Em um ano, uma maratona ocorre em abril. No outro, em outubro. Na sequência, em maio. Depois, volta para abril.
Faltando uma semana, uma meia-maratona é cancelada por causa de imposições de secretarias de trânsito ou por terem “descoberto” um evento no mesmo final de semana.
Motorista furando o bloqueio e jogando o carro em cima dos corredores (me incluo nisso) pois não poderia fazer um desvio de 1 km ou esperar… 2 minutos.
Pedestres atravessando a rua e gritando: “Vai trabalhar, vagabundo”. Os palavrões irei deixar de lado, ok?
Motoristas buzinando incansavelmente como se o mundo fosse acabar, pois teriam de aguardar o longo bloco de corredores passar…. em um domingo de manhã… com as ruas vazias… ou melhor, com alguns corredores em uma maratona brasileira.
Percursos sempre idênticos por que não é possível “parar” uma cidade em um domingo das 7h às 10h…
Ruas vazias, nenhum apoio popular, comércio e toda a “estrutura” municipal alheios aos eventos (e isso não inclui apenas o governo, inclui todos os setores de uma sociedade).
Quase ninguém sabendo que naquele dia está ocorrendo uma maratona na cidade.
Na minha rua? Nem pensar. Poderosos indo à justiça e buscando liminares.
Daria para ficar um bom tempo escrevendo. Tudo isso, ninguém me contou, eu vivenciei. Só para deixar claro.
Por outro lado, 500 mil pessoas nas ruas, de três gerações diferentes ao menos, com chuva, vento e sensação térmica de zero grau.
Pelo menos, 10 mil voluntários.
Tradição e cultura. Prova sendo realizada, ano após ano, década após década em alguns casos, na mesma data.
Toda uma sociedade envolvida, com desconto em hotéis, programação em restaurantes, ou seja, todos aproveitando (inclusive financeiramente, que mal tem nisso) do grande evento?
Uma geração de renda de 150/160/170 milhões de dólares em três ou quatro dias de evento.
Apoio não apenas da sociedade (que é fundamental), mas dos setores públicos e privados.
Pedidos de desculpa nas ruas pela experiência ter ficado aquém da esperada.
A maioria sabendo que naquele final de semana, um evento esportivo está tomando conta da cidade.
Uma metrópole como Nova York “parando” para uma maratona. Poderíamos trocar por Chicago. Daria no mesmo.
Nenhuma buzina. Ao longo de 42 km. No lugar delas, aplausos, gritos de incentivo, cartazes, palavras de apoio, um sorriso, um olhar de uma criança, um toque/cumprimento na mão.
Informações sendo recebidas semanalmente, no e-mail, além de correspondências. Dúvidas sendo tiradas por email, por telefone, pelo site oficial.
A sensação de você estar sendo respeitado.
Uma cultura esportiva, que começa dentro de casa, passa pelas escolas e supera as fronteiras desse cotidiano.
Esses fatores, como os primeiros, foram todos vivenciados. Novamente, poderia passar mais um bom tempo explicando.
Então, respondendo a pergunta do título desse texto? Por quem essa paixão por Boston? Pela centenária prova? Sabe que não sei responder!
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Caro André, apenas depois de ter tido a oportunidade de correr uma major (no meu caso, Chicago no ano passado) é que alguém entenderá realmente o que você escreveu. Se não tivesse corrido, acharia seu texto apenas interessante. Hoje, identifico-me com cada parágrafo seu. É uma diferença brutal. Abraços a vc e a todos os corredores.