Reflexões Pós-Maratona

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Emil Zatopek, famoso corredor tcheco da década de 50 uma vez disse: “Se você quer correr, corra 1 milha. Se quer mudar sua vida, corra uma maratona”. No último dia 11 fiz a Maratona de Buenos Aires, minha 6a prova de 42km. E, em meio a comemoração por ter batido meu recorde pessoal, resolvi registrar aqui alguns pensamentos aleatórios que tive durante a prova, sobre essa loucura chamada Maratona.

Uma das coisas mais interessantes que a maratona te ensina é como funciona uma relação de amor e ódio na prática: nos kms finais da prova você se pergunta porque se submeter a tamanho sofrimento voluntariamente e sem nenhuma recompensa financeira, você tem certeza que nunca mais vai correr outra maratona. Alguns minutos depois, ao cruzar a linha de chegada o desespero e o cansaço se transformam em alívio, êxtase e você já considera a possibilidade de fazer isso de novo. 24 horas depois você TEM CERTEZA que quer correr outra e já começa a planejar a próxima.

Alguns estudos já foram feitos comprovando a nossa inaptidão para guardar na memória os momentos de sofrimento físico extremo. Os últimos kms da maratona podem ser muito desgastantes, muito sofridos, na hora parecem intermináveis: km 35, km 36, km 37… Não acaba nunca! Mas se colocarmos estes poucos e sofridos minutos em perspectiva, são insignificantes perto do tempo que passamos nos regozijando de nossa conquista, dias, semanas, meses e anos depois. Então, depois que você cruza a linha de chegada tudo muda de perspectiva.

A linha de chegada da prova, aliás, é um local sagrado, transformador. Quem passa por ali, não passa imune, indiferente. Ao cruzar a linha de chegada pessoas normais se transformam nos super-heróis da família. Corredores estreantes se transformam em maratonistas. Maratonistas experientes completam mais um marco em sua história. Até pedido de casamento acontece ali.

Mesmo para quem não corre, recomendo um dia ficar na linha de chegada de uma maratona. É uma experiência única ver tanta gente chegando ao fim de uma jornada, cada uma ao seu estilo, com seus “porquês”, “por quems” e “para ques”. Tem gente que senta e chora, tem gente que grita bem alto pra exorcizar aquele diabinho interno que duvidava que você ia conseguir terminar, tem gente que abraça o corredor do lado, estranho e ainda assim testemunha, cúmplice de um dos momentos mais marcantes de sua vida. Tenha em mente que as pessoas que ali passam não estão terminando uma simples corrida. Elas estão terminando projetos de vida, cumprindo resoluções (seja de ano-novo ou de meio-do-ano), nas quais trabalharam 4, 5, 6 meses, 1 ano, quem sabe até mais!

Sim, os 42,2km que se corre no dia são apenas a última etapa de um longo projeto. Correr esse trecho é a parte mais fácil, cheio de adrenalina na veia e gente em volta com o mesmo objetivo. Difícil é acordar as 5:30 da manhã durante meses e encarar o asfalto frio sozinho, sem companhia ou testemunhas, ouvindo apenas o som da sua pisada, sem escutar um tiro de largada ou aquele “vamos lá, falta pouco” que o tiozinho fala na altura do km 30 (na hora você quer matar o infeliz porque NÃO falta pouco mas depois você reconhece o valor daquele incentivo).

Difícil é controlar a alimentação para perder ou manter peso com a fome gigante que os treinos trazem. Difícil é conciliar treinos, trabalho, família, amigos, etc. Difícil é dizer não para o seu filho que pede pra jogar bola com você quando você volta de um treino de 30km. Difícil é dizer não para aquele happy hour ou programa noturno que os amigos chamam, porque amanhã você tem que acordar cedo (e sóbrio, de preferência) para treinar.

Livros atuais de administração e liderança enfatizam a importância de se dizer não no trabalho para “aumentar sua produtividade/concluir seus trabalhos no prazo/bater suas metas/subir na carreira/etc”. Pois bem, isso a corrida já me ensinou: para se terminar uma maratona também é preciso dizer não a várias coisas.

Mas, Rodrigo, por que? Para que? O que leva alguém a querer correr uma maratona? Como disse antes, cada um tem seus motivos. Uns começam correndo 5 kms apenas para levar uma vida saudável e acabam se viciando no esporte, querendo correr cada vez mais longe. Outros resolvem correr uma maratona como meta de vida, pura e simplesmente, em vez de plantar uma árvore, escrever um livro ou pular de paraquedas.  Outros ainda resolvem correr para homenagear algum ente querido que se foi, numa espécie de via-crúcis pessoal. Eu corro pelas 3 razões acima e mais outras tantas. Não dá para rotular. Cada um tem seus motivos. Cada um tem sua história. “Cada um sabe a alegria e a dor que vai no coração”.

Mas uma coisa todos esses loucos tem em comum: são teimosos, cabeça-dura, chatos, até mesmo “mono-temáticos” em certos momentos, só pensam e falam nisso durante dias. Porque sabem que só assim vão cruzar aquela linha de chegada. Aquela bendita linha de chegada que, como bem disse Zatopek, vai mudar suas vidas.

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