Para quem busca melhorar seu desempenho, treinar corretamente é fundamental, e quanto a isso não existem vozes contrárias. Mas é importante que os diferentes aspectos do treinamento confluam para um mesmo objetivo final, e que no fim do dia não se esteja gastando calorias de graça, nem deixando de gastá-las quando é preciso.
O problema é que ninguém treina errado de propósito. Então, de certa forma estamos todos fazendo aquilo que julgamos estar correto. Pensando nisso, organizamos quatro pontos básicos que corredores podem refletir com relação a aquilo que fazem, e considerar se estão no caminho certo ou se uma mudança no planejamento pode ser bem-vinda.
1 – Volume de treino
O volume de corrida é um importante determinante da resistência à fadiga e da economia de movimento. Qual o seu lugar num universo em que iniciantes percorrem 16-20 km semanais e profissionais mais de 200 km? Este número mágico, caso exista, ainda não foi descoberto.
A principal ferramenta do corredor é o bom senso: uma planilha de treinos deve sempre começar do seu volume atual de treinos e gradualmente adicionar quilometragem. Ciclos semanais podem ter aumentos de cerca de 10%, e o resultado destes aumentos deve ser avaliado de tempos em tempo, até que sua rotina e capacidade de recuperação irão definir um teto.
É importante sempre ter em mente, quando se planeja o treinamento, qual será a hora para estar cansado ou não. Se o cansaço aparece fora de hora, um dos motivos mais frequentes é o excesso de treinos, seja em número de sessões ou no volume de cada sessão, que estão impedindo que o organismo se recupere adequadamente entre uma sessão de treino e outra.
2 – Os intervalados
O treinamento intervalado é a chave para a maioria dos corredores na melhora de performance, e por isso deve estar presente em praticamente todo tipo de planejamento. Além de aumentar a capacidade máxima do organismo, este tipo de série também é o mais eficiente em elevar a proporção da capacidade máxima que um corredor consegue sustentar durante um evento, justamente o ponto em que nosso rendimento mais responde à preparação.
Dentro do feijão-com-arroz do treinamento, as séries intervaladas devem ocupar cerca de 10-20% do volume de treinos: mais se forem menos intensas, e vice-versa. A composição exata das sessões é uma questão de criatividade e objetivo, mas dentro da infinidade de combinações possíveis, o principal ponto para uma série bem montada é que um corredor não deveria ser capaz de realizar o treino sem as pausas, porque seu organismo ainda não consegue manter a carga de trabalho, sem que o sistema cardiorrespiratório atinja seu máximo.
Por exemplo, se um corredor realiza 10 séries de 1 km em uma determinada velocidade, mas poderia facilmente ter feito cinco séries de 2 km com o mesmo ritmo e pausa, é sinal que a série de 10 x 1 km não está cumprindo seu objetivo como trabalho de alta intensidade. Em outras palavras, no treinamento intervalado as pausas devem ser uma necessidade do atleta, e não um simples acessório para quebrar a monotonia da sessão.
Se uma determinada série é cumprida com facilidade, ela já não está mais exercendo sua função, e o corredor deve pensar nas seguintes possibilidades: aumentar o ritmo, diminuir o tempo de pausa ou aumentar o tamanho das séries dentro da sessão. Vamos voltar ao nosso corredor, com sua série de 10 x 1 km a 5 min/km, com pausas de 2 min de trote; se este treino passa a ser muito fácil, ele poderia puxar o ritmo para 4:50/km, diminuir o intervalo para 1 min apenas ou ainda trocar a série para 5 x 2 km.
3 – Polimento e nutrição
Dois itens bem diferentes, mas que aqui então juntos porque são dois dos principais fatores que contribuem para a melhoria do desempenho "por fora" do treinamento em si. O polimento é aquele período preparatório final, em que o atleta deve finalizar sua estratégia de prova, focar no ritmo alvo do evento e, mais do que tudo, descansar as pernas para a competição. O período de polimento pode se estender entre uma e três semanas, com uma queda de volume de até 60% em relação ao pico do planejamento, mas com manutenção dos treinos de velocidade. O período de polimento sozinho pode resultar em ganhos de até 2-3% no tempo final, de forma que merece tanta atenção do corredor quanto os ciclos de carga alta!
A alimentação correta, por outro lado, pode ser a diferença entre uma prova bem feita e uma não finalizada. Em tempos em que novas dietas e estratégias alimentares surgem o tempo todo, é fácil cair na tentação de experimentar algo errado na hora errada. Em poucas palavras, o corredor treina, literalmente, seu organismo para consumir determinado tipo de alimentos de determinada consistência (líquido, gel etc) com determinada frequência.
Em dias importantes, o organismo só deve ser apresentado àquilo com que já está acostumado. Se você é um ávido consumidor de carboidratos durante a corrida, deixe para experimentar outra estratégia com pelo menos dois meses (de preferência mais) antes do próximo evento, do contrário seu organismo pode estar no meio de uma transição e quem sofrerá será sua performance.
4 – Aprendendo com erros e acertos
Você guarda suas planilhas antigas? Se as guarda, olha para elas no ano seguinte? O último ponto é justamente a necessidade de aprender com seus erros e acertos, e também com os dos parceiros de treinos! Mantenha um registro de seus treinos, de suas estratégias passadas de prova, de polimento e de nutrição. Tente entender porque razão determinada prova teve uma quebra ou foi uma prova excepcional.
Não caia na armadilha de pensar que o seu sistema, ou de seu treinador, é ótimo, e que o único caminho para melhorar é fazer mais do mesmo. Correr menos pode significar correr melhor, menos gel de carboidrato numa prova pode ser a resposta para um desconforto estomacal, ou quem sabe batata ou banana ao invés de gel. Descansar apenas uma semana antes de uma maratona pode funcionar para uns, enquanto outros descobrem que precisam de três!
O treinamento em corrida é um processo em que diversas estradas levam ao mesmo destino, e os diferentes caminhos podem se adequar melhor ao seu tipo de carro. Esteja sempre aberto para conhecer e testar novos métodos de treino e de melhora de performance, desde que eles apresentem um embasamento adequado.