Sem categoria admin 4 de outubro de 2010 (6) (128)

Corra das bolhas

Mesmo com uma bolha no pé esquerdo, Franck Caldeira,25, cruzou a linha de chegada em primeiro lugar na maratona dos Jogos Pan-Americanos do Rio.

Quando fazia os pés semanalmente, a cirurgiã dentista Maria Cristina Bellini Cabrera, 25, não parava de se lamentar das bolhas, unhas encravadas e marcas da corrida estampadas no pé.

Sempre que faz treinos longos ou meias-maratonas, o empresário Júlio Fernandes, 30, sofre com bolhas de sangue que se formam embaixo da unha e estouram durante a corrida.

O atrito e a duração do exercício é, na maioria das vezes, a causa das bolhas nos pés do corredor", explica o dermatologista Reinaldo Tovo, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica. Também, não é para menos. Afinal, a cada quilômetro corrido os pés batem no chão quase mil vezes. A cada passada, eles absorvem um impacto de quatro até seis vezes maior que o peso corporal. Eles aterrissam, rolam para frente e decolam do chão, em um movimento que se repete por uma, duas ou três horas seguidas, a depender do tamanho do longão.

As bolhas são a acumulação de fluidos entre as camadas interiores e exteriores da pele, que aparecem em função de um processo inflamatório. E essas inflamações ocorrem por agentes físicos, como as queimaduras e o calor, agentes químicos, que são as substâncias cáusticas e após traumas mecânicos, como no caso da corrida, explica Tovo.

"Geralmente, as bolhas que aparecem por agentes mecânicos – como a corrida – têm um conteúdo claro, chamado exsudato. É o líquido transparente que fica por debaixo da pele".

Corredor que não deixa o pé bem limpo também corre o risco de sofrer com bolhas causadas pelos agentes infecciosos, como os fungos que formam micoses em locais úmidos, entre os dedos dos pés especialmente. Já os diabéticos e com problemas de circulação devem prestar ainda mais atenção às formações de bolhas, explica o médico. Isso porque essas pessoas têm tendência à má circulação nas extremidades do corpo, como os pés. "Ali o sangue tem dificuldade de circular e, quando uma bolha ou qualquer outra ferida aparece, a cicatrização é mais difícil", diz Tovo.

As bolhas que aparecem nos pés do empresário Fernandes, avalia Tovo, são em função do atrito repetitivo. "De tanto correr ele machuca o pé a ponto de ter micros sangramentos, em função do rompimento de algum vaso sanguíneo. As bolhas que se formam são de conteúdo hemático com sangue". Segundo o médico, as bolhas que aparecem debaixo das unhas, os hematomas subungueais, se formam no dedão do pé ou no quinto dedo.

Quando concluiu os 42 km da Maratona do Pan, Franck Caldeira tinha o pé esquerdo cheio de sangue. "Achei muito estranho quando vi, pois o problema dele, na semana que antecedeu a prova, foi justamente no outro pé, o direito", conta o fisiologista Henrique Viana, médico do esporte e técnico de corrida da equipe Pé de Vento, no Rio de Janeiro.

Um pouco antes da prova na capital carioca, Franck fez o polimento de seu treinamento em Cochabamba, na Bolívia, região de altitude. Depois de voltar ao Brasil, ele recebeu um novo tênis da Nike e ao usá-lo dias antes da maratona, apareceu uma bolha. "Franck ficou nervoso porque o tênis fez bolha no seu pé direito. O que é normal, pois é necessário um tempo para o pé se acostumar, para o tênis amaciar e se moldar ao pé do corredor. E ele não teve tempo para isso", explica Viana.

O treinador fez um curativo especial, com um emplastro específico e um fino esparadrapo, dois dias antes da prova e, no dia da maratona, o curativo foi caprichado. "Tinha certeza de que o pé dele estava protegido e que aquela bolha não atrapalharia na prova", afirmou o médico.

De fato, a bolha do pé direito não atrapalhou. O que incomodou mesmo foi um novo machucado, que surgiu no pé esquerdo, na segunda metade da prova. Franck terminou a prova mancando. "É só uma bolha, coisa normal, de maratona", minimizou ele no dia da competição.

Viana explica que, no caso do campeão, além da questão de amaciamento do tênis, comum a todos os corredores, Franck têm a pele muito fina, o que propicia o aparecimento de bolhas. "Além disso, ele não consegue correr com meias, o que é um facilitador para o surgimento das bolhas." Os negros, explica Viana, por terem a pele mais grossa, sofrem menos com esse tipo de lesão.

"Se não forem tratados adequadamente, bolhas e fungos, por exemplo, podem impedir o exercício físico regular", alerta Craig Burkhart, dermatologista professor da Universidade de Ohio, em artigo publicado na revista The Physician and Sportsmedicine.

Férias da manicure. Contra o rejeição pelas meias, como no caso de Franck, não há muito que fazer, explica a dermatologista Lilian Estefan. Mas, para a pele fina, especialmente entre as mulheres, o ideal para fugir das bolhas é dar um tempo nas visitas ao pedólogo. Foi o que fez a cirurgiã dentista Maria Cristina, a Kika, depois de sofrer muito com o aparecimento das bolhas nos pés, desde que começou a correr, em 2003. "No início achei que fosse o tênis, mas comprei um número maior, o que deu uma melhorada, mas não eliminou o problema".

Em 2004, Kika resolveu fazer a São Silvestre e seguiu todos os rituais para não ter problemas. Dois meses antes ela estreou um tênis, usou uma boa meia e foi para a prova. Nada adiantou. No 11° km, ela sentiu as primeiras dores que se intensificaram no 14°. "Segui firme até o fim, pois a emoção foi tomando conta e até me esqueci da dor". Quando terminou a corrida, a dentista tinha os pés cheios de bolhas, principalmente nas áreas de mais atrito entre a meia e o tênis. "Passei meu réveillon de chinelinho baixo, curativos e sentada, enquanto todas estavam de salto, dançavam e pulavam", lembra.

No ano seguinte, quando decidiu fazer uma meia-maratona, Kika comprou tênis novo, um número maior, meias especiais e sem costura, mas, o que fez toda a diferença, segundo ela, foi não fazer os pés com a pedóloga. "Meu treinador aconselhou a ficar pelo menos uma semana sem fazer os pés para a pele não ficar fina demais, o que favorece a formação de bolhas". Seguindo as recomendações, Kika completou a meia-maratona feliz e sem bolhas. "De 2005 até hoje nunca mais tive problemas com bolhas, continuo correndo meias-maratonas e planejo a Maratona de Chicago para 2008. Sem bolhas".

O COMENTÁRIO DE PAUL TERGAT

"De nada adianta a tecnologia dos tênis e das meias se o corredor não estiver com a mente tranqüila para suportar a dor", avisa o médico e treinador Henrique Viana. A dor faz parte da rotina do corredor e, de fato, é preciso aprender a lidar com ela. Viana conta que nem a bolha, nem nenhuma outra dor impediriam Franck de correr bem a maratona dos Jogos Pan-americanos. "Ele precisava provar para si mesmo que era capaz de suportar uma dor e chegar até o fim. A vitória, em termos de mídia, era essencial para a carreira dele". Mas, independentemente do aparecimento na mídia, Viana acredita que a vitória serviu para superar a Maratona de Pádova, na Itália, em abril deste ano.

"Ele passou por mim no km 35 e estava muito bem, com ritmo para concluir a maratona abaixo de 2h11. De repente, 2 km depois ele desistiu, alegando forte dor nas costas", conta o treinador que, ao encontrar o atleta depois, teve de deixar a amizade de lado e lhe dar uma bronca por ter parado faltando apenas 5 km. "De nada adiantaria todos os meus argumentos, se não fosse o campeão Paul Tergat. Ele se aproximou de nós e perguntou porque o Franck tinha parado; ao ser informado da razão,  ele disse para o Frankk: ‘Quando eu corro, eu sinto dor em todo o meu corpo'. Acho que essa colocação o encorajou para continuar treinando para maratona e aprender a suportar as dores de uma maratona, e só desistir em último caso", lembra o treinador e amigo de Franck Caldeira.

Veja mais:
Como evitar bolhas
Como tratar as bolhas

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6 Comments on “Corra das bolhas

  1. Nunca tive bolhas ou problemas nas unhas, mesmo em treinos longos (treino para 1/2 maratonas) ou rápidos. Achava que era porque usava meias especiais e tênis do tamanho certo. Mas lendo o caso da Kika, de repente é porque não fico mexendo muito no pé, não uso lixas ou tiro cutículas, apenas uso esmaltes e hidrato bem os pés.

  2. Já fui assinante,mas devido algumas situações parei.Não tenho treinador e já corro a 10 anos e gostaria de saber q.o eu tenho q. fazer p/ melhorar meu nivel de gordura s/ me prejudicar?Meu nivel de gordura é baixo e o meu colesterol q. chamam de ruim deu alto minha alimentação é bem balanceada e não sei como q faço p/ melhorar este quadro já q. quase não como gordura.Tenho 1;70 de altura e peso 61kg.

  3. Ora BOLHAS!!!
    Calço 42 – Fiz 15 maratonas e outras várias meias. Até as primeiras 10 maratonas, acabava com bolhas e sempre perdia a unha do dedão que ficava preta e caia.
    Um dia em viagem ao exterior comprei uns três pares de tenis com numeração que aqui ainda não havia 42,5 (10,5 USA) e 43 (11 USA) e nunca mais me preocupei com o grande incômodo de de correr com dores nos pés. Outra dica importante é a de não se preocupar com a estética da sola do pé e deixar que com o tempo vai criando uma calosidade natural que é o grande trunfo.

    É isso. Boas corridas e sigam a Contra Relógio.

  4. Eu uso vaselina no pé, na região onde costuma aparecer bolhas caso não usasse.

  5. Olá…corro desde 1993 e o que faço para não ter bolhas é simples: não corto as unhs do pé pelo menos uma semana antes da prova e nos lugares mais sensíveis ao aparecimento de bolhas paso esmalte (de unha) ou base que servem para revestir a pele. Nunca tive problemas com as bolhas e não que meus pés sejam um “casco”…por sinal é bem sensível. Até.

  6. Bom dia.
    Nas corridas de 10km nem tanto, mas nas maratonas as bolhas apareciam apesar de usar vaselina sólida, eu que tenho joanete já viu, meu sofrimento era constante, agora passei a usar o esmalte no peito do pé onde aparecia as bolhas,e realmente não tive mais bolhas, passe o esmalte incolor antes de colocar a meia e deixe secar ai e só alegria, e o que vou fazer neste domingo na meia maratona de Curitiba blz, inté.

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