História admin 10 de março de 2015 (0) (139)

Fabinho, muitas qualidades

No final de 1994, um garoto de 17 anos me procurou com o objetivo de treinar e ser um grande atleta; seu nome era Fábio Luis Vasconcelos. Ele morava em Embu das Artes e em razão da dificuldade e gastos com a condução para se deslocar até os treinos da equipe no Parque do Ibirapuera, ficou combinado que eu enviaria sua planilha de treinos mensalmente pelos Correios. Durante muito tempo nosso contato foi por telefone e por cartas, visto que naquela época nem se cogitava a tecnologia do mundo atual.
Já reconhecia nele uma disciplina genuína, pois cumpria estritamente todos os treinos da planilha que lhe enviava no final do mês. Quando tinha dúvidas, me ligava e eu explicava direitinho o que fazer. Num certo mês o serviço postal entrou em greve e ele telefonou pedindo o meu endereço para vir buscar a planilha pessoalmente. Fabinho era realmente disciplinado, pois tinha uma característica acentuada: Comprometimento.
Passaram-se alguns anos de treino, evolução e amizade. Um dia ele me ligou com certa naturalidade para me comunicar que ficaria alguns dias sem treinar porque havia sofrido um pequeno acidente de trabalho. Ao questioná-lo sobre o acidente, ele disse que uma chapa de metal havia caído em sua mão decepando-lhe um de seus dedos. Impressionante sua calma diante de momentos que julgamos difíceis e essa era mais uma de suas características: Serenidade.
Em 1998, Fabio começou a frequentar o Ibirapuera pela necessidade de treinar com outros colegas do mesmo nível para sua evolução. Era um atleta talentoso que subiu várias vezes nos pódios, fazendo tempos espetaculares para um amador, como 2h28 em maratona. Nesse mesmo ano ele correu a Maratona de SP para me puxar e nunca mais me esqueci desse gesto, que passei a difundir sempre entre meus alunos: Companheirismo.
Mas Fabinho, como todo ser humano, também tinha suas tristezas. Por conta do seu acidente, ele teve que se aposentar por invalidez. Então lhe ofereci uma ajuda de custo para ele poder vir treinar no parque. Em troca ele me ajudaria na limpeza de colchonetes, arrumação dos materiais, etc. Nossa amizade cresceu muito e era genuína a gratidão que ele nutria por nós; assim conheci outra característica marcante do Fabinho: Lealdade.
Todos nós que lidamos com o público estamos sujeitos às críticas, sejam elas justas ou injustas. Sempre tento ajudar as pessoas ao meu redor e muitas vezes me decepciono e recebo críticas injustas que me magoam profundamente. Quem me conhece sabe que não tenho inimigos na vida, apenas tento fazer o meu trabalho sem criticar o alheio, pois entendo que o mundo é repleto de diversidade e há espaço para todo mundo crescer. Aqui fecho esse parêntese para dizer que antevia para Fabinho um futuro brilhante como treinador, pois uma coisa ele colocaria em primeiro lugar na sua profissão: Ética.
Fabinho passou no vestibular para Educação Física em 2008 e estava radiante de felicidade! Assim como na corrida, comprometeu-se com os estudos e chegava a destinar até 80% do seu salário com as mensalidades da faculdade. Nunca o vi reclamar, falar mal da vida ou adotar postura de vítima diante das circunstâncias. Mais uma de suas características marcantes: Otimismo.
No final de 2012 ele se formou na faculdade e estava radiante. Tinha conseguido sua inscrição no CREF, estava satisfeito e com a autoestima lá em cima. Como recompensa, providenciamos o visto americano para que no começo de 2014 ele pudesse ir conosco para Disney. Seria fantástico! Digo "seria" porque os fatos infelizmente interromperam sua corrida da vida.
No dia 30 de agosto, recebi uma ligação do seu irmão informando de sua morte em um acidente com o ônibus em que estava com a nossa colega Rosângela Figueiredo (ela continua hospitalizada, mas fora de perigo). Os dois iriam participar das 10 Milhas Garoto em Vitória. Meu amigo de quase 20 anos tinha ido embora. A pedido de sua mãe, Fabinho foi enterrado com a camisa da Equipe Tavares.
Sou professor de Educação Física, oriento profissionalmente meus alunos de corrida, mas gostaria que desta vez me perdoassem, pois tomei uma decisão que não recomendo: mesmo sem tempo para um treinamento adequado, correrei a Maratona de São Paulo em homenagem ao Fábio. Será minha forma de dar um último adeus, pois tenho certeza que ele estará mais uma vez comigo nesse dia!

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