O ano era 2011 e o Brasil tinha acabado de ser indicado como sede das Olimpíadas de 2016. Foi nesse momento que o Núcleo de Alto Rendimento (NAR) começou a tomar forma. A ideia de Irineu Loturco, preparador físico e doutor em metodologia do treinamento para o alto rendimento, foi levada aos empresários – e esportistas desde sempre – Abílio e João Paulo Diniz, na época à frente do Grupo Pão de Açúcar. "Eles estavam atrás de um bom projeto. Idealizamos um lugar que unisse estudos científicos e esportes com o intuito de ajudar o Brasil a se tornar uma força olímpica. A apresentação desse projeto começava com a seguinte pergunta: ‘Como deixar um legado para o país?'. Acredito que esse seja o maior diferencial do NAR", conta o diretor técnico Irineu Loturco.
O núcleo começou a funcionar logo depois, em um espaço mantido pelo Pão de Açúcar (empresa até então dirigida pela família Diniz) no bairro do Morumbi, em São Paulo. Nos seis primeiros meses de funcionamento (entre novembro de 2011 e a maio de 2012) o NAR atendeu 30% dos atletas olímpicos que competiram em Londres. Além desses, 70% dos medalhistas dos Jogos Paralímpicos de 2012 foram avaliados e orientados pelos profissionais desse centro de excelência esportiva. Hoje, após avaliar e treinar mais de 1600 atletas de 78 especialidades esportivas, o NAR tem uma das maiores densidades de atendimento a atletas olímpicos e paralímpicos no mundo.
Em 2013, a família Diniz deixou o Grupo Pão de Açúcar, mas levou junto o NAR, que passou a fazer parte do Instituto Península – braço de investimento social do clã. No ano passado, com aporte de 15 milhões de reais e parceria firmada com a Prefeitura de São Paulo, o núcleo ganhou novas instalações no Centro Esportivo Municipal Joerg Bruder, em Santo Amaro, recém-inaugurado.
DUAS PISTAS. Conforme o acordo entre as partes envolvidas, o espaço cedido poderá ser utilizado por cinco anos e ser renovado posteriormente. Coube ao Instituto Península a doação de todo material e serviços para a construção da nova sede e para a reforma da pista de atletismo, do campo interno e do campo sintético do Centro Esportivo. O Instituto e seus patrocinadores (Procter & Gamble e Caixa Econômica Federal) são responsáveis pelos custos de manutenção e operação do núcleo, que conta também com o apoio da marca esportiva Under Armour.
O lugar é simplesmente fantástico. Seis vezes maior que a antiga casa, o novo NAR tem uma pista de atletismo oficial (400 metros) – considerada por especialistas uma das melhores do Brasil -, uma pista indoor com três raias (inclinada, reta e declinada de 130 metros), dois campos (sendo um deles de rúgbi, também no tamanho oficial e igualmente considerado um dos melhores do país), três área oficiais de tatame para artes marciais, um octógono (para MMA), equipamentos de musculação e computadores de primeiríssima linha e um auditório para 80 pessoas. Orquestrando tudo isso, Loturco conta com uma equipe técnica altamente capacitada.
Embora viaje e conheça muitos centros de treinamento em vários países, o diretor diz que não existe nada igual por aí. "Não foi inspirado em nenhum outro. Criamos um modelo de trabalho único, que une centro de pesquisas e centro de treinamento, 100% financiado pela iniciativa privada". E o conhecimento ali obtido também é compartilhado para que a ciência do esporte cresça ainda mais. "Já publicamos mais de 25 estudos mundo afora e temos dezenas em fase de avaliação", orgulha-se o diretor.
Em seus três anos de história, o NAR recebeu cerca de 1500 atletas e equipes de 70 modalidades diferentes. Entre os que já passaram por ali estão nomes como Arthur Zanetti, Maurren Maggi, Fabiana Murer, Keila Costa, Douglas Brose, Fernando Fernandes, Cinara Camargo, Adriana Aparecida, Vitor Belfort, Demian Maia, Fernando Portugal, Júnior Cigano, Ana Claudia Lemos, além das seleções de basquete, atletismo, boxe, futebol americano, rúgbi, judô, natação…
COMO FUNCIONA. O NAR avalia e prepara gratuitamente atletas e equipes de alto rendimento para a melhora do desempenho esportivo e capacita cientificamente técnicos e preparadores físicos a fim de potencializar os resultados do Brasil nas competições esportivas nacionais e internacionais. Mas não é o atleta quem bate à porta. "Quem nos procura são treinadores e confederações", explica Loturco.
Após o contato inicial, os técnicos chegam com seus pupilos e suas perguntas específicas. A partir de alguns testes – e muitos cálculos – são descobertos os pontos que precisam ser mais bem trabalhados. "Avaliamos força, potência e velocidade e auxiliamos os técnicos na prescrição do treinamento, de acordo com as necessidades". Esse trabalho também ajuda no processo de formação dos profissionais que trabalham no esporte. "Com um treino eu atinjo um atleta, mas ensinando um treinador eu atinjo toda a equipe de atletas dele."
TRABALHO DE BASE E LEGADO. Para o Brasil ser uma potência olímpica há que se fazer um belo trabalho de base. E isso é a longo prazo. "O projeto de alto rendimento fica manco sem um programa de esporte de base. Hoje ainda precisamos procurar muito para encontrar um atleta de alta performance. Projetos desse tipo precisam estar pulverizados para atingirmos mais pessoas", diz Loturco. A escola é um bom caminho. "Além de incentivar a criança a se movimentar, o esporte transforma, passa valores, educa como cidadão. Em vez de ídolos como Justin Bieber, deveríamos ter mais Fabiana Murer".
Como também faz parte do Programa Rede Olímpica, da Prefeitura de São Paulo, o NAR tem como objetivo promover a iniciação ao esporte de alto rendimento. "A gente sabe que ainda há muito o que se fazer, mas é importante valorizar o que já está sendo feito e acreditar que isso pode mudar nossa história. As pessoas criticam demais e fazem de menos. Nossos atletas são heróis. Temos de estimulá-los e investir neles. No NAR fazemos a nossa parte e contribuímos para deixar um legado para o esporte brasileiro", finaliza Loturco.