Em anos de Olimpíada, os organizadores da maratona de Estocolmo decidiram realizar uma segunda prova na cidade, em comemoração aos 100 anos da maratona dos Jogos Olímpicos de Estocolmo. Divulgaram que se empenhariam para recriar as mesmas características da prova original e uma atmosfera semelhante à de 1912, enviando e-mail aos inscritos com curiosidades sobre a maratona olímpica, o que serviu para criar uma expectativa para a prova.
Atendendo a este apelo, eu, meu marido Luiz Antonio e mais 58 brasileiros e corredores de 65 países seguimos para a Suécia.
Conforme informaram, a maratona foi o maior evento nos Jogos Olímpicos de 1912. O Estádio recebeu 22 mil espectadores, mesmo com os preços dos ingressos maiores do que para qualquer outro dia, além de ter sido único dia em que esteve completamente lotado na Olimpíada. E, ainda, milhares de espectadores estavam alinhados no percurso.
Todos os maratonistas tiveram que apresentar exame médico, além de serem examinados antes da largada. Tais medidas foram necessárias devido ao impacto negativo dos Jogos Olímpicos de 1908, em Londres, quando o italiano Dorando Pietri caiu diversas vezes antes de cruzar a linha de chegada, auxiliado pela equipe médica, cena que até hoje é divulgada, infelizmente, sempre que se fala em maratonas, além daquela corredora suíça, chegando em Los Angeles.
Mesmo com todos os cuidados, a maratona na capital sueca teve a morte do português Francisco Lázaro, que foi um dos poucos que não usou um boné e cobriu seu corpo com gordura para se proteger do sol, impedindo-o de suar e aumentando a sua temperatura corporal. O corredor se tornou a primeira vítima fatal em uma Olimpíada. O japonês Shizo Kanakuri foi outro que perdeu a consciência, mas foi socorrido por fazendeiros locais e voltou ao Japão, mas sem notificar a organização, sendo considerado como desaparecido durante anos. Ele retornou a Estocolmo em 1966, a convite de uma televisão sueca, e completou a maratona.
PALCO DE RECORDES. O estádio de Estocolmo foi o primeiro a ser construído de forma permanente, já que eles eram feitos em madeira. É o mais antigo estádio olímpico do mundo ainda em uso e, ao longo dos anos, nada menos que 83 recordes mundiais no atletismo foram lá quebrados e nenhuma outra arena chega perto desse número.
Outra curiosidade foi o deslocamento de uma coluna de granito de aproximadamente 6 metros de altura, que foi erguida para lembrar o local que serviu como ponto de retorno da prova. O marco foi removido e instalado alguns metros adiante do local original para permitir o retorno de um número maior de maratonistas. Afinal, em 1912 eram apenas 69, enquanto este ano completaram a prova 7.674 atletas.
A feira da maratona foi realizada atrás do Estádio Olímpico, onde barracas listradas ao estilo de 1912 vendiam doces caseiros, salsichas defumadas, pães, pirulitos e outros produtos. Vários staffs com roupa da época, carros, bicicletas, banda de música serviram para fotos dos corredores, quando da retirada do número da prova, entregue em uma sacola de pano.
Camisetas de malha, como as usadas em 1912, estavam sendo vendidas e muitos corredores optaram em correr com ela que, em conjunto com a bandana com 4 nós, entregue no kit, dava um visual engraçado e antigo aos corredores.
Em 1912, a corrida começou dentro do Estádio, em frente ao camarote real e o mesmo aconteceu este ano. O início era para ter sido às 13h45, mas levou mais tempo do que o esperado para reunir os participantes e a largada atrasou 3 minutos. Um desafio para nós corredores, sem saber se deveríamos ou não almoçar antes. A largada foi realizada em 5 ondas, com intervalo de 10 minutos. Algumas vias do percurso original não existiam mais, mas metade dos 42 km aconteceu sobre as mesmas ruas e estradas de 1912. Um percurso bastante sinuoso e difícil, que surpreendeu a maioria dos maratonistas.
COMO HÁ 100 ANOS. Encontramos staff com gravata borboleta e chapéu de palha, postos de água de acordo com o modelo de 1912, bandas e coros com músicas da época e até os espectadores atenderam aos pedidos dos organizadores e muitos estavam vestidos com roupas antigas. Centenas de participantes correram com roupas de época, inclusive eu, que tirei inúmeras fotos com o público e com os corredores (aqueles que levam sempre um celular com câmera ou uma máquina fotográfica nas mãos). Até dei entrevistas ao longo do percurso. Uma grande diversão!
Em 1912, a distância foi de 40.075 m e, para seguir os mesmos critérios, os maratonistas poderiam escolher completar esta distância ou 42.195 m. Não havia necessidade de se registrar com antecedência e você podia decidir quando entrasse no estádio depois de 40 km. Muitos corredores completaram "somente" os 40.075 m, devido à grande dificuldade do percurso.
A medalha da Maratona de Estocolmo Jubileu 1912-2012 tinha, de um lado, o Estádio Olímpico de hoje e como ele era há 100 anos. Do outro lado, um retrato do sul-africano Kennedy Kane McArthur, que venceu a maratona olímpica.
Em 1912, após a chegada, os corredores foram brindados com champanhe no estádio. Este ano, para manter a tradição, os corredores foram recebidos com vinho espumante sem álcool e recebiam as camisetas de finisher.
Como nesta época do ano o sol só se põe às 23 horas em Estocolmo, vários corredores permaneceram no estádio aguardando outros atletas, sentados no local ou promovendo verdadeiros piqueniques com amigos na área atrás do estádio, onde eram entregues lanches, café e as roupas deixadas no guarda-volumes.
No domingo, os corredores foram convidados a retornar ao Estádio Olímpico para a festa de encerramento, onde ofereceram 3 opções de refeição (salmão, frango e vegetariano) servidas em embalagem descartável e houve show com músicas do grupo ABBA, um dos maiores ícones suecos.
Como perfeita representante do grupo de "maraturistas", aqueles que aproveitam uma corrida para realizar uma viagem, esta maratona serviu como um excelente pretexto para visitar uma das cidades mais apreciadas do mundo. Os brasileiros viajaram através da Kamel Turismo, que tinha exclusividade da prova sueca. Valeu pelo inusitado da organização e história. Àqueles que não tiveram esta oportunidade, resta o próximo jubileu…