A Associação Mundial de Atletismo Máster possui o ranking dos 100 m rasos até a categoria 100 ou mais anos. A marca, por curiosidade, é de 29.83 segundos, o equivalente a um "trote" de quase 12 km/h; muitas pessoas não conseguiriam tal feito, se pegar o ônibus dependesse disso! Ainda mais impressionante, as categorias 90-94 e 95-99 são lideradas pelo brasileiro Frederico Fischer com as marcas de 17.53 e 20.41 segundos respectivamente!
Porém, excluindo-se estes casos extremos dos atletas de elite da terceira e quarta idade, o que vemos hoje é uma população que começa a correr em idade cada vez mais avançada, muitas vezes após décadas consecutivas de sedentarismo. Talvez por questões econômicas ou profissionais, muitas pessoas abdicam da atividade física regular no período entre a adolescência e a casa dos 40 – 50 anos, quando já possuem uma situação financeira e familiar mais estabelecida.
O organismo, no entanto, já não é mais o mesmo. A partir da terceira década de vida os primeiros sinais de envelhecimento já começam a aparecer, e o pico absoluto de performance do organismo já não pode mais ser atingido.
ADAPTAÇÃO AO TREINAMENTO. Se por um lado o organismo adulto já não é mais capaz de produzir altíssima performance, por outro ele ainda é plenamente capaz de se adaptar aos estímulos de treinamento. Apesar de o pico de performance física ocorrer entre a segunda e a terceira décadas de vida, é somente a partir da quinta que a perda de força e resistência se torna mais explícita.
Estudos mostram, inclusive, que pelo menos em termos relativos as respostas ao treinamento físico são razoavelmente similares quando se comparam adultos jovens e de idade avançada. Além disso, também existem evidências de que pessoas mais velhas necessitam de cargas (novamente em termos relativos, não apenas absolutas) mais baixas para desencadear processos adaptativos.
Em termos de performance física, o envelhecimento é percebido tanto pela perda de massa muscular, causada por diminuições quantitativas e qualitativas da estrutura muscular, quanto pela perda de massa mitocondrial (mitocôndrias são as estruturas celulares onde a "queima" de oxigênio efetivamente ocorre).
Esta combinação tende a criar um círculo-vicioso, em que a diminuição de força e resistência leva ao destreino, que por sua vez potencializa a degeneração muscular. No nível molecular, acredita-se que parte do processo de envelhecimento seja resultante de uma redução na capacidade antioxidante do organismo.
CAPACIDADE ANTIOXIDANTE. Uma das consequências naturais do metabolismo de oxigênio é a formação das chamadas moléculas reativas de oxigênio, que em altas concentrações podem danificar as estruturas celulares, no chamado estresse oxidativo. A prática de exercícios físicos, por sua vez, aumenta a capacidade antioxidante do organismo, combatendo assim parte dos efeitos do envelhecimento.
No universo da corrida, a performance e a capacidade aeróbica sofrem baixas em praticamente todas as frentes: a capacidade cardíaca diminui tanto em batimentos por minuto quanto em bombeamento de sangue; ao mesmo tempo, a capacidade muscular de extrair oxigênio do sangue para utilização nas mitocôndrias também diminui. Além disso, a diminuição de massa e força muscular aumenta o esforço relativo para correr a uma dada velocidade, independente da capacidade aeróbica do organismo.
Apesar de o treinamento aeróbio – independentemente do nível – não ser capaz de estancar esta tendência de redução da capacidade física que ocorre com o passar dos anos, a taxa de queda pode ser drasticamente diminuída na presença da uma rotina de treinamento adequada.
Indivíduos treinados na faixa dos 60-70 anos, por exemplo, possuem capacidade aeróbica semelhante a de pessoas entre 23-31 anos, quando os valores são expressos relativos à massa corporal. Além disso, a capacidade aeróbica de pessoas treinadas nesta faixa etária é praticamente o dobro da medida em um grupo de idade semelhante, porém sedentários. Dados comparando pessoas de idades diferentes, no entanto, muitas vezes podem não representar exatamente o que ocorre com um indivíduo ao longo da vida.
FREAR O INEVITÁVEL. Por outro lado, estudos longitudinais – pesquisas que acompanharam grupos de indivíduos ao longo de vários anos, permitindo assim se monitorar a evolução das mudanças -reforçam a ideia de que a perda de condicionamento é inevitável, porém pode ser freada pelo treinamento físico. Por exemplo, um estudo acompanhando pessoas de cerca de 45 anos ao longo de 22 anos mostrou que os participantes mais treinados perdiam a capacidade aeróbica a uma taxa de 6% por década, enquanto para os destreinados o ritmo era 15%.
Apesar da óbvia importância quando comparada ao sedentarismo, a taxa de queda de capacidade aeróbica, ao menos para quem já é treinado, não parece assustar muito. No entanto, quando se fala em performance propriamente dita, uma breve análise dos recordes mundiais máster indica que para cada década a mais de vida existe um aumento de cerca de 10% tanto para os 10 km quanto para a maratona, sugerindo uma evolução de 1% ao ano.
Dessa forma, para uma prova de 10 km corrida em 50 minutos, por exemplo, 1% representa uma diferença de 30 segundos por ano. Para uma maratona de 4 horas, este 1% representa cerca de 4,4 minutos! Ao corredor que começa tarde, e que demora talvez um, dois ou até três anos para atingir seu pico pessoal, é fundamental levar estes números em conta em seu planejamento, a fim de evitar constantes desapontamentos com o seu rendimento.
O esportista precisa entender que a simples "manutenção" da performance ao longo dos anos já irá representar uma sobrecarga, e também perceber que o organismo precisará de cada vez mais tempo para se recuperar entre as sessões de treino, o que irá demandar uma diminuição gradual das cargas, dificultando ainda mais a "melhora" absoluta de performance.