16 de abril de 2024

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Releitura Redação 14 de janeiro de 2019 (0) (136)

Só não corre quem não quer…

Com os devidos cuidados, mesmo aqueles que estão acima do peso, têm asma, hérnia de disco, algum problema no joelho ou até osteoporose são capazes de dar seus trotinhos e, porque não, encarar maiores desafios. Veja como, a seguir. (Acabaram-se as desculpas…)

Quantas e quantas vezes ouvimos: “Admiro quem corre. Bem que eu gostaria, mas infelizmente não posso, estou acima do peso… ou tenho asma… ou hérnia de disco… ou um outro problema qualquer…” Mas será que não pode mesmo? Uma pessoa com um desses diagnósticos estaria diante de um impedimento definitivo, “condenada” a nunca encarar umas corridinhas? Intrigada com essas questões e no intuito de dar um alento a quem realmente quer iniciar ou retomar a corrida, a revista foi ouvir especialistas de várias áreas. E a conclusão que esta reportagem chegou é que, com os devidos cuidados, todos podem correr!

O primeiro passo, sempre, é submeter-se a uma avaliação médica criteriosa, que inclui exames clínicos, hemograma, eletrocardiograma, teste ergométrico ou ergoespirométrico (mede o consumo de oxigênio durante o esforço físico).  Uma avaliação podopostural, para analisar vícios de postura, torções do tronco, estrutura esquelética e marcha, também é importante. Se constatado qualquer problema mais relevante, o paciente é encaminhado a outros especialistas. E aqui, mais do que nunca, é essencial contar com a orientação de um bom professor de educação física ou personal trainer.

Veja a seguir algumas “desculpas” e muitas soluções para quem quer ter o esporte correndo nas veias.

 

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“ESTOU COM EXCESSO DE PESO”

 

Quem possui quilinhos a mais pode e deve se dedicar a uma atividade física. E a corrida é uma boa opção, por aumentar o gasto energético e elevar os níveis de adrenalina e de hormônio do crescimento – o que favorece a queima de gordura e o aumento da massa muscular. Segundo o médico Rogério Silicani Ribeiro, especialista em endocrinologia pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia e mestre em Fisiologia do Exercício pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a melhor forma de determinar a segurança da corrida para pessoas acima do peso é avaliar sua composição corporal e quantificar sua massa muscular. “Se houver déficit comparado ao peso total, convém realizar um trabalho de hipertrofia muscular, exercícios de baixo impacto e caminhada antes de iniciar propriamente a corrida. Agora, se a massa muscular é adequada, a intensidade do exercício deve ser avaliada de acordo com a freqüência cardíaca de treinamento obtida através da ergoespirometria”, explica.

A prevenção e o combate à obesidade consistem em equilibrar a ingestão calórica com o gasto energético – ou seja, come-se menos e gasta-se mais. “A atividade física deve ser estabelecida em sua rotina. Caminhar é válido no início porque você precisa acostumar seu corpo ao exercício. Em uma segunda etapa, não trará mais tantos benefícios quanto os que a corrida gera. A corrida queima quatro vezes mais calorias do que a caminhada, porém vale lembrar que esse trabalho, inicialmente, deverá ser realizado com baixa intensidade até que se consiga reduzir um pouco o peso”, explica a professora de educação física Patricia Ferreira, coordenadora técnica da Six Assessoria Esportiva, de São Paulo.

A corrida é indicada até mesmo se o excesso de peso estiver associado ao diabetes ou a problemas cardíacos. “A atividade física diminui o risco de desenvolver diabetes em quem não tem a doença e facilita o controle da glicemia nos diabéticos. Isso porque o exercício estimula a entrada de glicose circulante no sangue para dentro das células, independente da insulina”, diz o endocrinologista Rogério Silicani.

Em relação aos portadores de problemas cardíacos, o exercício melhora a performance cardiovascular. “Após avaliação de um médico com experiência em reabilitação cardiovascular, a atividade física é a principal forma de reabilitação de portadores de cardiopatia e a corrida pode ser uma das modalidades de exercício utilizada”, recomenda Rogério Silicani.

Atenção: como a maioria dos indivíduos com excesso de peso e obesidade possui pouca massa muscular (o que reduz a proteção de ligamentos e articulações contra lesões e entorses) e muita gordura (o que aumenta o impacto durante uma corrida), levando em conta ainda a falta de técnica para realizar a atividade com segurança, esse grupo está mais sujeito a lesões em ligamentos, tendões e músculos.

Como deve ser o programa

O ideal é praticar exercício pelo menos 30 minutos, três vezes por semana. “A pessoa deverá começar bem devagar com um trabalho de corrida, intercalado com caminhada. Por exemplo: 30 minutos de exercício, sendo 9 minutos caminhando e 1 minuto correndo, para que não ocorram lesões durante os treinamentos”, diz Patrícia Ferreira.

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“MEU PROBLEMA É ASMA”

A asma é uma enfermidade comum que afeta indivíduos de todas as idades. Trata-se de uma doença inflamatória crônica das vias aéreas — que sofrem inchaço e estreitamento, ou seja, a passagem do ar fica mais difícil porque o tamanho interno dos brônquios diminui –, uma das mais incidentes na infância, que causa inúmeros prejuízos à criança, que tem suas atividades restritas por mais de 100 dias por ano, além de um alto índice de utilização dos serviços de saúde.

Mas ela ainda é cercada de mitos e preconceitos relativos ao seu tratamento e que geralmente recebe a atenção apenas durante as crises, sendo os recursos preventivos pouco indicados e utilizados. “Às vezes, mesmo que esteja bem (sem sintomas), uma atividade física intensa pode desencadear uma crise de broncoespasmo (broncoespasmo induzido pelo exercício ou BIE) cinco a quinze minutos após a realização da mesma”, diz o médico e professor Luzimar Teixeira, da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (USP), uma das maiores autoridades sobre o assunto.

Mas a asma, adequadamente tratada não impede que o indivíduo pratique qualquer atividade física – inclusive corrida. “Exercícios são benéficos e têm sido recomendados como coadjuvantes no tratamento e na prevenção, através de programas educativos”, explica o professor da USP. “Prevenção é a palavra. Procure um especialista e discuta com ele um plano de ação. Se for encarar uma prova de 10 km, por exemplo, mesmo sem crise, o ideal é utilizar um broncodilatador 20 minutos antes da corrida. Existem recursos de primeira linha”. Segundo Luzimar Teixeira, é muito ruim a pessoa dizer que “agüenta” e continuar a correr apesar da momentânea falta de ar que sente. “Isso aumenta a pressão arterial e diminui o déficit cardíaco”, alerta o médico.

Vale lembrar que existem muitos atletas asmáticos e, para se ter idéia, pesquisas apontam que dos que vão às Olimpíadas, 67% ganham medalha.

Como deve ser o programa

Se a doença estiver controlada e você seguir um programa de prevenção de crises, os treinos podem ser os mesmos de qualquer outra pessoa. “Existe um aparelhinho portátil, o monitor de pico de fluxo expiratório, de custo acessível, que mede o grau de obstrução dos brônquios. Estas informações são úteis para você, seu médico e seu treinador saberem se a doença está sob controle. Será um contra senso praticar a atividade se o fluxo expiratório estiver 80% abaixo do esperado ao indivíduo”, diz o professor Luzimar.

 

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“AI, MEU JOELHO…”

De um terço a 50% das lesões que ocorrem na corrida são no joelho, devido ao impacto que a atividade causa. “A princípio, dor nessa região deve ser encarada como um fator impeditivo para a corrida. Não aquela dorzinha esporádica que melhora espontaneamente. Porém, se for persistente ou aumentar de intensidade, o melhor é parar e procurar um médico”, recomenda o ortopedista Reinaldo Garcia, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, de São Paulo.

As principais estruturas do joelho são ligamentos, meniscos, cartilagem e osso. Assim, os problemas que um praticante pode ter estão relacionados a essas estruturas. A professora Patrícia Ferreira cita alguns dos males que atingem comumente o atleta:

* Condromalacia ou simplesmente “joelho do corredor”, que é a corrosão da rótula e sua cartilagem inferior. As causas são pronação excessiva do joelho, causando acomodação imprópria da rótula, músculo quadríceps fraco ou com lesão.

* Instabilidade ligamentar do joelho. As causas: pisar errado em terreno irregular, distensões e deformidades nos pés.

“Sentir dor é sinal de que alguma coisa está errada. Muitas vezes o corredor associa a melhora de desempenho à necessidade de ‘sofrer’ nos treinamentos. Mas a presença desse incômodo pode ser o fator determinante para ele não conseguir alcançar melhores marcas. Pode ser também um sinal de alerta e, se o indivíduo insistir no esforço, vai se arriscar a lesões mais graves. No caso da corrida este fator pode ocorrer pelo uso de tênis inadequado, treinamento muito intenso sem antes ter realizado um treinamento de base, obesidade, falta de fortalecimento muscular ou corrida em lugares irregulares”, explica a professora de educação física.

Lembre-se que você deve tomar algumas atitudes preventivas para evitar estas lesões, como usar tênis adequado e compatível ao esporte, passar por uma avaliação física e ortopédica, correr em locais onde o terreno esteja liso e sem obstáculos, treinar de acordo com sua atual capacidade física, fortalecer a musculatura caso ocorra um desequilibro muscular, fazer um aquecimento prévio com alongamentos antes e depois de treinar.

Mas se o problema apareceu, deve ser corrigido para que você continue a boa prática do exercício. “Além do tratamento cirúrgico, existe o fisioterápico, que é muito importante. Outras atividades que são úteis para a recuperação dos joelhos são RPG e Pilates”, relata o ortopedista Reinaldo Garcia.

Como deve ser o programa

A pessoa tem que estar ciente da sua deficiência e procurar seguir as orientações de seu treinador à risca. Ele é a pessoa mais indicada para que sua lesão não progrida ou volte a aparecer.

Para quem tem algum problema no joelho, o programa basicamente deve englobar exercícios de fortalecimento de membros inferiores, alongamentos antes e depois, corrida em lugares planos e com baixa intensidade.

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“A HÉRNIA DISCO É QUE ME IMPEDE”

As dores nas costas, também chamadas lombalgias, acometem 80% a 90% da população em alguma fase da vida. Em geral, é provocada pela degeneração discal ou pela hérnia de disco, motivadas por esforços em flexão ou movimentos de impacto, más atitudes posturais e alterações degenerativas e estruturais que desestabilizam a coluna.

“O diagnóstico de uma hérnia de disco é muito característico: dor lombar após ou não o esforço, que não melhora de forma comum; irradiação para as pernas ou não, que piora aos esforços e em especial em atitude de flexão; dificuldade para caminhar; alteração de sensibilidade para as pernas e de sua capacidade ou potência muscular; instabilidade da coluna, travamento, atitude antálgica (com dor), lateral ou inflexão, relata o ortopedista José Nogueira, chefe do grupo de Ortopedia do Hospital 9 de Julho, de São Paulo.

Segundo o especialista, se a hérnia aparecer, tem que ser tratada para que não vire uma lesão mais grave. “O que há de mais novo é a nucleoplastia, um tratamento minimamente invasivo, simples, realizado com anestesia local, em nível ambulatorial. Não se tira ‘pedaço’, nem se mexe no esqueleto. A pessoa sai do hospital andando e pode ter uma vida normal, inclusive voltar a correr”, diz o médico.

Como deve ser o programa

“O trabalho deve envolver exercícios de alongamento, de força (com pouco peso) e de postura. Esse trabalho deve ser orientado por um profissional experiente para que a lesão não aumente e não piore com o tempo”, diz Patrícia Ferreira.

A corrida na esteira, em velocidade baixa, pode ser uma opção para condicionamento em períodos de recuperação. Mas vale lembrar que cada caso é um caso e por isso uma avaliação de um médico ou fisioterapeuta é essencial.

 

“TENHO MEDO POR CAUSA DA OSTEOPOROSE”

 

Osteoporose é uma doença metabólica óssea na qual a densidade e a qualidade dos ossos são reduzidas, levando a uma fraqueza do esqueleto e ao aumento do risco de fraturas. Atinge mais as mulheres: a proporção é cinco pacientes do sexo feminino para três do masculino.

“O tipo mais comum é a osteoporose tipo 1, ou osteoporose da mulher pós-menopausa, que aparece devido à atrofia dos receptores de estrógeno nos tecidos, inclusive os tecidos ósseos”, diz a reumatologista Elisa Hacbarth Freire, do Hospital Professor Edmundo Vasconcelos, de São Paulo. A do tipo 2 ou secundára ocorre devido a outros fatores como problemas hepáticos ou da tireóide. Quem tem o problema acaba ficando com medo de quebrar os ossos – daí que evita o exercício.

Mas ao contrário do que se possa imaginar, tanto como forma de prevenção ou de tratamento, os médicos indicam as atividades aeróbicas de impacto, como a corrida, a esse grupo de indivíduos.

“Em se tratando de osteoporose, é importante levar em conta três fatores ligados a estilo de vida: alimentação (bom aporte de cálcio na dieta), exposição solar (para fixar o cálcio nos ossos) e exercícios.

A corrida, em especial, é muito bem indicada para esses casos”, conta a médica, corredora também, que com outros colegas – fisioterapeutas e professores de educação física – desenvolveu o Projeto Caminhar que reúne seus pacientes no Parque do Ibirapuera para andar e correr, como parte do tratamento da doença.

Tão logo a pessoa abandona o sedentarismo, a resposta aparece: dois ou três meses de atividade física já apontam melhora no quadro.

 

Como deve ser o programa

 

Como prevenção à doença ou se ela já está instalada, porém em fase inicial (osteopenia), o treinamento deve normal, com um condicionamento progressivo. Ou seja, a pessoa começa caminhando e vai aumentando o ritmo aos poucos, sempre com orientação de um professor de educação física. Alongamento e musculação também devem fazer parte do programa.

“Mesmo em um grau mais avançado de osteoporose, o paciente deve se exercitar. Se não pode correr, pelo menos vai fazer uma marcha eficiente”, conta a reumatologista Elisa Hacbarth.

 

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