Especial admin 4 de outubro de 2011 (1) (118)

Loucos por prova

De uma forma geral, tais corredores não se preocupam muito com o resultado em si. O importante é participar, levar para casa mais uma medalha e conseguir vivenciar a experiência de cruzar mais uma linha de chegada, seja onde for. Esses corredores aficionados, para não dizer viciados por provas, muitas vezes viajam de cidade em cidade em busca de competições, até porque em muitas ocasiões, principalmente quando saímos dos grandes centros, em que o calendário de corrida de rua é recheado de opções, é preciso se deslocar porque na região em que se está as corridas são escassas.

A paulista Márcia Nascimento [1], 50 anos, é uma dessas corredoras que não pode ver uma corridinha que logo quer se inscrever. Praticante há cinco anos, ela mesma se define como uma corredora que gosta de fazer qualquer uma, não importando a distância. "Correr é minha sanidade mental. Gosto das curtas e também das longas, inclusive maratonas. Já fiz até algumas de aventura", conta Márcia, que todo final de semana faz uma prova e às vezes chega a participar de duas no mesmo fim de semana.

Ela chega a viajar para conseguir manter sua programação intensa de provas.  Mesmo recente num fim de semana de longão na USP, em que Marcia caiu, ralou-se toda e ainda teve que um pequeno corte na sobrancelha, com direito a uma pequena sutura realizada no próprio Hospital Universitário da USP, ainda assim ela viajou no dia seguinte para para Riviera de São Lourenço para correr 10 km. "Corri em 45:35 e ainda faturei um troféu na categoria", diz ela, que classifica esse acontecimento como uma das suas maiores loucuras. Quando perguntada se a quantidade de provas realizadas não atrapalha seu treino, Márcia se explica da seguinte forma: "Meu treinador, Adriano Bastos, já me conhece bem e faz a planilha pensando nas provas como parte dos treinos. Então, atrapalha se eu não correr. Como ele também é doido por corridas, acredito que acha normal as minhas maluquices".

Apesar da cumplicidade do técnico na planilha, que mais do que ninguém entende seu gosto diferenciado por competir, Márcia complementa que não tem folga nos treinos. "Com o Adriano não tem moleza, não. Treino de terça a domingo, ou seja, seis vezes na semana." Dos colegas de equipe, ela sempre está sujeita a ouvir brincadeiras, como "quando crescer quero ser como você". Mas ela tira de letra e ironiza: "Dizem que até de prova infantil eu participo."

 

LAZER E TRABALHO. Outra figurinha carimbada nas corridas pelo Brasil afora é o também paulista Gayber Silvio Silveira [2], de 48 anos, que é chefe executivo de cozinha de uma cadeia internacional de hotéis 5 estrelas. Ele corre há três anos e tem feito provas de diversos níveis de dificuldade, como uma forma de preparação para atingir seus objetivos em maratonas. Gayber corre praticamente todo final de semana, também com o objetivo de conhecer cidades diferentes, com suas culturas e também a particularidade de sua gastronomia, que muito o ajuda no seu lado profissional, fazendo um trabalho de resgate culinário.

No seu intenso calendário de provas, não privilegia apenas corridas dentro de São Paulo. "Prestigio também as boas de outros Estados, como a K42 Bombinhas, que tive a oportunidade de fazer solo, e mais duas no Rio, como a famosa reedição da Corrida da Ponte Rio-Niteroi e também a linda Maratona do Rio", conta ele, que muitas vezes chega a ser até difícil optar por uma ou outra, tamanha é hoje a fartura de provas, principalmente nos grandes centros.

"Muitas vezes tenho de optar em fazer uma prova e deixar outra que gostaria de participar", diz o maratonista. Essa fissura por competir uma vez fez com ele pegasse a estrada em plena sexta-feira e viajasse até Santos para garantir a participação na Meia da Praia Grande, prova que ele queria muito correr e que havia finalizado as inscrições online. No domingo ele voltou a descer a serra, para competir nos 21 km.

Sua justificativa para o recheado calendário a que se propõe tem muito a ver com motivação. "Descobri que para me manter motivado tenho de colocar uma prova mais desafiadora entre uma de menor dificuldade e dessa forma participo de algumas como forma de treinamento", explica Gayner, que diz conseguir distribuir bem o treino durante a semana, mesmo tendo que conciliar a corrida com a sua atividade profissional. "Como trabalho durante o dia, sou obrigado a treinar à noite, quando aproveito para relaxar fazendo o que gosto, além de preparar minha cabeça para o dia seguinte. Coloco sempre dois dias de descanso na semana, enquanto os treinos são realizados conforme o nível de prova da semana."

 

SÁBADO E DOMINGO. O brasiliense Samuel Viana Nunes [3], de 36 anos, que corre desde 1997, desde provas curtas até ultramaratonas, também é desses adeptos da corrida em todo final de semana. "Já cheguei a correr uma no sábado e outra no domingo, mas atualmente faço cerca de três no mês", diz Samuel, que viaja para correr em outras regiões apenas em provas importantes, uma vez que em Brasília há competições em quase todos os fins de semana.

Apesar do cuidado na escolha das competições, Samuel confessa que às vezes a ânsia por participar leva a não ter alguns cuidados e até arriscar uma viagem sem saber ao certo como é o evento, o percurso notadamente, e se sua inscrição de fato está confirmada.

Em relação aos treinos ao longo da semana, o corredor acredita que atrapalha sua programação, tendo muitas vezes que ajustar a planilha para encaixar as provas. Os descansos são feitos aos sábados. "De resto, todo dia eu treino", diz ele, que confessa também que seu técnico o aconselha focar mais em provas especificas, o que acaba não acontecendo. "Corro quase todas as provas de 10 km que vão aparecendo."

 

VIAJAR É PRECISO. Se o calendário de regiões como Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e outras é favorável àqueles que adoram fazer uma prova atrás da outra, há regiões em que a programação anual é bem mais limitada, não permitindo que as pessoas coloquem sua vontade de competir em prática.

Com calendário escasso de corridas de rua em Novo Hamburgo, RS, o professor de educação física e treinador Miguel Schmitt [4] precisa recorrer a viagens para fora, se quiser fazer várias provas ao longo do ano. Corredor há 10 anos, Miguel orienta um grupo na sua cidade, que tem apenas cinco eventos durante o ano. Por essa razão, acaba recorrendo ao calendário de outros locais próximos, especialmente Porto Alegre, que oferece competições praticamente todo domingo, para matar a vontade de correr e colocar sua equipe para competir.

O técnico programa pelo menos uma prova ao mês e no máximo duas, até devido a estes eventos serem em lugares um pouco distantes, o que envolve gastos. "Em dias de prova, na média viajamos 120 km (ida e volta), o que acarreta termos que nos concentrar bem cedo, para chegarmos com a antecedência devida na largada, o que pode significar começar a viagem algumas horas antes. Vamos sempre entre 30 a 40 pessoas", conta Miguel.

 

DUAS MEIAS EM 5 DIAS. A paraense Iraleide da Silva Vaz [5], que mora em Manaus, onde o calendário de corridas também não é tão recheado, se desdobra para poder participar de mais provas ao longo do mês. "Comecei em 2001 e nessa época havia provas praticamente duas vezes ao mês e lá estava eu presente. Mas, com o passar dos anos, elas foram diminuindo por aqui e por vezes ficávamos meses sem nenhuma acontecer. Até que em 2004 percebi que, se quisesse participar de bons eventos teria que viajar para fora do Estado", lembra Iraleide, que resolveu se inscrever na Meia do Rio. Depois dessa sua estréia nos 21 km, ela resolveu eleger essa prova como sua preferida e, de lá para cá, vem fazendo todas as edições.

"Cheguei a viajar todo mês para correr, mas, com o passar dos anos, foi ficando cada vez mais difícil, devido à distância e ao custo com hospedagem. Por isso, hoje faço apenas as melhores do país, entre elas a Meia do Rio e a São Silvestre", diz a corredora, que conta também ter realizado algumas loucuras por causa de sua paixão pelas corridas, como correr duas meias em apenas cinco dias. Uma em Florianópolis e outra no Rio.

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One Comment on “Loucos por prova

  1. Sou desses loucos. A maior loucura será em breve, correndo o desafio do pateta na Disney. 21 km num dia e 42 km no outro.

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