amadores não vivem da corrida; é apenas um hobby levado a sério. É óbvio que dependendo do aluno, gosto de fazer treinos dobrados (manhã e noite ou noite e manhã do dia seguinte). Nesses casos prescrevo até mais que 42 km. Ex: 16 e 28 km ou 21 e 21 km. Para alguns alunos que têm uma autoestima duvidosa, gosto que corram 35 km. Mas, acima de tudo, prefiro que façam treinos baseados em tempo, sempre em função do estimado para completar a prova. Assim, costumo colocar meus alunos para um treino que abrange subidas, descidas e plano, que é feito por tempo."

Na preparação da maratona, Lago adota as meias-maratonas do calendário. "Acho viável usar uma meia para fazer tempo entre 5 e 7 semanas antes da prova, mas isso é totalmente discutível e varia de aluno para aluno. Este ano, porém, haverá uma situação inusitada. Na semana que antecede a Maratona do Rio de Janeiro (8 de julho), há uma meia (Golden Four Asics Rio, dia 1º de julho) que todos os alunos querem fazer. Nesse caso, adotei uma estratégia de prova que venha a determinar com maior precisão o ritmo que querem fazer os 42 km. Pedi que corram 18 km no ritmo pretendido na maratona e nos últimos 3 km, negativar o ritmo até quanto aguentarem. Assim, acredito que o ritmo a correr a Maratona do Rio ficará mais preciso", explica o treinador carioca, que lembra um regra usada por ele diariamente: "Sabendo que na corrida não existe certo e errado, tente entender para quem e porque foi feita aquela planilha."

O técnico Marinho Faralhi, de Bragança Paulista, também não concorda com a disputa de uma meia-maratona uma semana antes dos 42 km. "Neste momento, a periodização deve priorizar atividades que favoreçam o mecanismo de supercompensação. Na metodologia que adoto, proponho aos alunos que continuem correndo com a diminuição do volume e da intensidade nas duas semanas que antecedem a prova-alvo", afirma. "Tenho preparado planilhas que admitem a disputa de uma meia após a oitava semana de treinamento em um macrociclo de 16 semanas. Adoto longões com aumento de 15 a 20% da distância a cada três semanas, finalizando com 34 km duas semanas antes da maratona."

 

PARA OS COMPETITIVOS, UM PROBLEMA

O médico Carlyle Barral, de Belo Horizonte, considera essencial encaixar provas de 10 km e, principalmente, meias-maratonas na preparação para uma maratona. "É o que vai dar ao corredor a medida de como está seu treinamento e o seu desempenho no ambiente de competição, que todos sabemos ser bem diferente dos treinos", diz. "É na competição que temos a oportunidade de exercitar a capacidade de manter o foco durante uma prova para alcançar a meta traçada e, até mesmo, nos dar o direito de cometer erros, para não repeti-los na prova-alvo."

Segundo ele, se for para participar de uma meia uma semana antes da maratona, o ideal é que seja para ritmo. "Você não vai querer correr o risco até mesmo de se lesionar e jogar fora toda a preparação feita. Porém, como sou competitivo, daqueles que quando coloca o número de peito já pensa no recorde pessoal, nem passo perto da inscrição da meia", afirma Carlyle.

Nos treinamentos para a Maratona de Belo Horizonte, disputada dia 29 de abril (concluída em 3h32), Carlyle correu três provas na reta final, no mês dos 42 km – dia 1º, Golden Four Asics BH (21 km); dia 14, Ragga Night Run (10 km) e dia 15, Eco Run (10 km). "Todas para fazer tempo, mas na semana anterior da maratona houve uma prova de 10 km bacana aqui em Belo Horizonte, que passei longe."

 

FOZ E PORTO ALEGRE: A LIÇÃO

Apesar de já ter realizado inúmeras dobradinhas, correndo uma meia (ou treinando 21 km) na semana anterior de uma maratona, com bons resultados, uma vez essa tática não deu certo, considerando-se que a prova-alvo era os 42 km.

Foi em 2010, quando fui convidado a participar da Meia das Cataratas. Na época estava treinando para a Maratona de Porto Alegre, que aconteceria no domingo seguinte, e então decidi fazer os 21 km como teste final. Em função de minha preparação visando completar na capital gaúcha em torno de 4 horas, imaginei que se corresse para 2 horas em Foz do Iguaçu seria um bom treino, uma vez que o percurso era cheio de subidas e descidas.

E sem dúvida não é um trajeto fácil, mas em compensação no dia o clima estava perfeito, nublado com chuvinha. E lá fui eu, me sentindo muito bem e me surpreendendo com o ritmo de 5 minutos/km. Pensei em reduzir, mas estava tudo tão fácil que decidi continuar nessa toada até onde fosse possível e acabei fechando em 1:46:48, meu recorde nos últimos anos!

Em função desse resultado e por não ter acabado esgotado, imaginei que correria muito bem em Porto Alegre, possivelmente até em menos de 4 horas. Mas não foi isso que aconteceu…

Comecei a maratona já sem muito ânimo e as coisas só foram piorando. Não conseguia entender e lá pelo km 30 passei a intercalar caminhada com a corrida, me arrastando até o final para a minha pior marca nos 42 km: 4h37. Depois descobri que tinha feito a prova com uma gripe que viria forte já na segunda-feira, mas de qualquer forma o fato de ter exagerado em Foz deve ter sido a principal razão para a má performance em Porto Alegre. (Tomaz Lourenço)

 

 

 

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