Às 7h da manhã começa a movimentação de corredores nos ônibus que os levarão à largada da maratona, na Ásia. Em menos de 3 km de prova, porém, todos já estarão novamente na Europa. Sim, isso é possível em Istambul, na Turquia, cidade dividida entre dois continentes pelo estreito de Bósforo – e esta é a única maratona do mundo a ter um atrativo como este.
Tradicionalmente chove no dia da corrida e não foi diferente nesta 33ª edição realizada dia 16 de outubro. Os ônibus partem de dois lugares distintos: Taksim, o centro moderno; e Sultanahmet, onde se hospeda a maior parte dos turistas estrageiros por ser o bairro que abriga os principais pontos de interesse histórico – e também local de chegada da maratona e da prova de 15 km.
"Chegar à largada é uma coisa que normalmente preocupa, e nessa corrida isso foi muito bem organizado. Mesmo com a temperatura baixa e a chuva, valeu muito pois o percurso foi fantástico devido à paisagem magnífica. O asfalto era bom e os postos de hidratação suficientes. Tudo funcionou. Todos os anos eu e minha mulher fazemos uma corrida internacional e escolhemos Istambul por ser uma cidade diferente. Ela ficou doente e não correu, mas considero essa prova muito especial porque aproveitamos muito a cidade também", contou o paulista Mario Sérgio, 48 anos, que fez a prova de 15 km.
A largada é dada às 9 horas, cerca de 300 metros distante da famosa ponte sobre o estreito de Bósforo, e não espere muita velocidade nos primeiros 2 km. A razão é simples e mais que justificada: esta ligação intercontinental só é aberta neste único dia aos pedestres (o resto do ano só para carros) e isso faz do momento uma grande festa. São muitos os que não resistem e dão uma paradinha para bater uma foto, aproveitando a chance especial de estar ali.
Mas apesar da beleza do percurso que passa por pontes, bosques, mesquitas e várias construções históricas, houve a dificuldade extra causada pela chuva. Fina e presente em todo o trajeto, junto com vento, impedindo a possibilidade de recordes. A temperatura esteve em torno dos 9 graus (com sensação térmica de bem menos).
US$ 1 MILHÃO DE PREMIAÇÃO. Com uma premiação polpuda que chegava a 1 milhão de dólares, a prova é disputada. O vencedor foi o queniano Vincent Kiplagat fechando em 2h10, e no pódio feminino um trio etíope, com o primeiro lugar de Alemitu Abera com 2h27.
"Já corri esta prova nove vezes. Amo! Especialmente ao cruzar a ponte, claro", enaltece Itır Erhart, da diretoria da Istanbul Bilgi University. Itir pertence ao grupo de corrida e caridade Adim Adim (Passo a Passo, em turco) com mais de 1.500 pessoas que correram a prova de 15 km empurrando amigos portadores de deficiência em cadeiras de rodas.
E se a largada é linda, não espere menos da chegada, em frente à mesquita de Sultanahmet, a belíssima Mesquita Azul. Dependendo da hora de conclusão ouve-se o chamado para uma das cinco rezas diárias que ecoam por toda a cidade (98% da população é muçulmana).
O belo quilômetro final de acesso à praça é dentro do parque Gülhane. A beleza tem um motivo – deixar os corredores menos raivosos com a subida justamente no fim da maratona e dos 15 km (há também uma prova de 8 km que termina em outro local, o Palácio de Dolmabahçe). Juntas, somam 9 mil participantes (a maioria, 4.400 inscritos, nos 15 km).
A praça final é também o Hipódromo, centro da antiga Constantinopla, local usado desde 200 a.C. para as corridas de bigas e eventos públicos. Mais emocionante, impossível.
Quem contou com torcida própria foi Zilda Sioufi, 63 anos, de São Paulo, cuja filha mora em Istambul. Ela correu com a irmã Maria Aparecida Sordi. "Adorei, apesar do frio e da chuva. Só naõ gostei da dificuldade para pegar táxi depois. Em compensação, vale muito a pena pelo astral das pessoas, o visual da ponte, as mesquitas e o contraste de Europa e Ásia, antigo e moderno", pondera ela, que fez os 15 km. A questão do táxi afeta quem não se hospeda em Sultanahmet devido à interdição das ruas pela maratona.
CAMISETA E CAPA NA CHEGADA. A retirada das bolsas nos ônibus guarda-volumes foi complicada para alguns corredores de 15 km. Com tempo de conclusão parecido, uma pequena multidão se aglomerou debaixo de chuva para retirar seus pertences. Já os corredores da maratona, com tempos de conclusão mais espaçados, não tiveram este problema. O bom é que ao terminar recebe-se uma sacola com uma camiseta de algodão seca e uma capa de chuva.
Em geral a organização é eficiente. Kit legal, hidratação farta a cada 2,5 km e indicação de trajeto. Um dos grandes acertos dessa edição foi a expo, sendo na verdade uma grande feira esportiva. Em 2012 a Turquia sediará o Mundial Indoor da Iaaf pela primeira vez e celebridades esportivas estiveram presentes para dar autógrafos aos corredores. Na retirada do kit havia a customização da camiseta de forma ágil e depois da corrida a emissão do certificado com o tempo de conclusão foi bastante eficiente também.
Ao todo, atletas de 85 países estavam presentes. Depois dos turcos, os mais numerosos eram os alemães, seguido de franceses. Os brasileiros eram 12 e o simpático mestre de cerimônias fez questão de aprender como se dava as boas vindas em português para saudar os corredores na largada.
A analista de sistemas Marina Kasue, 59 anos, foi identificada com uma pequena bandeira do Brasil nas costas lá pelo km 10. "Meu tempo de conclusão não vai ser bom, nem estou pensando nisso. Parei muitas vezes para tirar fotos deste percurso tão bonito", sorriu, mostrando a câmera. Marina ficou sabendo da prova por uma amiga (Janice, que fez a maratona) e resolveram ir juntas. "Decidi correr os 15 km aqui para conhecer o país e aproveitar as férias – e por ser uma corrida entre dois continentes, muito interessante e diferente. Passeamos depois pela Turquia e gostei muito de tudo", comentou.
Quem também aproveitou a corrida para um turismo diferente foi Daso Coimbra, 57 anos, de Brasília. "Estava em viagem com minha esposa e uni as duas coisas. A corrida foi bem organizada e em um lindo percurso", disse.
O pernambucano Mário Silva Junior, 31, teve sua estreia no mundo das corridas em grande estilo. "Estaria em Istambul a trabalho e resolvi correr 8 km. Fiquei gripado e mesmo assim finalizei abaixo de 50 minutos, como planejado, com direito a várias paradas para fotos e vídeos com os amigos", celebrou.
EXPERIÊNCIAS ÚNICAS, HISTÓRIA E … COMPRAS!
Na Turquia a fusão de Ásia e Europa cria uma multiplicidade de cores, formas, sabores e cheiros. E história, muita história. Istambul, a antiga Constantinopla, capital do Império Bizantino, também serviu de centro dos impérios romano e otomano e preserva obras importantíssimas. Entre uma relíquia e outra, como a cisterna da Basílica de Santa Sofia, construída no século 6, não há como não se deixar envolver pela culinária marcante (e pontuada por um delicioso chá de maçã várias vezes ao dia) e os doces a base de frutas secas e castanhas, com destaque para pistache e avelã. E o que mais encanta, servidos com o carinho e a gentileza turca.
Em Istambul a maior parte dos pontos de interesse turístico estão em Sultanahmet – Hagia Sophia e cisterna, a imensa Mesquita Azul, o Hipódromo e o exuberante Palácio de Topkapi, moradia de sultões por quase séculos. Pertinho de tudo isso também fica o Grand Bazaar, mercado de proporções quase infinitas onde o que vale é barganhar. Reserve um espaço a mais na mala para abrigar almofadas, pashiminas, tapetes, cerâmicas, jóias e uma infinidade de bugigangas a bons preços.
Se depois da corrida o que você quiser mesmo é descansar, as opções também são múltiplas – desde experimentar o tradicional e exótico banho turco (chamado hamam) a um mini cruzeiro de 6 horas pelo Bósforo. E esteja onde estiver, será embalado 5 vezes ao dia pelo emocionante chamado das mesquitas para a reza.
O ideal é tirar também mais dias para conhecer outras partes do país. Imperdível é a Capadócia – e o passeio de balão que sobrevoa sua formação rochosa única – e Éfeso, cidade que chegou a ser a segunda maior do Império Romano (atrás apenas de Roma), e que abrigava o Templo de Artemis, uma das sete maravilhas do mundo antigo. As ruínas da cidade são uma das mais bem preservadas do mundo.
A Turquia marca. Seja bela gentileza do povo, pelas lembranças, pelo vivo país que une tão lindamente passado e presente, compondo e tecendo uma trama tão delicada quanto uma de suas tapeçarias.
COMO CHEGAR
A Turkish Airlines é a única companhia com voos diretos do Brasil para a Turquia. São 4 voos semanais de São Paulo a Istambul com duração de pouco mais de 13 horas, e brasileiros não precisam de visto. Como o fuso horário é de 6 horas a mais, procure chegar com alguns dias de antecedência para se habituar. A edição de 2012 da maratona será dia 11 de novembro.