Blog do Corredor Tomaz Lourenço 15 de fevereiro de 2019 (0) (330)

A tragédia do ônibus: quando o sonho de sub 3h naufragou em Blumenau

Por Tomaz Lourenço | tomaz@novosite.contrarelogio.com.br

Como falei na última história, com menos de dois anos de corrida, resolvi fazer minha primeira maratona, em 1992. Tinha visto na TV a história do maratonista etíope Abebe Bikila, campeão na Olimpíada de Roma 1960 (quando correu descalço porque o tênis oferecido pela patrocinadora Adidas não ficou confortável) e novamente em Seul 1964, e fiquei interessado em também enfrentar os 42 km.

Me preparei por dois meses para a Maratona de Blumenau, com a equipe da treinadora Silvana Cole, quando constatei que meus 20 anos de ciclismo amador competitivo tinham me dado um grande condicionamento físico, porque tudo saía fácil. Em função dos longos que fizemos, Silvana me indicou que eu tinha condições de fazer um ritmo entre 4:30 e 4h40/km, e que procurasse passar a marca da meia-maratona em 1h35 a 1h40, de forma a terminar em torno das 3h15.

Mas eu estava muito animado por estrear numa maratona, a ponto de nada dormir na véspera. Por volta das 5h30 peguei um dos ônibus oferecidos pela organização, que nos levariam para a largada nas proximidades de Itajaí, onde a estrutura oferecida era zero (nenhum banheiro!!!). Às 7h partimos em direção a Blumenau, por estrada asfaltada e praticamente toda plana, ao lado do rio. Então, meu “espírito ciclista” apareceu e, quando um grupo me passou, não tive dúvida de seguir com ele, pegando o vácuo dos corredores à frente, um vício típico da turma do pedal de competição.

Quando vi, passava os 21 km abaixo de 1h30, e veio então a preocupação com um tal “muro” que tinha ouvido falar, reforçada por encontrar mais à frente um dos integrantes rápidos da equipe caminhando e dizendo que tinha quebrado. Resolvi então segurar um pouco o ritmo, mas fui ultrapassado por um corredor alto e lá fui eu atrás dele por vários quilômetros… Acabei completando em 3:04:29 (foto de Tião Moreira, ao lado), para surpresa da treinadora.

Obviamente que a meta para 1993 seria o sub 3h, sendo que na época praticamente se corria pouquíssimas provas por ano. Comecei a treinar em janeiro, com muito morro, participei de apenas uma corrida de 10 km no semestre, completada na casa dos 39 minutos, e vários treinos em pista nesses 6 meses. Um deles me deu confiança que conseguiria meu objetivo: 6 tiros de 3 km, todos abaixo de 12 minutos, com pequeno intervalo entre eles.

O ÔNIBUS. Fomos (eu e minha esposa Cecília) para Blumenau de carro, já que avião naquela época era muito caro. No jantar de massas no sábado, que era comum em todas as maratonas naqueles tempos, a treinadora me convidou a ir para a largada no ônibus da equipe. Então, passaram no hotel que estava, ainda de madrugada, no escuro, e fomos em direção a Itajaí. O motorista (de São Paulo) se perdeu no caminho e ficamos dando voltas, até sermos orientados por um morador para seguir para a rodovia federal. Assim fizemos, mas chegamos atrasados na largada, sendo que os tempos de conclusão da maratona eram brutos, uma vez que não havia ainda o chip.

Assim, saímos em disparada para tentar compensar os 3 ou 4 minutos que já estavam contando, e fomos passando os corredores, que não entendiam quem eram aqueles loucos. Vale lembrar que quase todos na equipe corriam muito bem, a ponto de um dos nossos ter ficado entre os 10 primeiros, mesmo saindo atrasado. Se não bastasse a “tática” de começar muito forte, eu não sabia em que ritmo corria, ou melhor, não conseguia projetar meu tempo final e fui me irritando (a foto no alto da página feita por Tião Moreira revela bem minha alegria). Enfim, eram 6 meses de muito treinamento que estavam sendo jogados fora.

Acho que por volta dos 35 km desisti de continuar correndo no limite, e apenas segui para a chegada (descobri depois que completei em 3h07). Cecília estava na reta final e já sabia o que tinha acontecido; passei por ela e gritei: “Vamos embora já!” Tomei banho no hotel, arrumamos as malas e entramos na Variant. Antes de ligar o carro, falei pra ela: “Sabe aquele projeto de lançar uma revista, que estou maquinando há meses? Ele começa amanhã a ser efetivado!” Nascia a Contra-Relógio!

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