Especial admin 4 de outubro de 2010 (0) (112)

Afinal, Caminhar Serve Para Alguma Coisa?

"Você não precisa entrar em uma academia, nem checar sua freqüência cardíaca. Simplesmente desligue a televisão e saia para uma caminhada", disse recentemente o médico James Levine, especialista em obesidade da famosa Clínica Mayo, nos Estados Unidos, a respeito de movimentar o corpo para se obter benefícios à saúde. Simples assim? Sim. Mas vamos com calma.

É claro que um esforço físico por menor que seja – como ir a pé à padaria ou subir dois lances de escada – é melhor do que nada. É o primeiro passo para começar a sair do sedentarismo e, vendo por esse lado, essas pequenas ações do cotidiano trazem benefícios.

"Conheço pessoas que pensam que não fazem exercício só por não freqüentarem uma academia e sentem-se culpados por isso. Quando pergunto sobre detalhes de seu dia-a-dia, descubro que são muito mais ativas e criativas em seus movimentos que muitas outras matriculadas em grandes centros esportivos. O quão ativo você é não pode ser medido só em quilômetros ou em repetição de movimento. Ser ativo também é aprender novas formas de fazer movimentos cotidianos como abaixar, levantar, subir uma escada e readquirir ou aprimorar a agilidade", diz o professor de educação física Alexandre Duarte, que atualmente mora em Santa Fé, Novo México, nos Estados Unidos, onde desenvolveu uma técnica chamada Integral Walking (www.aleduarte.com).

Agora, considerar apenas isso como atividade física, com objetivo de perder peso ou ganhar condicionamento, por exemplo… Calma lá! "Não se iluda: não é o suficiente para operar grandes mudanças em sua vida", alerta Marcelo Ortiz, mestre em fisiologia do exercício e treinamento esportivo pela Unesp, coordenador dos projetos de pesquisa na área de prescrição do treinamento pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e professor da BrEsporte Assessoria Esportiva.

Até porque é necessário imprimir ritmo e freqüência nos movimentos. "A Faculdade Americana de Medicina Esportiva prega que se deve realizar pelo menos 30 minutos de atividade física por dia, de três a cinco vezes por semana, com intensidade mínima de 66% de sua freqüência cardíaca máxima (para calcular a FCM use a fórmula 220 – sua idade), de forma contínua ou acumulada. Ou seja, faça sua meia horinha de caminhada direto ou em três etapas de 10 minutos ao longo do dia", completa Carlos Eduardo Polazzo Machado, mestre em fisiologia do exercício e treinamento esportivo pela Unesp, coordenador do setor de treinamento e condicionamento físico do CEPE/Unifesp/EPM e também professor da BrEsporte Assessoria Esportiva.

E por que 10 minutos consecutivos? A explicação é a seguinte: a freqüência cardíaca leva de 2 a 5 minutos para atingir o patamar desejado para a obtenção de benefícios. Se você anda e pára, como em uma voltinha no shopping olhando as vitrines, o músculo cardíaco reage e volta para o repouso, ou seja, não imprime ritmo ao trabalho.

Ok, você pode usar a ida à padaria ou ao shopping como atividade física, mas que essa caminhada dure pelo menos 10 minutos e faça seu organismo perceber o exercício. "Deve ser confortável, porém é necessário sentir um certo esforço. Numa escala de zero a 10, onde zero seria o ‘passeio na praia' e 10 ‘a corrida na maratona', a pessoa tem de ficar entre 6 e 7", explica Marcos Caetano, especialista em fisiologia do exercício e professor de educação física do Instituto Vita, de São Paulo.

UM PASSO ATRÁS DO OUTRO. Os especialistas são unânimes em afirmar: quem quer iniciar uma atividade física básica deve começar por caminhar, especialmente sedentários, aqueles que estão acima do peso, têm hipertensão, diabetes ou outro tipo de enfermidade. Com a adaptação do corpo à nova rotina, aos poucos ocorrem progressos. Mas quanto tempo será necessário para uma caminhada virar trote ou corrida? "O corpo é inteligente e aprende a reagir aos estímulos. Porém, depende do ritmo de cada um. O aumento de volume no treinamento pode levar de 6 a 12 semanas", diz o professor Carlos Eduardo Polazzo.

Parece mesmo ser um processo natural: da caminhada, passa-se para a caminhada vigorosa, logo o corpo ‘pede' um trotinho e depois vem a corrida. "O nosso sistema nervoso já veio com esse ‘software' de movimento pré-instalado. Andar, andar mais rápido, correr, correr mais rápido… É uma das nossas habilidades inerentes de sobrevivência, de luta e de fuga. É primeiramente instintiva e freqüentemente exigida no nosso dia. Por exemplo: você está caminhando para o trabalho em direção ao ponto de ônibus e percebe que está atrasado. Logo vem um impulso de andar mais rápido e, quando percebe a imagem do ônibus se aproximando, o corpo reage com um movimento mais energético e para não perdê-lo se solta na corrida para facilitar o deslocamento", filosofa Alexandre Duarte.

Daí que, na prática da atividade física, ao perceber que caminhar está ‘fácil' gradualmente vai se fazendo a transição para a corrida. "Orientamos caminhar um minuto, trotar um minuto; depois caminhar um minuto e trotar dois e assim por diante", fala o fisiologista Marcelo Ortiz. "É natural e saudável evoluir, aumentando o grau de dificuldades dos exercícios para que os ganhos também sejam maiores", diz Marcos Caetano, do Instituto Vita.

CAMINHAR RÁPIDO OU CORRER DEVAGAR? Ó, dúvida cruel. Acontece que caminhar e correr são movimentos ‘irmãos', de biomecânica parecida, porém com dinâmicas diferentes e ambos naturais. "Vejo na minha prática de consultório e em aulas, que um bom corredor pode se sentir inadequado e muitas vezes com a sensação de estar ‘amarrado' e sobrecarregado em uma caminhada rápida, mesmo tendo um preparo físico invejável, enquanto que uma pessoa que freqüentemente caminha rápido pode se sentir toda desengonçada com o sobe e desce do movimento da corrida mesmo em velocidades baixas", diz o professor Alexandre Duarte.

Caminhar de forma rápida representa estar no pico da intensidade do ato de andar e isso pode ser um fator de desafio, pois exige mais da coordenação, principalmente para sustentar a velocidade de forma continuada. Correr ‘numa boa', por outro lado, pode ser a fase mais tranqüila do ato de correr onde os movimentos são fluidos e de intensidade baixa.

Pode-se se dizer que o corredor aprendeu a ‘dominar' melhor a gravidade e o caminhante se tornou um detalhista no controle dos movimentos das passadas e ajustes corporais. "Forçar o movimento é estar vivenciando estes picos de rigidez ou descontrole por um tempo prolongado e isso não é uma opção inteligente", aconselha o criador do Integral Walking.

De uma forma geral existem dois padrões básicos em conseqüência do aumento da intensidade ou freqüência dos movimentos: um tipo que se enrijece todo e perde a naturalidade, causando uma contração generalizada do corpo todo, e o outro que se descontrola todo, parecendo que as partes do seu corpo tem vida própria ou que vão se espalhar por todo o lado.

De acordo com o especialista, tanto na caminhada quanto na corrida a naturalidade está atrelada à capacidade de cada um ‘gerenciar' o aumento do número de movimentos e das informações que vão surgindo conforme a intensidade vai aumentando – isto é, à medida que subimos a intensidade do exercício surgem tensões, aumento da temperatura do corpo, mudanças do batimento do coração e no ciclo da respiração, coisas não muito fáceis para a nossa mente ‘digerir', o que poderia causar desconforto e até desmotivação.

O certo é que você tem de se sentir confortável com sua atividade física. É essencial aprender a perceber seu corpo, seus movimentos, sua respiração, bem como contar com ajuda na avaliação física e na aplicação do treinamento.

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