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Performance e Saúde admin 29 de março de 2015 (0) (127)

Corrida em excesso faz mal?

A questão sobre quanta atividade física é necessária para ser considerado um indivíduo "saudável" não é nova. Definir metas mínimas de atividade física semanal é uma questão de saúde pública, e em um mundo cada vez mais sedentário passa a ter uma importância crescente.
No entanto, uma vez que se comece a correr, por exemplo, até onde é preciso ir para ser cada vez mais saudável? Alguns anos atrás talvez alguém fosse dizer simplesmente que "quanto mais exercício, melhor". Esta visão – completamente sem fundamento – felizmente saiu de moda, porém muito em função do esporte de rendimento, e hoje já é amplamente reconhecido como não sendo atividade benéfica à saúde. Mas mesmo assim, ainda que se exclua o esporte profissional ou semiprofissional, até que ponto chega esta relação de "quanto mais, melhor" entre atividade física e saúde? Surpreendentemente, não muito longe.

MEDIDA OBJETIVA. Do ponto de vista estritamente fisiológico, o condicionamento de uma pessoa é medido através da máxima capacidade aeróbica, identificada pelo consumo máximo de oxigênio (VO2max). Esta medida é considerada um dos melhores indicadores de riscos de eventos cardiovasculares e mortalidade, o que se explica pelo fato de ela "unificar" a capacidade máxima de funcionamento dos sistemas respiratório, cardiovascular e muscular.
Outra forma de se expressar a capacidade aeróbica de uma pessoa é por meio de uma unidade conhecida como MET (equivalente metabólico de uma tarefa). Em poucas palavras, um MET equivale à energia (em unidades do consumo de oxigênio ou calorias, daí a relação com o VO2max) que o organismo gasta em repouso. Assim, diferentes atividades podem ter sua intensidade descrita em termos de sua equivalência ao gasto metabólico em repouso. Uma caminhada lenta, por exemplo, demanda 2 METs, ou cria um gasto energético equivalente a duas vezes o metabolismo de repouso.
Voltando à nossa questão inicial, se ficar sentado em uma cadeira utiliza 1 MET, quanto é preciso ser capaz de gastar (lembrando que o valor em METs só será atingido se os sistemas respiratório, cardiovascular e muscular conseguirem dar conta da atividade) para ser considerado um homem ou mulher saudável?
Estudos de larga escala, investigando de milhares até dezenas de milhares de pessoas, mostram que indivíduos com uma capacidade máxima de 10 METs ou mais estão no topo da escala de saúde, para uma faixa etária de cerca de 40-50 anos. Para se atingir uma carga de corrida equivalente a 10 METs basta ser capaz de correr por 4 ou 5 minutos em um ritmo de 12 km/h, ou 5 minutos por quilômetro.

CARGAS DE TREINO SEMANAL. Definimos então que para fins de saúde não é preciso nenhum feito incrível, nem mesmo correr 10 km abaixo dos 40 minutos. Se por um lado atingir a medida objetiva de condicionamento físico absoluto já não parece mais tão difícil, pelo menos para aqueles que já correm o que podemos dizer sobre os efeitos dos hábitos de atividade?
Independente da capacidade aeróbica máxima, pode ser que pelo menos quem corre mais ou com mais frequência fique ainda melhor colocado em nossa escala de saúde. Será? Segundo um estudo recentemente publicado no Journal of the American College of Cardiology, com grande repercussão na mídia internacional, a situação poderia ser exatamente o contrário, e existiria até uma relação de "U" invertido entre a quantidade de atividade física praticada e a saúde de uma pessoa. Em outras palavras, exercício faz bem para a saúde, mas demais faz mal.
Um dos primeiros dados deste estudo, publicados ainda em 2012, já mostrava que o hábito de correr era responsável por aumentar a expectativa de vida em cerca de 3 a 6 anos. No entanto, quando o grupo "corredores" era dividido em faixas, aqueles que corriam mais do que três vezes por semana ou então em velocidade mais alta possuíam risco de mortalidade tão elevado quanto o de indivíduos sedentários, inclusive eliminando os 3 a 6 anos de longevidade extra.
A "nova edição" do estudo, com dados mais recentes, corroborou os resultados antigos. A grande surpresa foi o nível de atividade física semanal encontrado como ótimo pelo estudo: entre uma a três vezes por semana, cerca de até quatro horas por semana, em ritmo entre 8 e 10 km/h.

CICLISMO E CAMINHADA. Por outro lado, quando pesquisadores avaliaram dados do mesmo banco de informações com relação aos hábitos de pedalar ou caminhar, foi encontrada uma relação positiva e contínua entre intensidade de exercício e saúde, mas não com a duração do exercício. Em outras palavras, quanto mais intensa a sessão de ciclismo, maior os ganhos em saúde e menor o risco cardíaco, independente de quantas vezes por semana ou de quanto tempo se pedala em cada sessão.
Será então que correr em velocidades mais altas faz mal para o organismo? Como colocar estes números frente aos 5 minutos em 12 km/h de que falamos anteriormente? A resposta possivelmente está na força estatística do estudo citado.
Enquanto os grupos de corredores "leves" e "moderados" possuíam algumas centenas de participantes, apenas cerca de 40 pessoas se encaixavam na categoria de "alta intensidade" para corrida, o que diminui em muito a força dos achados.
Um estudo muito maior, com cerca de 50 mil participantes, demonstrou um efeito protetor para a corrida, sem que esse benefício se perdesse com a intensidade. Apesar disso, correr cerca de uma a duas vezes por semana, com um volume semanal de cerca de 50 minutos de corrida num ritmo abaixo dos 10 km/h já conferia tantas vantagens quanto qualquer corrida mais intensa, o que é semelhante ao estudo anterior.
Correr pode ser uma atividade extremamente prazerosa e seus benefícios vão muito além da esfera estritamente fisiológica. No entanto, é preciso desmistificar a ideia de que é preciso correr muito para ser uma pessoa saudável, pois isso apenas afasta o iniciante. O objetivo está logo ali à frente, bastam alguns minutos a 5 min/km, e não uma maratona. É só começar.

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