Notícias admin 9 de outubro de 2012 (0) (225)

O objetivo maior é confraternizar

Basta correr os olhos por uma lista de equipes em uma prova de revezamento para ver como elas são numerosas. Com os nomes mais diferentes e engraçados possíveis, as equipes de corrida que são puramente a união de amigos em torno do esporte têm crescido a olhos vistos. Na direção contrária das assessorias esportivas – que se tornaram quase que uma obrigação para os corredores por reunir treinamento especializado, competitividade e socialização -, os grupos que se formam entre amigos só têm um objetivo: divertir correndo.

Em Brasília, três grupos de corredores são exemplos de que a amizade é a maior motivação para o esporte. Dos cinquentões do Malukos do Asfalto, passando pelos organizados Come Chão e os festivos Amigos do Waldir, prolifera-se entre os atletas amadores a ideia de que correr com amigos de infância, do trabalho ou da família gera prazer e saúde. Nada de planilhas de treinamento, exercícios educativos, marcação de ritmo, treinos de velocidade. Esqueça a pressão pela performance. O importante, no caso, é correr brincando. As provas de revezamento tornam-se o ponto alto da festa. São nelas que todos os integrantes se reúnem e mostram que amizade na corrida é fundamental.

 

UNIÃO DE EXPERIÊNCIAS. O Malukos do Asfalto reúne, desde 2007, entre 15 e 20 corredores. Alguns são "flutuantes", ou seja, aparecem apenas para participar da equipe em provas de revezamento, e essa é uma característica destes grupos de corrida. Marcelo Lopes, 55 anos, Roberto Canela, 61, e Ailton Bonfim, 52, amigos há 30 anos, foram os desbravadores da equipe. Com boa bagagem no esporte (Marcelo, por exemplo, corre desde 1988, quando era atleta da Seleção Brasileira de Karatê e a corrida o ajudava a perder peso), durante a semana correm no Parque da Cidade após o expediente de trabalho. Definem na hora a quilometragem, mas que é sempre entre 12 e 14 km. Aos domingos, largam às 7h para o sagrado longão, de até 30 km.

"A partir dos 50 anos, o que importa é a resistência, por isso não treinamos tiros", explica Marcelo. Os treinos são baseados em informações colhidas em sites e revistas especializadas.  "É um grupo com um histórico na corrida e estamos sintonizados. Quem tem mais bagagem vai passando para os outros", explica Canela. É acompanhando os mais antigos que os novatos vão aprendendo sobre respiração, postura, pisada.  "Já temos uma boa bagagem de corrida. Não queremos ficar fazendo exercícios educativos, que achamos muito repetitivos e mais importantes para os iniciantes", diz Marcelo.

Uma das poucas mulheres do grupo é Simone Neiva, 38 anos, há cinco com os Malukos. Ela e o marido, Geraldo Custódio, correm há mais de 10 anos. Para Simone, a amizade do grupo é o ponto principal. "Com amigos você tem mais incentivo para correr. Nem vemos o percurso passar, principalmente no caso dos longões".  Com o tempo de 43 minutos nos 10 km, ela dispensa treinadores: "Na assessoria esportiva querem te ensinar até a respirar. Nunca tive assessoria". Ela garante que a evolução no esporte é fruto apenas de sua participação no grupo dos Malukos.

Além das provas na cidade, como a Maratona Pão de Açúcar de Revezamento e a Volta do Lago Caixa, o grupo participa de competições individuais fora de Brasília. Entre elas, a Volta da Pampulha, as maratonas de Buenos Aires e Santiago, e a tradicional Meia Maratona Internacional do Rio de Janeiro. "Nessa, fazemos um bandeirão e o grupo leva umas 20 pessoas. Aproveitamos a festa. Gostamos muito também de correr no mato, em revezamentos, onde possa ter uma prova interessante", diz Marcelo. Hoje, uma parte do grupo treina para correr no Deserto do Atacama, em março de 2013. 

 

CHURRASCO E MACARRONADA . Os professores Raquel Queiroz, 35 anos, e Paulo Cesar Moreira, 48, trabalhavam juntos em uma faculdade e resolveram começar a correr em 2004. Chamaram alguns amigos e inauguraram o Come Chão, que hoje reúne 42 atletas ativos e 60 flutuantes.  Com reuniões frequentes na casa de Raquel, a diretora social do grupo, os corredores têm barraca própria para as provas, uniforme e mensalidade de R$ 10 para custear a compra de água, por exemplo. O Come Chão também se organizou em clube e tem até CGC. Pela página do grupo no Facebook são escolhidas democraticamente as provas de domingo, quando todos se reúnem, e aquelas fora de Brasília. Meia do Rio, Volta da Pampulha e 10 Milhas da Garoto são algumas nas quais o grupo vai de ônibus na maior animação. Os longões são feitos na chácara de Shiro Yoshino, 42 anos, um dos mais experientes em treinamento do grupo. É ele quem orienta os novatos. Após os treinos, não falta o churrasco ou a macarronada.  O Natal também é sempre comemorado em grupo.

"O objetivo é confraternizar, não competir. Somos uma família", garantem os Come Chão, que têm entre seus membros atletas muito experientes, como Getúlio Hannemann, 62 anos, 12 anos de corrida e 17 maratonas no currículo. Foi ele quem apresentou Elde Ferreira, 59 anos, ao grupo. Estreante na corrida em janeiro de 2010, hoje é pódio na faixa etária. "Meu objetivo foi sempre saúde e amizade", diz. Jadir de Paula Silva, 49 anos e 9 maratonas, orgulha-se de não serem radicais com o treinamento. "É tudo sem pressão", garante. 

Assim como o Malukos do Asfalto, as informações sobre as técnicas de corrida vêm de revistas e sites. Raquel é quem repassa emails com dicas de nutrição e treinamento. Todos fazem academia e treinam em horários diferentes. O encontro é sempre aos domingos, em alguma prova local.

Apolinário Neto, 46 anos, é estreante nas corridas e fez sua primeira prova com o grupo em 2011. Conheceu a equipe passando pela barraca em uma prova. Ele ressalta por que escolheu um grupo de amigos, ao invés de uma assessoria esportiva: "Fui bem recebido, gostei da proposta. Aqui não vão me perguntar em quanto tempo eu faço 5 ou 10 km, nem vou ter uma planilha a cumprir. Quero estar dentro dos meus limites". 

 

DA BALADA ÀS CORRIDAS.  Com 750 provas  no currículo completadas em agosto, o  bancário Waldir dos Santos, 60 anos, estava preocupado em 2004. Seus filhos Thales e Thiago passavam as madrugadas de sábado na balada com os amigos. Foi quando surgiu a ideia de trazê-los – e também os amigos – para as corridas de rua. A estratégia deu tão certo que o grupo Amigos do Waldir reúne hoje mais de 100 corredores. Alguns só comparecem às maratonas de revezamento para correr uma volta de 5,2 km; mas a maioria segue firme no esporte e evoluiu para regulares meias maratonas. Na Maratona de Revezamento Pão de Açúcar, em 12 de agosto, os Amigos do Waldir participaram com oito equipes, num total de 38 atletas. Nos 60 anos do Waldir, 10 equipes de seis Amigos comemoraram o aniversário na Ecorun, realizada na Esplanada dos Ministérios.

O treinamento é de responsabilidade de cada um. "Buscamos orientações e planilhas na Contra-Relógio, da qual sou assinante desde 1998, de amigos nutricionistas e treinadores de academias que cada um frequenta", explica Waldir. Para os revezamentos, as reuniões são obrigatórias. Perguntado sobre o que mais motiva uma pessoa a entrar e permanecer no grupo, responde: "O exemplo de garra, determinação, de objetivo a ser alcançado que passo para os mais jovens. Na semana passada liguei para cada um: temos revezamento dia 12, conto com você!  Daí vão confirmando e dizem que vão falar com outros amigos. Coloque o meu primo também… Isso é gratificante", relata.

Waldir não descarta a importância do treino orientado e da habitualidade para melhorar a performance, mas garante que a maioria do grupo, no entanto, corre por prazer e o foco é o revezamento, a participação em equipe. Para Waldir, estar com a família é a maior emoção que a corrida lhe traz. E cruzar a linha de chegada da ultramaratona Volta do Lago Caixa ao lado de seus dois filhos Thiago e Thales, do amigo Ricardo e do neto Pietro, de um ano de idade, foi um dos momentos inesquecíveis. "Foi uma emoção enorme. Os quatro guerreiros e o futuro corredor cruzando a linha de chegada. Com 9h42 completamos os 100 km da melhor corrida de Brasília e do Brasil", relata o filho Thales, resgatado das micarês para a corrida de rua.

 

GRUPOS HETEROGÊNEOS, COM OU SEM TREINADOR, UNIDOS PELA CORRIDA

Em Jundiaí, cidade localizada a 60 km de São Paulo, a situação é um pouco diferente do vivenciado em Brasília. Praticamente não há assessorias. Quem busca um treinador específico para corrida tem de ir a São Paulo. Porém, o que não faltam são corredores e grupos. De amigos, do trabalho, de academias, da "firma"… Completamente heterogêneos. Pessoas de todas as idades, ritmos e objetivos diferentes. Reúnem-se para treinar, bater papo, viajar juntos para provas… As redes sociais são um ótimo mecanismo, servindo como ponto de encontro.

Foi do Facebook que surgiu o "Corredores de Jundiaí", que recentemente atingiu a marca de 100 membros. Gabriel Luiz Cypriano e Luciano Takenori Nishimaru resolveram criar o grupo para reunir os amigos mais próximos com a finalidade de divulgar o dia e o local de treinos, das provas, e para ser um meio de troca de informações sobre o esporte. "Até então os participantes eram meros amadores, iniciantes. O bate-papo fazia muito efeito, pois acabávamos trocando informações úteis, dicas, tipos de treinos e fazíamos com que os menos experientes se familiarizassem com o mundo da corrida de rua", conta Gabriel. "Surtiu tanto efeito que hoje temos corredores amadores de ‘elite', o que enriqueceu muito o grupo, pois no meu caso, que não faço parte de qualquer assessoria, nem tenho um treinador, acabo absorvendo o máximo de informações e dicas desse pessoal mais ‘profissional' e experiente."

O fato de os integrantes terem objetivos e níveis diferentes não inviabiliza os treinos coletivos. Um publica no Facebook: "Tenho um longo de 18 km no sábado, alguém quer ir junto?" Logo, vão surgindo as respostas. "Vou correr 12 km, faço uma parte com você". "Tenho 27 km, então, começo um pouco mais cedo, nos encontramos e terminamos juntos". E assim por diante. Diariamente. Viagens para provas, com o aluguel de vans ou ônibus, também são esquematizadas pela rede social. "O grupo acabou virando uma ferramenta de incentivo. Surgiram novas amizades e até mesmo romances…", diz Gabriel.

No "Corredores de Jundiaí", o espaço é democrático. Há quem faça sub 40 nos 10 km ou 1h27 na meia-maratona, já outros completam os 21 km em bem mais de 2 horas. Existe até um grupo dentro do grupo, exclusivamente feminino, carinhosamente apelidado de "equipe do esmalte", mulheres que não estão preocupadas com tempo de conclusão das provas, mas sim com muita diversão. O nome vem da mania de antes de cada prova, principalmente das femininas, pintar as unhas iguais, em uma cor que combine com a camisa da corrida, é claro!

 

CHURRASCOS E PIZZADAS. Outro grupo que surgiu pequeno, com somente seis integrantes, e hoje conta com mais de 40 corredores é o "Aventura Esportes", criado pelo professor de educação física Felipe Otávio Garcia. Surgiu em 2006 e a principal meta, anualmente, é a participação nas duas etapas do revezamento Bertioga-Maresias. Para a prova de outubro, serão 4 equipes mistas de 8 atletas cada, 1 feminina de 6 corredoras e 2 trios masculinos. Felipe é o "faz tudo". Orienta quem não tem treinador, acerta as inscrições em provas, divide as equipes… Mas o grupo não trata somente de corrida. Há os churrascos e pizzadas de confraternização, festa junina, amigo secreto e a arrecadação de alimentos que são doados para entidades ajudadas pela equipe.

Semanalmente, os integrantes encontram-se às quartas e aos sábados para treinos coletivos. Na hora são formados diversos grupos, com cada um se encaixando no mais próximo de sua realidade, tanto de ritmo quanto de quilometragem. "São homens e mulheres de idades diversas, mas com uma paixão em comum: a corrida de rua. A satisfação pelos quilômetros percorridos é o que nos une", afirma Felipe. (André Savazoni)

 

 

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