Performance e Saúde admin 10 de março de 2015 (0) (106)

Sol ao invés de morro?

Os treinos em altitude são considerados por muitos como a etapa mais avançada na evolução de um ciclo de trabalhos físicos. Por isso, os training camps em regiões elevadas são tidos como o ponto alto da preparação, separando aqueles com acesso ao que há de melhor no treinamento dos que não têm essa possibilidade. A lógica por trás do trabalho nas alturas é a de que, ao ser exposto a um ambiente onde o ar é mais rarefeito, o organismo será forçado a melhorar a sua capacidade de captação de oxigênio, para garantir o suprimento adequado aos músculos.
Esse processo ocorre principalmente pelo aumento da quantidade de glóbulos vermelhos e, mesmo quando o atleta retorna ao nível do mar, haverá uma janela de tempo ao longo da qual esta adaptação será mantida, o que se traduz em melhor performance por algumas semanas. As alterações fisiológicas causadas pelo treino em altitude, aliás, são muito similares àquelas decorrentes do doping por eritropoitina (EPO), que também resulta no aumento da quantidade de glóbulos vermelhos no sangue.
Apesar de muito popular entre os esportistas de elite, as sessões nas alturas possuem diversos críticos. Muitos defendem a tese de que não resistem ao teste do efeito placebo, e que em atletas já muito bem treinados os resultados são praticamente negligenciáveis, ou incertos, a ponto de não valerem o esforço logístico.
Dadas as incertezas que rondam esse tipo de trabalho, novas alternativas de estresse ambiental começaram a ser testadas, sendo uma delas a preparação física em ambientes quentes e úmidos. Os exercícios de adaptação ao calor não são, em si, uma novidade. Há décadas que esportistas de alto nível se condicionam em ambientes mais quentes e úmidos do que aqueles em que vão disputar suas provas e campeonatos. As adaptações ao estresse climático também são razoavelmente bem descritas na literatura e ocorrem após um curto período, já a partir de 5-7 dias de treino. A novidade é que estes ciclos em ambientes quentes agora estão sendo utilizados para melhorar o desempenho em climas mais amenos, em que a temperatura não é tida como um fator limitante do rendimento físico.

ADAPTAÇÕES DIFERENTES. Contudo, as adaptações fisiológicas ao calor não são as mesmas que as resultantes do treinamento em lugares elevados. Enquanto a altitude visa essencialmente estimular a produção de hemácias (os glóbulos vermelhos que carregam oxigênio no sangue), o estresse térmico de uma temperatura mais alta afeta diversas outras áreas do sistema cardiovascular.
Uma das principais alterações em decorrência do estresse térmico é o aumento do volume de sangue no organismo, mas também a redistribuição do fluxo sanguíneo, com menos quantidade sendo desviada para a pele, pois o organismo passa a ser mais eficiente na troca de calor com o ambiente.
Pesquisas mais recentes também apontam que, mesmo em testes realizados em ambientes frios, curtos períodos de aclimatação ao calor podem resultar em elevação do consumo máximo de oxigênio, aumento da velocidade de corrida no limiar de lactato e melhora da eficiência de movimento, todos estes fatores que diretamente afetam a performance.
Um estudo de 2010, por exemplo, demonstrou que, após um período de 10 dias de 1h30 de exercício moderado no calor (40°C), melhoraram diversos parâmetros da função cardiovascular de atletas já de alto nível, que inclusive ganharam em resultados durante um teste de máxima distância percorrida em 1 hora, em temperatura ambiente de 13°C.
Por motivos óbvios, a utilização de períodos de adaptação a maiores temperaturas é uma estratégia que irá beneficiar corredores que treinam em climas temperados, mesmo que residindo em lugares mais quentes. Importando o exemplo para o Brasil, atletas que se exercitam cedo pela manhã ou à noite, para fugir do calor, podem considerar uma fase de adaptação simplesmente correndo nos horários mais quentes do dia. Dada a dificuldade em relação ao treino de altitude, é uma alternativa que merece ser mais bem explorada.

Como fazer a aclimatação ao calor

Duração: Os primeiros resultados aparecem logo nos primeiros 3-5 dias, e resultados plenos ocorrem em duas semanas.
Treino: As sessões podem ser diárias, com duração entre 1 e 2 horas, em intensidade moderada (50-80% da frequência cardíaca máxima). Existe também a possibilidade de alternar dias de treino no calor com outros em ambientes temperados, de forma a possibilitar trabalhos mais intensos.
Estresse térmico: A maioria dos protocolos atuais utiliza temperaturas ambientes entre 30-40°C e umidade entre 30-80%. Esta relação irá depender da tolerância do atleta. Desde que o estresse térmico não induza uma queda significativa de desempenho e nem afete a saúde do praticante, não há recomendações concretas sobre quanto estresse é o bastante.
Medindo os resultados: Controle o comportamento da frequência cardíaca ao longo de uma sessão padronizada de exercício. Na medida em que o organismo se adapta ao calor, a FC ao final da sessão (desde que a velocidade de corrida e a duração sejam as mesmas) deverá diminuir em cerca de 10-20 batimentos por minuto, ao fim do período de aclimatação.

Altitude e calor combinados?
A altitude e o calor parecem ter efeitos distintos no organismo. Sendo assim, seria possível combinar os efeitos dos dois sistemas? Essa pergunta foi parcialmente respondida no ano passado por um grupo de pesquisadores do Catar.
Eles investigaram um grupo de atletas que além de treinar em horários mais quentes permaneciam 12 horas por dia em altitude simulada. Tal combinação resultou em melhoras mais expressivas do que quando apenas o calor foi utilizado como estresse ambiental, indicando que existe sim a possibilidade de soma dos dois estímulos, o que pode vir a ser uma nova modalidade de treinamento.

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