POR DEBAIXO DO BRAÇO. Era junho de 1996 numa etapa do Circuito Telebrás de 10 km na quente Manaus, em um percurso plano e considerado pelas competidoras como relativamente fácil. A nata da elite feminina estava lá, entre elas Carmem de Oliveira, Risoneide Vanderlei, Rosângela Faria e Nadir Sabino. Mas faltando pouco mais de 2 km para a chegada, uma outra atleta, que seria a campeã, entrou na disputa e ela nos conta como foi esse momento.
Após 2 anos afastada por tratamento de lesões nos calcanhares, Maria das Graças (ainda não casada com o fotógrafo Tião Moreira) retornava às corridas. Ela recorda que no início a disputa estava muito acirrada com o bloco correndo junto até o 4º km, quando Risoneide se separa e abre 20 metros de Graça e Nadir, por sua vez perseguidas por Carmem e Rosângela. Na altura do 6º km, as posições estavam quase definidas, com Risoneide em 1º e ela na 2ª colocação. "Eu corria, já não mais pensando em disputar a vitória, mas apenas para garantir minha posição."
Perto do 9º km, o motociclista da prova, simpaticamente, começa a avisá-la que a terceira está se aproximando. Ele gritava: `A primeira está longe e você não pega mais, mas se você não aumentar o ritmo a 3ª vai lhe passar´. "Quando olho para trás a Carmem vinha com suas passadas largas me ameaçando ultrapassar; ela tinha sido a campeã da São Silvestre. Não sei de onde arrumei tanta força para me garantir na posição, e ao me aproximar da chegada avistei a Risoneide levantando os braços para uma platéia enorme e vibrante, posicionada numa arquibancada, comemorando por antecipação a sua vitória. Quase em cima da linha eu passei praticamente embaixo do braço esquerdo dela e cruzei em primeiro. Acredito que as pessoas estavam gritando para avisar a ela que eu estava chegando, mas ela achava que eram gritos em comemoração pela vitória. Tive sorte, poderia ter acontecido o mesmo comigo!"
FAVORITO PERDE 3 VEZES. Outra sensacional disputa aconteceu em abril de 2001, quando da última prova, de 10 km, da temporada de Delmir dos Santos nos EUA, um atleta que dificilmente deixava de subir ao pódio nas corridas em que entrava no Brasil naquela época. Ele conta que havia 3 corredores africanos estudantes das universidades locais e alguns corredores americanos e que um era especial, porque tinha acabado de correr 10 mil metros para 28:20 – Weldon Johnson, 12 anos mais novo que o brasileiro. "Era esse o cara a ser batido", lembra Delmir.
No momento da corrida chovia, era inverno no Texas e fazia frio (12 oC). Para acelerar a prova, havia duas "metas volantes" – dois pontos em trechos determinados onde o corredor que passasse em 1º faturaria US$ 500 de bônus e Delmir ganhou as duas. Mas, com esse prêmio garantido, Delmir acabou relaxando e o americano se aproximou, em busca do prêmio maior. "Ele pensou que eu estivesse morto, não acreditando na minha chegada forte, que sempre foi minha característica. Além disso, a 100 metros do final ele cometeu um erro, que lhe custou a perda da vitória: o americano desviou de uma grande poça d'agua e eu passei no meio dela, garantindo o 1º lugar por menos de 1 segundo.
TAMBÉM NA SÃO SILVESTRE. Na edição de 1993 de nossa prova mais famosa, o etíope Fita Bayesa vinha para a vitória praticamente certa, com pequena, mas firme vantagem sobre o queniano Simon Chemwoyo, desde a entrada na Avenida Paulista. Ele seguia o caminhão da TV Globo (e aproveitava o vácuo também) e não reparou que este estava na faixa da direita, enquanto o pórtico de chegada ficava nas faixas centrais da avenida. Quando deu por si, estava correndo dentro da baia reservada à dispersão dos veículos da prova. O desespero foi total e não só dele, mas também da organização e da platéia, com o impasse sendo resolvido por um staff, que tomou a iniciativa de abrir a grade para o etíope voltar ao percurso correto. Mas não adiantou: Chemwoyo já vinha em forte sprint e garantiu o bicampeonato na São Silvestre.
O VÔO DE RAMAALA. A Maratona de Nova York de 2005 reservou uma disputa muito especial entre dois grandes atletas. O queniano Paul Tergat e o sul-africano Hendrick Ramaala protagonizaram um final emocionante e meio atrapalhado por parte de Ramaala, que defendia o título da competição. Depois de um duelo de cerca de 400 metros um tentando se desvencilhar do outro, os dois chegam à linha final praticamente juntos, com a menor diferença já registrada na prova.
Na tentativa de cruzar a linha de chegada em primeiro, Ramaala se joga à frente do queniano e vai ao chão. Tergat sagra-se campeão, com o tempo de 2:09:30, praticamente com o mesmo tempo do sul-africano, sendo até hoje a chegada mais apertada da história da competição americana. A disputa levou a platéia ao delírio e o acontecimento foi eleito como "TOP 5 Moments" nos 50 anos de comemoração do New York Road Runners, organizador dessa que é a maratona mais famosa e desejada do mundo.
ILUDIDA PELO TAPETE. Aqui no Brasil, um final também atrapalhado tirou a vitória de Ana Luiza Garcez, a "Animal", de uma das etapas do Circuito das Estações, realizado no Pacaembu, em 2007. A ex-menina de rua se enganou com a posição de um segundo tapete posicionado ao final, um pouco mais adiantado, e não cruzou o pórtico de chegada. "Parei porque achei que era ali a chegada. Os dois tapetes me confundiram. Vi um monte de fotógrafo e até fiz pose, achando que tinha ganhado a prova. Quando percebi, a 2ª colocada, que estava bem perto de mim, cruzou a linha e acabou vencendo", conta a atleta, que na época ficou bem chateada com acontecimento. O episódio serviu de lição para ela, que agora diz nunca mais se iludir pelo tapete. "Cruzo o pórtico e vou até o final do funil, para garantir."
NO MESMO TEMPO. Em 10 de setembro de 2006, Fábio Nascimento perdeu por décimos de segundo a Meia Maratona de Buenos Aires. Ele relembra como foi essa tensa corrida. "A disputa aconteceu praticamente desde a largada. Eu estava seguro da minha forma e resolvi correr ao lado do favorito e bicampeão da prova, o argentino Oscar Cortines."
"O ritmo estava em 3:00 por km e após algumas mudanças de posições no pelotão dianteiro, composto de vários atletas sul-americanos, um queniano e também Adriano Bastos, decidi tentar acompanhar Cortines, que abriu do grupo no km 12. Eu não queria deixá-lo se afastar, para tentar a vitória e se possível bater meu recorde pessoal, conseguido lá mesmo no ano anterior (1h06) quando tinha sido 3º colocado. Estava confiante!"
Fábio comenta que sabia da rapidez do argentino e via a torcida a seu favor, mas acreditou que poderia vencer e nos últimos 150 m, já perto da curva antes da reta final, assumiu a ponta. Mas o argentino veio atrás, emparelhou e foram assim até o tapete do chip, cruzando juntos, sem ninguém saber quem tinha sido o campeão.
Após a chegada, muita confabulação e os juízes decidiram pela vitória de Cortines, alegando que apesar dos dois terem pisado no tapete exatamente no mesmo momento, o atleta argentino passou com o tronco um pouco à frente e este detalhe é o que definia o resultado. Também deve ter influenciado na definição, o fato do patrocinador da prova ser o mesmo do corredor argentino…