20 de setembro de 2024

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Performance e Saúde admin 29 de março de 2015 (0) (90)

Existe fórmula de treino para uma maratona?

Dada a frequência com que o recorde mundial da maratona tem sido quebrado nos últimos anos, podemos facilmente enumerar três fatores que conseguiriam explicar esta constante melhora: corredores mais talentosos, melhores táticas de prova e estratégias de treinamento mais avançadas. Que os corredores atuais possuem habilidades excepcionais ninguém duvida, mas ao mesmo tempo o fato de que os recordes de distâncias menores não caem com tanta frequência talvez indiquem que o nível dos atletas não é o único diferencial, a menos que a ambição de vencer uma maratona esteja tirando corredores das pistas antes que eles possam atingir seu auge nas distâncias mais curtas.
No quesito táticas de prova também parece haver pouco para se melhorar, ou seja, a distribuição de ritmo ao longo dos 42 km também com frequência se aproxima daquilo que se considera o ideal em termos de gasto energético.
Mas e quando se fala em qualidade de treinamento? Será que já sabemos tudo o que há para saber em termos de planificação e distribuição de cargas quando se treina para uma maratona?
Avaliar o efeito de pequenas mudanças numa planilha de treinos é uma tarefa bastante difícil. A maior parte do que sabemos sobre o treinamento vem a partir da observação de estratégias utilizadas por atletas de sucesso ou pela análise de grandes quantidade de dados de corredores.
Sabemos por meio de estudos observacionais, por exemplo, que existe uma forte relação entre o volume semanal de treino durante a quinta e terceira semana antes da prova e a performance na maratona (semana -5 e -3 considerando a maratona como semana 0), e que esta relação se mantém até pelo menos cerca de 100 km semanais. Ou seja, chegar a um volume de cerca de 100 km semanais durante o pico de treinos para a maratona pode ser considerado um guia geral, mas dentro disso como fazer a distribuição das cargas é uma questão muito menos clara.

TANTO FAZ? Parte do problema vem da infinidade de formas de se atingir um mesmo resultado, o que exigiria uma quantidade impossível de testes para se resolver qual a melhor alternativa. Por exemplo, uma vez que um corredor decida que deve atingir 100 km (e este é um "número mágico" hipotético, não algo que você deva encarar como um pré-requisito para correr uma maratona) em seu pico de preparação, ele poderá dividir este volume em 3, 5, 10 sessões de treino, fazê-las no plano, em subidas, com intervalos ou trote leve o tempo inteiro.
No fim das contas, a resposta possivelmente resida no fato de que diversas estradas diferentes levam ao mesmo resultado. Basta pensar no exemplo de um recente estudo dinamarquês em que nadadores de elite foram divididos em dois grupos ao longo de 12 semanas. Um grupo manteve sua rotina de treinos normal, enquanto o outro diminuiu seu volume total de treino em 50% e aumentou a quantidade de treinos intervalados em 5 vezes. Ao final do período, não houve diferenças de performance entre os dois grupos. Isso mostra que aquelas discussões do tipo "por que 18 km e não 20 km neste sábado" possivelmente não levam a mudanças expressivas no resultado final de rendimento, pelo menos na medida em que as linhas gerais do planejamento sejam mantidas.
Se as guias gerais de treinamento para a maratona forem realmente "flexíveis", sendo possível utilizar diferentes metodologias e combinações de treinos para se obter determinado resultado, ainda assim é viável tentar melhorar o treinamento, de forma a garantir que toda a carga imposta durante o treinamento se converta em resultado no dia decisivo.

O FAMOSO POLIMENTO. O período de polimento é uma das áreas em que a ciência do treinamento esportivo contribuiu de forma mais significativa para melhorar a atuação de corredores. Não que ele tenha sido uma invenção de laboratório, mas existe uma quantidade significativa de estudos investigando os efeitos de diferentes estratégias de polimento, incluindo-se aí as relacionas a nutrição, treinamento, recuperação muscular e até foco psicológico.
Entende-se por polimento o período entre o pico de treinamento e o evento principal de uma planificação, neste caso a maratona alvo. O polimento pode (deve!) durar entre uma a três semanas, e é caraterizado por uma drástica redução no volume de treino e foco em trabalhos de qualidade, utilizando intervalos em ritmo de prova ou um pouco mais intensos.
A ideia por trás do polimento é simples: transformar da melhor maneira possível as cargas de treinamento em performance. A principal questão quando se fala sobre esta parte final da preparação é justamente em relação ao descanso necessário para garantir que o corredor esteja em seu melhor momento no dia da prova. Se o polimento for muito curto ou intenso, o corredor ainda estará cansado; se for muito longo, ele poderá ter iniciado o processo de "destreino".
Os estudos mais recentes sobre o polimento recomendam uma redução entre 40 e 60% do volume de treino durante as 1-3 semanas que antecedem o evento principal. Quanto mais intenso tiver sido a caminho até o pico de treinamento, ou quanto mais "cansado" estiver o corredor nessa fase, maior a duração e grau de redução de volume. Na semana imediatamente antes da prova, estratégias nutricionais como ingesta de alimentos ricos em nitratos (beterraba, espinafre etc) e o famoso carboloading (três dias quase sem carboidratos, seguidos de outros três exatamente ao contrário), visando aumentar o glicogênio muscular, entram como opções agudas de incremento de rendimento no grande dia.
Voltando à questão inicial de como comprovar a efetividade de uma intervenção sobre a performance, fica evidente que a prova alvo não é a hora certa para inventar ou testar coisas novas. Eventos menores (10 km, meias maratonas) são o laboratório ideal para o corredor descobrir todos os pequenos truques que podem levar àqueles minutos a menos na maratona. Ou seja, todas as estratégias planejadas para o período de polimento devem necessariamente ser testadas em eventos menores ao longo da preparação do corredor. Assim, ele também ganha confiança de que está seguindo o caminho correto, e não corre o risco de "desacreditar" o seu treinamento no último momento.

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