O método utilizado por Zatopek, até então revolucionário, foi um marco do treinamento científico e é hoje amplamente utilizado em todas as modalidades esportivas. O pai do intervalado foi o alemão Woldemar Gerschller.
As variáveis – O segredo do método está na conjugação das suas variáveis:
1) Estímulo (o popular "tiro")
2) Duração e intensidade do estímulo
3) Número de repetições
4) Duração e forma de repouso (ativo ou passivo).
Essas variações visam o desenvolvimento da resistência anaeróbia, aeróbia, velocidade de reação, de deslocamento, a força explosiva e dinâmica, a capacidade de recuperação, a coordenação, o ritmo e a agilidade.
Dependendo do objetivo e fundamento propostos, o segredo está na intensidade dos estímulos e na recuperação. Estímulos mais fortes, recuperação mais longa. Estímulos mais fracos, recuperação curta e ativa, visando menor concentração e remoção mais rápida de lactato. Isso faz com que o rendimento cardíaco também seja desenvolvido com o aumento das câmaras e fortalecimento das paredes do coração, proporcionando maior volume e força de ejeção ventricular.
Efeitos cardiovasculares e psicológicos. O volume e a pressão de sangue ejetado pelo ventrículo esquerdo são maiores no intervalado. A importância disso diz respeito à entrega mais eficiente de oxigênio ao músculo, com reflexos diretos nos valores cardiovasculares. Pessoas, atletas ou não, que só executam treinamento contínuo mostram menor condicionamento cardiovascular quando comparadas com as que realizam treinamento misto (intervalado e contínuo).
Ou seja, o volume máximo de oxigênio (VO2max) é maior, a freqüência cardíaca de repouso é menor e a recuperação da freqüência cardíaca após cada estímulo é mais rápida. Sabe-se que um dos fatores dessas respostas cardíacas tem a ver com a liberação de neurotransmissores, como a noradrenalina e a conhecidíssima adrenalina, que são mais estimuladas.
É com estímulos mais fortes também que corredores em algum momento na vida já sentiram o efeito analgésico, antidepressivo e prazeroso da igualmente conhecida beta-endorfina, substância liberada no cérebro e a ela atribuída a dependência da corrida. Quem corre mais forte sente esse prazer e o intervalado faculta os não treinados a também terem essa sensação, levando-os a não desistirem e evoluindo no treinamento.
É para todos. O treinamento intervalado, ao contrário do que possa parecer, não é destinado só para atletas. Partindo da sua filosofia básica que é conjugar de modo adequado para cada indivíduo estímulo x recuperação ativa ou passiva, o método é indicado tanto para fins de performances como terapêuticos. Um cardiopata que anda, pára para descansar, anda de novo e assim sucessivamente, está realizando um treinamento intervalado; ou não?
Portanto, na maioria das vezes, é o primeiro treino para a recuperação, tanto das habilidades funcionais como do desempenho. Uma pessoa que sai para caminhar variando a velocidade, ora depressa, ora devagar, ou, ora trotando ou correndo, está realizando um intervalado.
Como no treinamento intervalado os estímulos (tiros) são mais curtos com velocidades maiores, os sistemas de energia aeróbio e anaeróbio são recrutados com mais intensidade do que numa atividade contínua, beneficiando principalmente as fibras musculares de contração lenta que são alimentadas aerobiamente. Experimentos concluíram que as pessoas mais beneficiadas com o intervalado são justamente os não treinados e moderadamente ativos. Os atletas, por já estarem próximos dos seus limites máximos, ganham menos, proporcionalmente.
Mais benefícios. Ficou demonstrado também que a resistência à fadiga melhora significativamente em mais ou menos 20% se comparado com treinamento contínuo de mesma duração de tempo.
Outros experimentos com atleta bem treinados têm mostrado que boa capacidade cardiovascular reflete em melhor tolerância ao calor por conta do aumento do fluxo sanguíneo periférico nos treinamentos intervalados.
Para emagrecer. Até para fins de emagrecimento o método tem se mostrado bastante eficiente, mais atraente e motivador. Como dito anteriormente, se compararmos um treinamento contínuo de 40 minutos com velocidade moderada com um intervalado nos mesmos 40 minutos, no segundo a soma de calorias gastas são maiores porque embora os períodos de recuperação aconteçam numa velocidade fraca, durante os estímulos (tiros) a demanda de oxigênio é muito maior e sabe-se que o corpo gasta mais ou menos cinco calorias para cada litro de oxigênio consumido. Ora! Já é bem estabelecido que emagrecer, em princípio, significa gastar mais calorias do que ingerir.
Para um sujeito obeso querendo emagrecer é mais fácil, suportável e eficiente fazer intervalado do que caminhar e/ou correr sem parar por 30 ou 40 minutos como se apressam em afirmar alguns teóricos. Fazer cinco ou seis piques de moderado a forte, intervalando com trechos de descanso, além de gastar menos tempo é menos monótono do que caminhar 30 minutos, o que para o obeso pode ser uma eternidade.
Já ficou demonstrado em experiências na bicicleta ergométrica que sprints em velocidade máxima conjugado com períodos de repouso aumenta mais a resistência à fadiga quando comparado com treinamento contínuo. A explicação está no sistema de energia utilizado pelo corpo.
Embora Zatopek tenha ficado famoso, costumo dizer que o ser humano já nasceu intervalando. A criança anda, corre e pára para descansar. E os animais fazem isso naturalmente. Observe os cachorros; eles brincam desenvolvendo o instinto de luta, ataque e defesa, intervalando. Quando um deles cansa, é como dissesse: a brincadeira acabou. Tão logo se recuperam eles voltam ao treinamento.
Entendo que as atividades cotidianas do ser humano exijam muito mais do sistema anaeróbio do que do aeróbio, principalmente se o indivíduo for um sedentário. Ao atravessar depressa as ruas para não ser atropelado, ao subir escadas carregando compras, ao dar aquela corridinha básica para pegar o ônibus etc, a gente faz intervalado a toda hora sem saber.
Conclusão. É bom reforçar. Não estou condenando o treinamento aeróbio. Ele é de vital importância e na década de 70 ("era Cooper") não faltaram trabalhos comprovando seus benefícios, sobretudo a nível cardiovascular.
O mais sábio no treinamento moderno é variar as atividades. Infelizmente, ainda encontramos muita gente resistente a propostas do treinamento anaeróbio e ou de força para grupos especiais. São tão benéficos quanto. O bom senso ainda tem um peso importante na prescrição de exercícios e por mais que estudemos, observemos e treinemos, cada vez mais chegamos à conclusão que o ser humano é infinitamente versátil.
Por isso mesmo, evito afirmar que esse ou aquele treinamento é melhor para esse ou aquele sujeito. O melhor treinamento é o que cada um gosta de fazer, se possível sem grandes sacrifícios.
Algumas pessoas me perguntam quantas vezes por semana devemos fazer exercícios. Costumo responder com outra pergunta: quantas vezes por semana você dorme ou come? O exercício deve fazer parte do dia-a-dia das pessoas, como fazem os corredores. Um dia mais forte outro mais fraco e assim vai, sem muitas regras fixas.
Todos nós temos limitações ao iniciar e sem uma boa dose de perseverança, disciplina, visão de meta, entre outras qualidades, não superamos os desafios. Com o tempo descobrimos do quanto somos capazes. Aquele que não andava um quarteirão agora corre. O que nem sabia nadar agora faz travessias. Cada um só chega onde acha que pode chegar.
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