Notícias admin 4 de outubro de 2010 (0) (114)

Uma maratona nos arredores de Paris

Mas faltando uma semana para a viagem, e só por desencargo de consciência, resolvi dar uma olhada para ver se eu não achava uma corridinha em Paris, aproveitando para ganhar mais uma medalha. Como dizem, "quem procura, acha"…

Marne et Gondoire. O que seria isso? Pesquisei no GoogleMaps e descobri que era uma região próxima a Paris, servida pelos trens metropolitanos e… só. Uma maratona por lá, como seria? Mandei um e-mail para a organização tirando dúvidas básicas e fui rapidamente respondido. No Google só achei informações esparsas, com resultados dos outros anos, dando nota de uma prova pequena, com cerca de 150 participantes. O grosso vinha mesmo da maratona de revezamento, que se realizava em conjunto.

Fazer ou não fazer? Ainda tinha alguma preparação física residual dos treinos para Castelhanos, mas não tinha feito nenhum longo desde então. Lembrando-me da própria posição defendida pelo editor da CR, de que é possível completar uma maratona mesmo sem preparo específico para ela, desde que dosando o ritmo e usando a experiência a seu favor, e com o OK de meu técnico Diego Lopez, cruzei os dedos, cliquei no site e pronto. Sabia que não ia ser mole, mas o que um corredor não faz por uma medalhinha a mais no currículo, né?

A retirada do kit no sábado anterior à prova (13/6) seria a minha primeira impressão. O trem até a estação RER de Torcy era rápido e caro (8 euros a ida e volta). A estação fica do lado de um grande shopping. E eu sabia que era só seguir alguns metros por uma avenida até a entrada o Parc de Rentilly, onde seria a base da prova. Bem… a avenida era uma estrada. Eu estava andando num entroncamento rodoviário nos arredores de Paris, um descampado sem calçada, na grama da borda da via, tendo que desviar de guard-rails e grandes placas de trânsito, mas depois de 1 km o parque apareceu e tirando a xingação da minha esposa Alessandra, tudo bem. Como esperado, uma organização simples, ninguém falava português e mesmo no inglês era difícil. Uma camiseta simples e não havia chip, só uma etiqueta com código de barras.

SAÍDA PARA QUE LADO? No dia da corrida acordei zonzo por causa do fuso. Para o meu corpo, era 1h30 da manhã ainda. Mas lá era 6h30 e já com um prenúncio de sol forte. A prova começaria às 9, tempo de sobra para chegar lá. No parque, um clima bem sossegado, com as famílias dos atletas se aninhando no gramado para organizar o pic-nic, outras se arrumando na logística da maratona de revezamento e uma organização super tranquila. Tanto que, chegando na hora da largada, todo mundo se alinhou de um lado do totem e o organizador, entre risos meio desconcertados, avisou que era para mudar de lado, o que foi feito em menos de minuto. O percurso aparentemente havia sido invertido, mas o meu pobre francês não me deu a chance de ter certeza disso.

A minha única certeza era a de que eu era o único estrangeiro ali. E o único que não falava francês. Via isso na cara das pessoas, quando dizia que era "du Brésil". Ainda mais com cara de japonês. Aí mistura tudo mesmo!

Largada dada e eu, mesmo saindo o mais atrás possível, demorei uns 10 segundos para passar pelo pórtico. Corrida pequena é assim. Logo de saída, uma subida, para sair do parque e ir para a primeira vila por onde a corrida passaria. A idéia dos organizadores foi de fazer uma prova cruzando pelas 15 "comunes" da região de Marne et Gondoire. Em cada uma dessas vilinhas haveria a troca dos corredores do revezamento e a "revitalização" dos maratonistas solo. Eu nem tinha esquentado direito quando apareceu a primeira: Collégien. Uma belezinha de vila.

Depois pegamos um trecho de descida no meio do mato, em estrada de terra. Essa seria a tônica da corrida: cross-country entre as cidades, para voltar ao asfalto dentro delas. Fui curtindo a beleza dos campos e a arrumação das cidadezinhas, cada uma querendo fazer uma festa maior que a outra. E o relevo, num sobe-e-desce que não parava. Nada muito íngreme, mas praticamente sem trechos planos.

A temperatura foi subindo e chegou nos 28ºC. Se eu estava sofrendo, imagina a francesada! Vale observar que o abastecimento de água era impecável. Além dos tradicionais copinhos abertos – que são horríveis para beber correndo -, havia garrafinhas, que eu levava comigo, precavido desde a seca de Floripa. Naquele local, percebi o único ponto que pude chamar de negativo na prova: o número de peito, feito em papel de má qualidade, se rompia junto aos alfinetes.

Cheguei em Chalifert (19 km de prova) já meio cansado. O sol, o relevo e a falta de treinos pagavam o seu preço. Mas continuava extasiado com a paisagem da corrida; chegamos a correr no meio de campos de margaridas, um lugar realmente muito bonito. Mas que podia ser em descida… Em Lesches, a cidade se superou: todo mundo vestido de Asterix! Do pessoal que controlava o trânsito ao pessoal que dava a "poção mágica" no posto d'água. A minha garrafinha eu peguei do próprio Panoramix!

TUNEL COM TOCHAS! De Lesches a Dampmart, outra surpresa. Após uma descida em trilha, um túnel de uns 200 m todo iluminado por tochas! Coisa de louco!!! Não dava para correr direito porque estava bem escuro, mas era demais! De qualquer modo, correr forte não daria, já que as tochas queimavam oxigênio dentro do túnel e produziam fumaça para asmático nenhum botar defeito.

Ali, com quase 25 km de prova, já estava pensando como ia fazer para terminar… O ritmo diminuía, na mesma proporção em que as subidas abundavam. O staff gritava incessantemente "courage, courage" e "allez, allez", mas eu já sentia as pernas pesando. Mesmo assim, a 6 min/km, eu ainda estava passando gente e só um ou outro do revezamento me passava… o pessoal não estava com muita pressa mesmo. Também, com aquela paisagem!

Depois de muitas subidas, cheguei em uma vila onde o posto de reabastecimento era todo japonês, com lanternas, caratecas, quimonos e, naquele instante, o único "japonês" da prova. Fiz minhas mesuras, e aproveitei para tirar fotos. Não dava para perder a oportunidade! Foi o meu último bom momento na prova, pois na altura dos 36 km começaram as câibras. De vez em quando parava para uma massagem e alongamento, mas depois nem isso: não dava para alongar de um lado porque dava câibra do outro.

A chegada foi um tormento. No último quilômetro não conseguia mais correr, mesmo escutando o locutor e vendo o pórtico. Mas cheguei: 4h46! Só que fiquei sem minha medalha. Não, não fui desclassificado nem nada. É que ao invés de medalha, os completantes da maratona ganham uma placa, semelhante às de ruas de Paris, mas evidentemente fazendo referência à maratona. Apesar do cansaço extremo, valeu a pena. Afinal de contas, o que um corredor não faz por uma placa, né?

Mais detalhes no site www.marneetgondoireathletisme.fr 

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