Performance e Saúde admin 28 de fevereiro de 2018 (0) (1553)

Polimento, a chave para o desempenho

Treinar duro é apenas um componente para se conseguir grande resultado em uma prova. Isto porque mais importante que o treinamento em si é conseguir transformar de forma efetiva a carga realizada em melhora de desempenho. Parece óbvio, mas a passagem de uma para outra fase não é garantida se o procedimento correto não for seguido, e muitos corredores, por falhar neste ponto, acabam tendo desempenho muito aquém do seu real potencial.
A realização dos ganhos do treinamento se dá em boa parte no chamado período de polimento – nome dado às semanas imediatamente anteriores ao evento alvo – no qual as cargas de treino são drasticamente reduzidas, para permitir que o corredor chegue no dia da prova em sua máxima capacidade.
Considere o seguinte estudo, por exemplo: um grupo de corredores foi dividido em dois para a realização de 24 sessões intervaladas de alta intensidade. O primeiro grupo as realizou com baixa frequência semanal, ao longo de oito semanas (três sessões semanais), enquanto o outro grupo treinou em alta frequência, fazendo tudo em apenas três semanas. Enquanto o grupo de baixa frequência aumentou sua capacidade aeróbica quatro dias após o fim dos treinos, o grupo de alta frequência apresentou ganho zero no mesmo dia.
Somente 12 dias após o fim dos treinos é que o grupo de alta frequência apresentou ganho de performance (e nesta altura o grupo de baixa frequência já demonstrava perda de desempenho). Ou seja: quanto mais alta (e concentrada) a carga de treinos, maior o tempo necessário para a recuperação e melhora. Imagine se este fosse o seu treinamento, e após três semanas extremamente extenuantes você chegasse na prova com exatamente 0% de ganhos de performance, simplesmente porque não se permitiu descansar por duas semanas?
Tendo visto a importância de acertar o timing entre o fim das cargas e a prova, é preciso entender um pouco melhor os três principais fatores que determinam o sucesso do período de polimento: a alimentação, a duração e a carga de treino. A manipulação destes fatores é que permite que o período de polimento resulte em ganhos de performance no dia certo, otimizando todo o processo de treinamento.

AJUDA DA ALIMENTAÇÃO. Corredores estão acostumados ao conceito do jantar de massas antes de uma maratona, por sua vez ligado à crença de que de aumentar o estoque glicogênio da musculatura é benéfico à performance. No entanto, é importante compreender duas coisas: primeiro que esta tática parece ser benéfica apenas para eventos que durem pelo menos 90 minutos; ou seja, não há necessidade de fazer o jantar de massas antes de uma prova de 5 ou 10 km. Segundo, para as distâncias de meia-maratona ou mais, é preciso estender a preparação alimentar: não é apenas o último jantar que deve ter sua composição de carboidratos aumentada, mas pelo menos os três dias anteriores à prova, quando o volume de treinos será mínimo.
Os primeiros estudos sobre o chamado carbo-loading (carregamento de carboidrato) previam protocolos mais complexos, envolvendo o esgotamento e supercompensação de carboidratos, ou seja, 3 dias antes com alimentação proteica, seguido de 3 dias basicamente com carbo (arroz, batata, macarrão etc), porém estudos mais recentes já verificaram que a simples adoção de uma dieta mais rica em carboidratos (de qualidade e em maior quantidade que o normal) nos 3-6 dias anteriores à prova possui efeitos benéficos semelhantes.

DURAÇÃO IDEAL. A receita básica para um período de polimento de sucesso são duas semanas de carga reduzida. Esta medida pode ser modificada, claro, no entanto, períodos mais longos do que três semanas e mais curtos do que uma semana não são recomendados.
A questão, como vimos no estudo apresentado, é tentar determinar qual a carga de treino e o estado do atleta, passada a parte de alta intensidade do treinamento. Um pico de carga menor justifica menos tempo de polimento, e vice-versa, e o corredor deve dedicar-se ao processo de tentativa e erro para descobrir o que funciona melhor para si.
Voltemos ao exemplo do estudo: se o corredor vem realizando o mesmo tipo de séries há oito semanas, apenas com a progressão natural de carga conforme ele avança (grupo de baixa frequência), é bem provável que o período de descanso necessário seja pequeno. Por outro lado, o corredor que inclui um período extremo de carga intervalada de três semanas pode precisar de até três semanas para apresentar ganhos de performance.
Outro exemplo, levando em consideração a experiência do corredor: considere alguém que normalmente faz 30-40 km semanais, e que em seu pico de volume para sua primeira maratona realiza um ciclo de 50-55-60 km semanais. Este corredor possivelmente deve dedicar 2-3 semanas para o polimento, enquanto outro, que faz 40-50 km semanais e atinge o mesmo pico de volume de 50-55-60 km semanais para sua maratona, possivelmente irá necessitar de apenas 1-2 semanas.

TRÊS FATORES NA CARGA. As alterações na carga de treino são a parte fundamental do período de polimento. Por carga, entenda-se a combinação de volume, intensidade e frequência das sessões de treino. Começando pelo mais simples, a frequência de treinos deve permanecer inalterada durante o período de polimento, pois não parece haver benefícios em retirar ou adicionar dias de treino neste período.
A intensidade dos treinos também deve ser mantida; aliás, o foco das sessões deve ser efetivamente a intensidade, todavia evitando a exaustão. Por exemplo, se uma série intervalada usual do corredor for 5 x 1 km com 3 minutos de pausa em um determinado ritmo, esta pode ser transformada em 5 x 800 m com o mesmo ritmo, e talvez até 4 minutos na pausa. O componente de velocidade permanece no treino, mas ele deixa de ser exaustivo.
Se lidar com a intensidade e a frequência semanal das sessões é relativamente simples, é no volume do período de polimento que os maiores erros e acertos podem ser feitos. A recomendação atual é que nesta fase haja uma redução "exponencial" de até 60% do volume (ver gráfico), com maior redução na primeira semana e menor na segunda. Em termos práticos, isso quer dizer que a queda de volume deve ser gradual e regressiva ao longo das duas semanas, e não um corte absoluto. Esse corte é feito majoritariamente nas partes de baixa intensidade do volume, com o componente de alta intensidade preservado, salvo as pequenas alterações descritas acima para evitar a exaustão.
Novamente, o corredor deverá aprimorar este processo a partir de suas experiências iniciais, experimentando com quedas mais ou menos bruscas de volume para tentar atingir o máximo de seu potencial. O guia fundamental destas duas semanas é que o corredor deve se sentir cada vez menos cansado e mais à vontade com a intensidade ao final dos treinos.

 

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