POR DENISE AMARAL
A pandemia e as restrições de viagens no período deixaram o calendário de corridas maluco e quem já tinha as inscrições teve que se adaptar. Como não sou ligada em desempenho, mas sim nas oportunidades, lá fui eu pra Europa correr as maratonas de Berlim, Londres e Lisboa, em sequência.
A expectativa pela Maratona de Berlim era grande, pois corri a prova após a reunificação da Alemanha, em 1991, quando o trajeto foi alterado para que fosse possível passar, também, pelas ruas da antiga Alemanha Oriental e atravessar o icônico Portão de Brandemburgo que ficou isolado e inacessível, ao lado do Muro de Berlin, por quase 30 anos.
É sabido que o percurso é rápido e já foi palco de 12 recordes, mas também é um lindo city tour pela cidade. A largada ao lado do Portão de Brandemburgo, contorna a Coluna da Vitória, no meio do Tier Garten, passa por cartões postais como Reichstag (Parlamento), Berlin Dom (Catedral), a Potsdam Platz e as ruínas da Igreja Kaiser-Wihelm-Geachnis-Kirche, por três importantes bairros de Berlim (Mitte, Kreuzberg e Schöneberg), pelo rio Spree, corta o bairro governamental, a sede do poder político alemão, para a linda chegada atravessando as imponentes colunas do Portão de Brandemburgo.
O número de concluintes deste ano, 23.097, foi muito inferior ao total de 2019, com 44.064 corredores, demonstrando que a pandemia ainda traz sequelas, aliada a inflação, crise energética e seca na Europa.
Minha última participação em Berlim foi há 12 anos e agora, nesta 4ª vez, observei poucas alterações: a entrega do kit e expo continuam no antigo aeroporto Tempelhof, da época de Hitler. Suas pistas de decolagem hoje são usadas para passeios ciclísticos e foi palco das provas infantis e da tradicional corrida de 5 km na véspera da maratona (que infelizmente não teve a chegada no lindo Estádio Olímpico pela realização do Festival de Música Lolapaloosa).
Gostei da feira da maratona, que além da gigantesca loja da Adidas, com muitas opções de artigos com o logo da prova, como nas demais Majors Marathons, também tinha outras opções legais, para alegria dos consumistas, como eu!
Ao acessar a feira, os maratonistas recebiam uma pulseira de pano, com o logo de prova, que deveria ser usada para acessar a área de largada, impedindo que os números fossem repassados para outros corredores, o que ocorria com frequência, infelizmente.
Tive a oportunidade de assistir a coletiva de imprensa e ver o jogador de futebol Kaká ser entrevistado e demonstrar seu respeito e até medo pela sua 1ª participação numa maratona. Já Eliud Kipchoge, o ícone, foi direto e disse que se preparou muito para a prova e estava confiante para fazer o seu melhor. E fez! Que emoção estar na mesma prova que Ele!
Na terça-feira, segui para a Maratona de Londres, na minha 3ª participação na prova. Não gostei na feira e dos artigos oferecidos. O novo patrocinador, TCS, tinha o logo maior que o da prova nos casacos. Aliás, o novo logo também não agradou, pois mostra o nome da prova bem pequeno. Corredor gosta de se exibir com logos ENORMES como o da Maratona de Boston, né? Além da grande loja da New Balance, poucos estandes ofereciam artigos interessantes. Mas a Maratona de Londres tem muito mais a oferecer que a sua expo!
A previsão era de chuva no dia da prova, mas, surpreendentemente, tivemos um belíssimo dia de sol e as ruas do percurso estavam LOTADAS de espectadores extremamente animados. O percurso passa por lindos pontos turísticos, como o Cutty Sark, o histórico navio-museu em Greenwich, que fazia o transporte de chá entre a China e a Grã-Bretanha, no km 10.
No km 20, temos a espetacular travessia pela multidão de espectadores na Tower Bridge, a ponte-báscula que abre para permitir a passagem de embarcações, construída sobre o rio Tâmisa. O percurso tem algumas subidas, descidas, túneis e muitas curvas. A passagem pelo Canary Wharf, um complexo de edifícios comerciais no centro de Londres, foi amenizada pela simpática audiência que chegava a estreitar as ruas com sua empolgação.
Os quilômetros finais são às margens do Rio Tâmisa e, ao cruzar o Big Ben e atravessar o St James’s Park, o barulho da multidão anuncia que você está chegando ao Palácio de Buckingham, para percorrer a avenida The Mall, com suas inúmeras bandeiras da Inglaterra, até a chegada.
Assim que cruzei a linha, recebi uma das mais lindas medalhas de maratona, das 162 que já ganhei, com a fita nas cores rosa e preto e o metal da medalha preto. Belíssima! E logo segui para aquele que era o desafio do meu coração: ganhar a 3ª mandala por ter completado 3 vezes as 6 principais maratonas (NY, Boston, Chicago, Berlim, Londres e Tóquio).
Ao chegar na tenda da Abbott, patrocinadora das World Marathon Majors, recebi a minha mandala e logo fui recepcionada pelos organizadores, que trouxeram mais 2 mandalas (emprestadas para que eu pudesse tirar a foto com 3 ) e diziam animadamente: “YOU ARE THE FIRST WOMAN IN THE WORLD!”, ou seja, Você é a primeira mulher no mundo (a ganhar 3 mandalas)!
Ainda cansada pela sequência das duas maratonas, sem entender muito bem o que estava acontecendo, eles me levavam de um lado para o outro, cercada por fotógrafos, e continuavam animadamente a repetir: PRIMEIRA MULHER DO MUNDO!
Após a surpresa, claro que fiquei orgulhosa e curti bastante aqueles 30 segundos de fama! Foi engraçado, pois não tinha percebido, até então, a dimensão daquela conquista! Em um pub, junto com brasileiros que viajaram com o grupo da Kamel Turismo, a festa continuou com muitas fotos e parabéns dos demais corredores. Um dia muito especial.
Em seguida fui para Portugal encontrar meu marido, Luiz Antonio, que, não tendo inscrições para estas maratonas, não viajou comigo. Ele se inscreveu na Meia e eu na Maratona de Lisboa.
Claro que participar de uma prova de menor dimensão, com aproximadamente 4 mil corredores, após correr duas Majors, não há o que comparar. A feira da maratona, modesta, mas com estandes interessantes, apresentava uma atração extra: o lindo pavilhão Carlos Lopes (maior maratonista português), com painéis de azulejos que contavam passagens históricas de Portugal e uma magnífica exposição de medalhas e troféus deste campeão olímpico lusitano. Vencedor da São Silvestre, em 1982 e 1984, Carlos Lopes também venceu a maratona nas Olimpíadas de 1984, em Los Angeles, com 2:09:21, sendo o recorde olímpico até aos Jogos de Pequim em 2008.
A Maratona de Lisboa teve início na cidade de Cascais e o trajeto de trem, ou melhor, de comboio, repleto de corredores, já trouxe um charme especial.
O percurso, com diversas ladeiras, seguiu margeando as praias e, ao chegar em Lisboa, passou ao lado dos principais pontos turísticos da cidade, à margem do Rio Tejo, como a Torre de Belém, Mosteiro dos Jerônimos, Monumentos dos Descobrimentos, e nos brindou com uma chegada espetacular contornando e atravessando o imponente Arco Triunfal, para terminar na belíssima Praça do Comércio, um marco histórico de Lisboa.
O percurso de 21 km teve início na Ponte Vasco da Gama (que ficar em ponto diametralmente oposto a Cascais), com chegada no mesmo local da maratona. Já corrida de 8,5 km largou com a meia e teve a chegada no Parque das Nações, local do belo Oceanário construído para Expo 98.
Após 3 domingos sensacionais, retornei ao Rio de Janeiro com lindas medalhas, belas recordações e 162 maratonas concluídas. Que venham as próximas!
Fotos: Fernanda Paradizo