Blog do Corredor Fernanda Paradizo 11 de novembro de 2021 (0) (247)

Dois brasileiros contam como foi celebrar os 50 anos da Maratona de Nova York num evento histórico

A Maratona de Nova York chega à 50ª edição com a marca 1,3 milhão de concluintes desde seu início, em 1970. A edição comemorativa dos 50 anos, que era para ser celebrada em 2019 – e não foi por causa da pandemia –, foi realizada com número reduzido de participantes, mas nem por isso deixou de ter seu brilho e ser especial.

Ao todo, cruzaram a linha de chegada no Central Park 25.010 corredores dos 25.390 inscritos, representados por 91 países.

O número reduzido de participantes refletiu também na diminuição na quantidade de brasileiros, que até o dia da prova só podiam entrar no país se fizessem quarentena em países como México, por exemplo. A abertura só aconteceu no dia 8 de novembro, um dia depois da prova.

No total,  foram 111 brasileiros concluintes. O melhor deles na lista de classificação foi o major da polícia federal e professor de Educação Física Geraldo Pereira, de Brasília, DF, que finalizou a prova em 2:38:32, e ficou na terceira posição na categoria 40-44 anos.

O MAIS RÁPIDO ENTRE OS BRASILEIROS

Para garantir a participação na sua quinta Major, o corredor se programou para fazer a quarentena no México. “Já estava inscrito para fazer a prova em 2020. Seria a maratona para fechar as Six Majors, porque teria feito em abril a quinta, que seria Londres. Transferi minha inscrição para 2021 e fiquei aguardando.  A intenção era fazer as duas, mas, por causa da obrigatoriedade da quarentena, optei por Nova York”, conta Geraldo, que voou para a Cidade do México no dia 15 de outubro para fazer os 14 dias de quarentena e entrar nos EUA no dia 31 de outubro.

“Procurei transformar a adversidade numa oportunidade, que era a possibilidade de treinar em altitude, já que a Cidade do México fica entre 1.200 e 1.500 m do nível do mar. Cheguei a fazer treino até em 3,000 m.”

Geraldo chegou em Nova York no dia 31 de outubro e aproveitou para reconhecer o percurso e dar continuidade aos treinamentos. No dia anterior à prova, em vez de ficar na badalada Manhattan, preferiu Staten Island, onde acontece a largada da prova. Estudou cada ponto do percurso para não ser surpreendido no grande dia.

“É uma prova que exige do atleta. Já sabia isso. O percurso ainda está todo na minha cabeça, ponto a ponto, subida a subida. Via de regra, sabia que a cada 3 km tem uma subida. As pontes sugam bastante, com exceção da última, que é tranquila. A Queensboro é um detalhe à parte, uma subida longa. A 5ª Avenida é também longa e relativamente acentuada. E a longa Primeira Avenida é para enganar trouxa. É uma armadilha. Vai te minando. É por isso que Nova York é tão desafiadora. Não perdoa erros”, conta o corredor, que diz ter pegado também muito vento contra, que se tornou mais um dificultador da prova, além da temperatura fria.

“Larguei no azul, no curral logo depois da elite. Corri o tempo todo quebrando vento sozinho porque não tinha ninguém comigo no grupo. Na metade da prova, a previsão de conclusão estava em 2h32, mas sabia que não era realístico devido a parte final mais difícil. Mas isso já fazia parte da estratégia. Estou satisfeito. Agora é comemorar e continuar treinando para a próxima. Em outubro de 2022, pretendo concluir as Majors em Londres.”

COROANDO UM ANTIGO SONHO COM UMA MEDALHA ESPECIAL

Outro corredor que não mediu esforços para participar da celebração dos 50 anos da prova foi o jornalista Vicent Sobrinho, que nasceu em São Paulo e atualmente mora em Lisboa. Durante vários anos ele colaborou com reportagens para a Contra-Relógio. O desejo de marcar presença nas “Bodas de Ouro” de Nova York é antigo e tomou mais corpo quando viu a possibilidade de receber sua sexta medalha das Majors, naquela que é considerada a Rainha das Maratonas.

“Em 1994, a Maratona de Nova York conquistou meu coração e minha mente e foi a essa jovem senhora de 50 anos que prometi já naquele dia retornar”, lembra Vicent, que correu em 1994 em companhia do tio.

Essa é a terceira vez que o corredor vai para o evento. Além de correr em 1994, na comemoração dos 25 anos, da prova, ele esteve também em 2012, quando ganhou a categoria “jornalista” no time Asics Brasil (representando a CR). Naquele ano, a maratona foi cancelada às vésperas da prova devido ao ciclone Sandy.

Para realizar o sonho, Vicent também precisou se desdobrar, primeiro para correr a Maratona de Londres.

“As dificuldades foram imensas. Minha série das 6 Majors  estava planejada para fechar em 2020. Mas o mundo travou. Precisei empurrar a Maratona de Londres de 2019 para 2020 e depois, pagando novamente, para 2021. Quando estava encaixando o treinamento, meu pai faleceu e precisei retornar ao Brasil. Tudo desestruturou”, conta Vicent, que já estava desistindo do sonho quando, num treino no Parque do Ibirapuera, encontrou um ídolo de infância.

Estava decidido a esquecer as maratonas e voltar a morar no Brasil. E foi na única vez em pouco mais de 50 dias no Brasil que fui treinar no Parque Ibirapuera e encontro José João da Silva, bicampeão da São Silvestre, ídolo que virou amigo em 2009, após uma entrevista para as páginas da CR.”

Depois de correr 12 km, foi para o estacionamento e, quando estava abrindo a porta do carro, alguém tocou seu ombro. “Quando viro, era ele, o Zé João. Antes que eu falasse alguma coisa, me deu um fraternal abraço e disse: ‘Eu estava em Campos do Jordão e fiquei muito sentido quando soube da morte de seu pai. Por isso, te vi de longe e vim te dar esse abraço’. Como se fosse um holofote em minha direção ou um sinal de alerta, ele me fez refletir quando cobrou: ‘Está pronto para ir buscar as Six Majors?’”.

Vicent respondeu que estava desistindo e que naquele momento pensava apenas em trazer sua esposa de Portugal. “Ele mirou nos meus olhos e ordenou: ‘Você não vai cair, não. Não lhe dou esse direito. Dê a volta por cima. Todos os pais querem ver os filhos alegres e bem. Vá lá e faça isso para ele. E para você!’”.

Três dias lá estava ele em Lisboa com o objetivo de ir a Londres para receber sua quinta medalha do circuito e poder continuar sonhando com Nova York 50 anos.

Terminou a Maratona de Londres em 3:10:05 e retornou a Lisboa com a expectativa de que Jon Biden liberasse a entrada nos Estados Unidos no início de novembro. Quando foi anunciado o dia exato, Vicent teve que rever os planos. “Fui para o México para cumprir a quarentena.

Treinei em bom nível lá, com o luxo de uma pista e em altitude”, lembra Vicent, que seguiu para Nova York 4 dias antes da prova, onde viveu momentos inesquecíveis.

Ele cruzou a linha de chegada na Maratona de Nova York em 3:13:36 com foto do pai nas contas e a promessa de retornar novamente daqui 25 anos, aos 81. “Será?”, indaga ele, agora com a Six Medal Finisher no peito.

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