“Esse friozinho de 5 graus…o dia promete!” pensei com meus botões enquanto devorava um bagel e um copo de café, sentado na enorme e gelada área de concentração da Maratona de Nova Iorque. Mal sabia eu que estava prestes a fazer parte da maior maratona realizada em todos os tempos, com 50.304 concluintes, de 109 países diferentes.
“I want to be a part of it, New York, New York…” – meu relógio marcava 10h55 quando um tirou de canhão me despertou da concentração e me trouxe de volta à realidade, seguido pela voz de Frank Sinatra saudando os maratonistas da 4ª (e última) onda de largada, convidando-os a iniciar sua peregrinação pelos longos e árduos 42,2 km da cidade que nunca dorme.
Em que outro lugar eu, Geoffrey Mutai e a ex-Baywatch Pamela Anderson poderíamos estar ao mesmo tempo? Só na Maratona de NY! Enquanto nosso amigo queniano venceu a prova em 02:08:24 pela 2ª vez consecutiva (venceu em 2011, em 2012 não houve prova) a nossa amiga loira californiana terminou sua 1ª maratona em 5:41:03 (perdeu pra Oprah, lembra do tempo dela? Veja aqui).
Já eu, nem tão rápido quanto ele nem tão devagar quanto ela, queria “apenas” bater meu recorde pessoal e fechar a prova abaixo de 4 horas. NY é uma prova dura, com uma altimetria desafiadora, suas inúmeras pontes e sobes-e-desces intermináveis cansam mesmo e fazem muita gente quebrar.
Outro desafio da prova acontece ainda antes dela: chegar até a largada é uma maratona em si, você tem que pegar o ferry, depois uma fila gigante no frio e vento para subir num ônibus que leva para a enorme zona de concentração, onde você ainda vai caminhar bastante para chegar aos postos de café e comida e banheiro químico, e esperar algumas horas para a largada.
Mas NY encanta qualquer um com sua torcida. Já corri outras provas nos Estados Unidos, onde existe um maior envolvimento da população nas corridas, mas nunca vi nada igual a Nova Iorque. Seguindo conselhos de amigos, escrevi meu nome na camisa, e passei as 4 horas da prova ouvindo gritos de apoio, incentivo, daqueles com vontade, como se fossem amigos de infância torcendo por mim. Nessas horas, qualquer um se sente um atleta de elite, tentando alcançar os quenianos lá da frente. Nāo dá para comparar com as provas no Brasil onde, dos poucos gatos pingados que assistem, metade está ali para torcer para um parente ou amigo específico e a outra metade… só está esperando uma chance para atravessar a rua!
A primeira metade da prova é só festa, aquela empolgação com o público, high-five nas criancinhas, lendo os cartazes engraçados, cantando as músicas das bandas por onde passava… Passei pela marca da Meia-Maratona uns 6 minutos abaixo da meta e a família aqui no Brasil comemorando antecipadamente meu sub-4 com o aplicativo da prova que dava as parciais em tempo real.
Mas na segunda metade, como sempre, é que o bicho pega. Lá pelo km 30 meu ritmo tinha caído bastante, o gatorade não tinha descido redondo, as pernas sentindo o impacto do sobe e desce… E eu fazendo conta em milha porque placa de km só tinha a cada 5km… O “banco” de 6 minutos ia diminuindo aos poucos e é nessas horas que aparecem os fantasmas: “Acho que não vou conseguir” ou “De repente se eu caminhar um pouco, posso recuperar o fôlego e voltar a correr mais rápido”. Besteira, sabia que se caminhasse as dores aumentariam e eu ia mancar até o final da prova!
Depois do km 40, parece que entrei em outra dimensão, onde o tempo passava, mas a distância não. Os últimos km são no Central Park, um dos cenários mais bonitos da prova, mas eu não lembro de nada porque naquela hora a cabeça estava dedicada a manter os pés em movimento e mergulhada em contas. Uma hora o parecer era de “vai dar”, um minuto depois a conta dava “não vai dar”.
Mas deu. Foi por pouco, mas deu. Cruzei a linha de chegada em 03:59:14! Entre juras de amor e ódio, entre tapas e beijos, me apaixonei por NY e tive que concordar com Frank Sinatra: “If I can make it there, I’ll make it anywhere”.
PS: Quem quiser ver umas fotos interessantes da prova, acesse este link.
PS2: Um vídeo mostrando os maratonistas de NY no dia seguinte.