Todo mundo que corre já ouviu/leu a expressão “beba antes de ter sede, para não se desidratar” ou “beba um copo de água a cada 20 minutos de exercício”, sendo a fonte dessa aparente verdade geralmente um treinador ou nutricionista.
Como editor da revista Contra-Relógio e maratonista experiente, sempre achei exageradas essas recomendações, porque constatava na prática que não havia a necessidade de ingestão de tanto líquido. Aí, passei por uma experiência, que me motivou a escrever um editorial na CR e a levantar a bandeira de crítica a essa postura, presente na publicação por vários anos.
Vamos aos fatos. Saí um dia logo cedo e treinei muito bem por 20 km, ajudado em parte pelo dia nublado e com temperatura amena. Ao chegar em casa, constatei que tinha esquecido de me hidratar no percurso, ou seja, não tinha sentido necessidade alguma de beber. Então, como ficavam aquelas insistentes recomendações da época, citadas no início deste texto?
Descobri que tudo que se falava tinha pouca ou nenhuma base científica e, mesmo assim, era repetido como algo fundamental para a vida das pessoas, especialmente se praticassem algum esporte. Depois vi que era o mesmo que acontecia em relação às orientações para se alongar antes de começar a correr, que não serve para nada, mas isso eu deixo para outro artigo.
Motivado pela constatação de que havia algo de errado no “beba antes de ter sede”, pedi uma matéria (imagem) para o colaborador Márcio Dederich, que praticamente esgotou o assunto e motivou o título Agora é para beber só quando tiver sede, não antes! E que foi a CAPA da edição de novembro 2006, com ilustração de Marcelo Quintanilha, ironizando a situação.
Muita gente não gostou dessa campanha da CR, mas a realidade acabou se impondo aos poucos, inclusive em função de algumas mortes em maratonas por hiponatremia, que é a diluição de eletrólitos no plasma sanguíneo, devido ao excesso de ingestão de água.
Então, ao ler na Folha de S. Paulo (11/05), um artigo traduzido do The New York Times, cujo título é “Beber água ao sentir sede é o suficiente para ficar hidratado”, fiquei feliz por termos antecipado esse alerta há 16 anos. Em síntese, diversos professores e pesquisadores norte-americanos enfatizam a hipervalorização que se deu à hidratação, como a proposta que se deve beber 8 copos de água diariamente, caso contrário sua saúde vai deteriorar.
Essa e outras bobagens generalistas deixam de levar em conta o indivíduo e seu entorno. Assim, voltando ao nosso esporte, se uma pessoa é gordinha (portanto, transpira bastante) e está correndo sob forte calor, talvez tenha necessidade de se hidratar a cada 15 minutos, enquanto outra magra e treinando com temperatura em torno de 20 graus, provavelmente poderá sentir sede apenas depois de 2 horas.
Essa excessiva preocupação com a hidratação acaba repercutindo entre alguns organizadores, que em provas de 10 km chegam a colocar 3 postos de abastecimento no percurso, quando bastaria um ou mesmo nada (a depender da temperatura no dia), além do da chegada, naturalmente.
Então, na próxima corrida que for fazer, esqueça essas “verdades” sobre hidratação e simplesmente beba apenas quando tiver sede, e pouco de cada vez.