20 de setembro de 2024

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Especial admin 8 de agosto de 2011 (0) (107)

A dureza dos treinos de dois maratonistas de elite

Tanto Solonei, 29 anos, quanto Michele, 24, atletas do Pinheiros, moram, estudam e treinam em Bragança Paulista, na estrutura da antiga Rede de Atletismo. Basicamente, são 12 sessões semanais – de segunda a sexta, duas por dia, e, aos sábados e domingos, uma cada (veja no quadro um exemplo na planilha). Nas semanas de redução de quilometragem, essa média cai para 9-10 sessões. Há controle de fisiologista, nutricionista e exames clínicos e físicos. Toda essa avaliação é feita no Laboratório de Bioquímica do Exercício (Labex), na Unicamp, na quase vizinha Campinas.

A preparação dos dois é semelhante, apesar de Solonei e Michele terem históricos esportivos bem diferentes e de estarem treinando com Clodoaldo por períodos também muito distintos. O treinador, que foi atleta de elite nos 3 mil com obstáculos, começou a trabalhar com Solonei em setembro de 2009, enquanto com Michele já são quase dez anos: a parceria teve início quanto ela tinha apenas 15 anos.

Para relembrar, Solonei era coletor de lixo em Penápolis (SP), corria 25 km dia sim, dia não, como já foi mostrado na Contra-Relógio de julho 2010. Assim, sem conhecer a técnica, teve uma base muito boa por causa do trabalho, incluindo o subir e descer do caminhão. "Fizemos um teste de 3 mil metros, no qual ele foi muito bem, e passamos a investir na carreira dele", lembra Clodoaldo. Dessa forma, Solonei parou de correr atrás do caminhão de lixo para dedicar-se exclusivamente ao esporte. "A evolução foi muito rápida", elogia o treinador. "Em dezembro de 2009, já era o primeiro em diversas provas."

Depois de avaliações periódicas, um problema que precisou ser corrigido para o treinamento foi a hidratação, que era deficiente. Desde o começo do trabalho, as maratonas passaram a ser o foco devido às características do atleta, e os resultados dos exames deram os parâmetros positivos necessários. Clodoaldo lembra que muitos se surpreenderam com a vitória de Solonei na Maratona de Porto Alegre, com 2:15:45, em 2010. Mas o treinador faz questão de lembrar que, para a equipe, não houve surpresa alguma. "Tínhamos todos os indicativos." A ideia era fechar 2010 com 2h12 em Amsterdã (Holanda), mas no treinamento na altitude, em Paipa (Colômbia), a 2.600 m, Solonei começou a sentir uma dor muscular que, depois, acabou impedindo que corresse a maratona e o tirou também da São Silvestre 2010.

 

PERIODIZAÇÃO DE 12 A 15 SEMANAS. Com o ano "terminando" mais cedo, começava a preparação para 2011, com foco numa marca para colocá-lo no Pan e no Mundial de Daegu (Coreia do Sul), nos 42 km. Tanto com Solonei quanto com Michele, Clodoaldo gosta de trabalhar com uma periodização de 12 a 15 semanas focando a prova – a variação ocorre devido ao intervalo entre as competições escolhidas. Para Porto Alegre, foram 15 semanas. Para Pádua (Itália), 14, sempre progressivas – três microciclos semanais crescentes e um mais baixo – 160, 180, 190 e 150 km no acumulado, por exemplo. "Na 10ª semana (para Pádua), foram 220 km", lembra o treinador. Esse foi o pico máximo em termos de volume. Houve, ainda, uma semana de 200 km.

Tradicionalmente, nas duas últimas semanas, há uma redução drástica do volume total do treinamento, mais conhecido como polimento. "Na semana da maratona (de Pádua), por exemplo, não chegou a 100 km", explica Clodoaldo. Na média, cai para 110-120 km. Para exemplificar, se normalmente o treino previa 30 séries de 400 m a 69-70 segundos por volta, cai para 10 tiros de 400 m para 64-66 segundos. Cinco a seis repetições de 2.000 m para 6:10, cai para 2 de 5:40. A estratégia prevê de 40% a 60% do volume, com manutenção ou aumento da velocidade. E todo esse trabalho tem base nos testes de capacidade aeróbica, que Solonei e Michele têm mostrado resultados positivos.

Assim, comprovando a evolução, Solonei chegou em quarto lugar na Maratona de Pádua em abril com 2:11:32, tempo que o classificou para o Mundial de Daegu e para o Pan (eles escolheram correr em Guadalajara). E Clodoaldo lembra que a sensação que ficou na Itália é que o 2h10 já poderia ter saído. Na primeira metade, Solonei correu com um italiano e seu coelho, mas o ritmo estava fraco, tanto que passaram os primeiros 21,1 km em 1:06:20. Na segunda meia, Solonei foi sozinho, fazendo 1:05:12. "Sendo 5 km de vento no peito e os últimos 2 no centro histórico, que deixou o percurso mais difícil", lembra o treinador.

Agora, o treinamento está sendo repetido, com o objetivo de buscar uma medalha no Pan de Guadalajara e, se possível, já o índice para a Olimpíada de Londres, que é 2h16. A dificuldade será a altitude no México: 1.600 metros. Assim, caso não obtenha o índice, Solonei correrá uma maratona no Japão em janeiro de 2012 e, depois, novamente Pádua ou Londres. "Para ter duas possibilidades (de índice olímpico)", explica Clodoaldo. O problema é o intervalo entre o Pan (final de outubro) e a prova japonesa. Serão, mais ou menos, dez semanas de treinamento, incluindo 15 dias de descanso. Caso o índice venha no México, daí haverá um bom tempo de descanso e facilidades para a preparação. E os objetivos de Clodoaldo e Solonei são ousados para 2012: sub 2h10.

Nesse meio tempo entre as maratonas, Solonei disputa provas de 10.000 m em pista, fundamentais para dar ritmo. Por isso, estará no Troféu Brasil, em agosto, para tentar correr abaixo de 29 minutos. Como referência, ele conseguiu 29:23 duas semanas após maratona e seu recorde pessoal é 29:18.

 

GRANDES VOLUMES. Michele tem uma preparação semelhante. Os processos são os mesmos, tanto de exames como de treinamento. Se para Solonei o problema foi a hidratação, o de Michele era a reposição energética. "Comer após o treino, logo após os trabalhos longos", explica Clodoaldo. Muitas vezes, a nutricionista chegou a ficar na pista para que a reposição acontecesse. Um ponto interessante, segundo o treinador, é que a jovem maratonista adapta-se muito bem a grandes volumes de treinos. Os microciclos são sempre os mesmos, de quatro semanas – com a quarta mais leve. Porém, no de maior volume, Michele chegou a rodar 228 km! Normalmente, são 180-190 km.

A corredora precisa sempre de um "freio". "Se é para fazer duas horas a 4:00/km, quer fazer a 3:50", conta Clodoaldo, que tem sempre que ficar controlando. Foram muitas discussões sobre o tema, porque há o risco de acelerar a periodização, entrar no ritmo antes do tempo. O treinador, porém, faz um elogio: Michele evoluiu e amadureceu muito de 2010 para 2011. "Está treinando bem controlado."

Em Pádua, neste ano, Michele obteve a terceira posição, com 2:35:09, sua melhor marca até o momento. O objetivo, no Pan de Guadalajara, é uma medalha, mas o índice olímpico, de 2h30, também está nos planos. Irá ao Japão em janeiro e correrá outra maratona ainda no primeiro semestre, que pode ser novamente Pádua. Clodoaldo diz que Michele está em evolução e que foram conservadores na maratona italiana deste ano, porque o plano era o índice pan-americano, de 2h36. "Poderíamos ter saído um pouco mais rápido e ela acabou correndo sozinha a maior parte do tempo também", lembra. "Temos muita coisa para trabalhar, mas a intenção é correr na casa de 2h30 ou abaixo em 2012", diz Clodoaldo. Caso Michele não consiga o índice olímpico, fará uma maratona em setembro do próximo ano.

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