Releitura André Savazoni 24 de agosto de 2023 (0) (1636)

Para que o jet-lag não o prejudique

POR ANDRÉ SAVAZONI | maio de 2017

Você se programa durante meses. Faz a inscrição, muitas vezes, com um ano ou até mais tempo de antecedência, como no caso das seis Majors (Boston, Tóquio, Nova York, Londres, Chicago e Berlim). Muda a rotina de vida, dedica-se ao treinamento para correr uma maratona (ou outra corrida de longa duração), porém esquece de alguns fatores que podem influenciar diretamente nesse desempenho, seja para fazer um recorde pessoal ou no caso de estrear em uma distância.



Em relação a alguns fatores, como o clima, você não tem qualquer controle, podendo no máximo estudar as características da temperatura no período da prova, treinar no calor ou separar mais roupas de frio, e contar com a sorte. Em outras situações, o controle está em suas mãos, mas muitas vezes é “ignorado”. Ao planejar uma viagem, é preciso levar em conta o tempo de deslocamento e o fuso horário. Essa dupla tem o poder de derrubá-lo antes da linha de largada!

Estudos mostram que o rendimento esportivo, independentemente da modalidade praticada, é fortemente dependente do sono: há uma perda de rendimento em torno de 10%, após uma noite de sono de menos de três horas. Pode parecer algo impensável no dia a dia, mas ocorre facilmente após uma mudança de fusos horários. Imagine essa porcentagem acumulada após alguns dias seguidos de insônia, ainda mais em uma modalidade individual como a corrida de rua. Basta perguntar para quem já foi à China, Japão ou Austrália para ouvir histórias de demora e sofrimento na adaptação ao fuso horário na ida e na volta, quase sempre com noites em claro ou de poucas horas de sono.

Antes de falarmos do jet-lag (distúrbios causados pela mudança de horário), há a duração da viagem. Principalmente no caso aéreo (por terra, alguns efeitos são minimizados, como verá abaixo, na continuidade deste texto), pode levar mais de 24 horas e chegar até a 36 horas entre sair de casa e chegar ao destino final. Na maioria das vezes, sem tomar banho, sem deitar em uma cama e se alimentando com comida de aviões ou dos aeroportos.

Nesse caso da duração da viagem, não estamos nem citando o fuso horário, que pode ser igual (sem impacto); de poucas horas (como 1 a 3 horas), com influências pouco sentidas e, acima de 3 horas, o que a literatura e os estudos científicos mostram que já pode influenciar em algumas pessoas. Quanto maior o fuso, maior a chance de problema.

A chamada “síndrome do jet-lag” é uma consequência do rápido atravessamento de fusos horários, clássica em voos de longa duração e transatlânticos. Não corre nas viagens por via terrestre ou marítimas, pois são mais demoradas e o organismo acaba se adaptando mais lentamente, com tempo para minimizar os efeitos.

O interessante é que os estudos mostram que a síndrome é mais impactante e comum nas viagens da direção oeste para leste (no caso do Brasil, para a Europa, África e Ásia) do que no outro sentido. A justificativa é que o organismo humano tolera mais facilmente o prolongamento do dia do que o encurtamento. Acostumar-se ao novo horário leva tempo. A cada hora de diferença, o organismo precisa de um dia para se adaptar.

Portanto, quem viaja a Londres pode levar quatro dias para se habituar às quatro horas de diferença de horário. Claro que isso varia de pessoa para pessoa, porém pode ser uma boa referência. Já para os Estados Unidos (Nova York, Miami, Boston, com pouco fuso ou nenhum), a questão é apenas o tempo de deslocamento (e o clima, claro), mas o horário é um adversário a menos.

PLANEJAMENTO. esta forma, a primeira estratégia a ser adotada (e talvez a mais fundamental) é elaborar a antecedência com que estará na cidade da corrida. Exemplificando: em caso de viajar para um local com 4 horas de fuso horário à frente do Brasil, chegar na quinta-feira é melhor para o organismo do que na sexta-feira no caso de uma maratona no domingo. Em trechos com fuso horários grandes, como seis horas ou mais, outra possibilidade é a da realização de uma escala em local com o fuso horário intermediário (de três horas, por exemplo).
Mas nem tudo é perfeito. Relativamente à antecedência com que se deve chegar ao fuso horário da competição, a literatura disponível atualmente não é consensual. A Contra-Relógio analisou alguns estudos. Um deles considera que um dia de adaptação a cada fuso horário cruzado é suficiente, mesmo nas viagens para o leste. Outros autores sustentam que a readaptação ao novo fuso se processa a um ritmo de aproximadamente 90 minutos por dia após uma viagem para o oeste e 60 minutos no inverso. Por sua vez, há quem defenda de duas a três semanas em caso de longos fusos, como do Brasil para o Japão. Mas esse seria o mundo perfeito.
Outra estratégia referida na literatura (e essa extremamente possível no caso da corrida e do cotidiano das pessoas) é a pré-adaptação, que consiste em fazer algumas atividades diárias no horário do local em que irá competir. Claro que isso depende de uma adequação para quem tem horários rígidos de trabalho e estudo, do dia a dia mesmo. Caso vá tirar férias, fica mais fácil, e o planejamento pode incluir isso. Se irá viajar na quarta-feira e trabalhou pela última vez na sexta-feira anterior, pode fazer essas adaptações de sábado a quarta-feira, como exemplo. Não é nada radical. Essa metodologia visa modificar o horário das rotinas diárias em uma ou duas horas por dia, sucessivamente até a data do embarque.

HORA DE DEITAR E LEVANTAR. ma estratégia de pré-adaptação mais simples, uma vez que não implica viver desfasado de fatores ambientais e sociais, consiste em modificar a hora de deitar e levantar, em uma ou duas horas, conforme a direção da viagem, dois ou três dias antes do embarque no avião. Durante o período no avião, é interessante já observar o horário do destino final e tentar se alimentar/descansar/dormir já com o relógio modificado.
Além disso, procure não ficar o tempo todo sentado, faça caminhadas pelo corredor, um ou outro alongamento, se “esticar”… O mais importante é, assim que desembarcar, já seguir o ritmo e os horários do local, ou seja, mesmo que esteja cansado e chegue às 10h, nada de dormir, um bom banho e rua! Vá passear, faça caminhadas ou uma corrida leve e siga o dia, deitando na cama somente à noite, realmente.

SINTOMAS ASSOCIADOS AO JET-LAG
Fadiga durante o dia e dificuldade de dormir à noite
Dificuldade em realizar atividades que exijam concentração e movimentos precisos
Perda de apetite e enjoo
Dor de cabeça, irritação, desorientação, confusão mental

Confira a matéria na versão digital da revista



André Savazoni é formado em Jornalismo e Educação Física. Atuou por anos como editor-assistente da Contra-Relógio, e agora comanda uma assessoria esportiva que leva seu nome, a Savazoni Running Team. Já correu sete vezes a Maratona de Boston e tem como melhor marca nos 42 km o tempo de 2:50:20, em Buenos Aires.

Veja também

Leave a comment