História admin 4 de outubro de 2011 (3) (483)

Auxiliadora Venâncio, nossa dama de ferro

Auxiliadora Venâncio é sem dúvida uma dama de ferro, como demonstrou na dura Comrades da Africa do Sul, onde ela conquistou em 2001 um feito imbatível até os dias de hoje, sendo a detentora da melhor marca brasileira naqueles 89 km de sobe e desce.

Ao chegar em sua casa em Taboão da Serra (Grande SP), para entrevistá-la, fiquei espantado com uma parede de quase 5 metros de altura toda decorada por medalhas e troféus. Ao cumprimentá-la, brinquei: "Olá, dama de ferro!" Ela sorriu e comentou: "Sempre tive apelidos, uns me chamavam de Dorinha, Venancinho, Formiguinha, mas a maioria me conhece como Dora". 

Maria Auxiliadora Francisca Venâncio nasceu em São Domingos do Prata/MG há 53 anos e há 35 mora em Taboão. Seu filho Daniel Venancio, 28 anos, também trilhou o caminho do esporte; é professor de Educação Física. Alto e forte, é bem diferente da mãe, que mede apenas 1,49 m e pesa 48 kg.

 E ela já foi bem mais magra. Auxiliadora recordou que quando era corredora profissional pesava entre 38 a 39 quilos, mas chegou a até 33, em 1999. "Participei de uma prova de 100 km, no Japão, e fiquei muito desidratada, terminando a competição com 34 quilos. Ao chegar ao Brasil continuei perdendo peso e fui aos 33, sem conseguir recuperar. Aí tive a ajuda do fisiologista Renato Lotufo, que me ‘consertou' e recuperou o meu físico".

 

EM 20 MINUTOS, UM NOVO CAMINHO. A corrida foi mudança e início de uma nova vida. A Auxiliadora corredora surgiu após o nascimento de seu filho. "Eu me sentia um pouco gordinha, já que estava com 60 quilos. Uma colega de trabalho, Sandra Iara de Godoi, tinha uma academia de balé, na cidade de SP, e à tarde, após o serviço, eu ia até lá, mas não levava jeito para fazer aqueles exercícios. Então ela me fazia companhia e íamos até o parque do Ibirapuera, onde caminhávamos e fazíamos uns trotinhos. Logo fiquei animada, quando percebi que conseguia correr por uns 20 minutos. Ali mesmo decidi que queria participar de uma corrida e me inscrevi logo de cara na Meia-Maratona da Independência, em 1984. Foi o começo de uma nova vida".

Logo vieram muitas corridas, das mais diversas distâncias, entre elas, naturalmente, a São Silvestre, mas Auxiliadora nunca conseguiu se sair bem nela e só uma vez foi a primeira na faixa etária, sendo 58 minutos seu melhor tempo nos 15 km. Passados alguns anos, Dora percebeu que levava jeito mesmo era para corridas de longa duração e fez várias maratonas com alguns pódios e inclusive vitórias, como em Brasília (onde ganhou um carro!), Curitiba e Ribeirão Pires.

Mas aí começou a não conseguir se classificar entre as primeiras em maratonas e seu técnico, João Roberto de Sousa, lhe propôs que mudasse de objetivo, entrando no mundo das ultra- maratonas. "Enquanto ele falava, eu folheava uma revista espanhola com os tempos das melhores colocadas do mundo nos 100 km e vi que não eram tão difíceis de serem alcançados. E resolvi começar seriamente os treinos para longa distância, em 1996."

Após vários pódios e recordes nos 100 km (veja quadro), seus colegas a incentivaram a correr provas de 24 horas. "Eu não queria, mas talvez por curiosidade acabei fazendo a minha primeira, em 2005, em São Caetano do Sul, quando completei 213 km, enfrentando sol forte durante o dia e muita chuva na madrugada". Ela explica sua paixão pelas ultras: "Acho que escolhi as longas distâncias porque sou muito persistente."

 

A PRIMEIRA COMRADES. Auxiliadora conta que a oportunidade de fazer a Comrades surgiu logo após sua participação no Mundial de 100 km em Nakamura/Japão, quando foi convidada por um dos patrocinadores da ultra sul-africana, sob a condição de não correr maratonas seis meses antes da prova. "Ao assinar o contrato, recebi as passagens, a garantia de hospedagem e se subisse ao pódio eles dobrariam a premiação que eu recebesse do evento. Meu maior problema era viajar sozinha, mas encontrei no hall do hotel corredores brasileiros, o técnico Branca, Márcio Milan e Alfredo Donadio, o que me deixou tranquila. Agora só tinha a preocupação de competir bem e estava confiante, pois havia treinado muito."

Ela comenta sobre sua primeira participação na Comrades. "Me impressionou o percurso, com milhares de pessoas aplaudindo o tempo todo. Passei por um povoado onde faziam cruzes de madeira para entregar aos participantes, isso no km 75. Me lembro que já não tinha força nem para erguer o braço e pendurar a cruz no pescoço, mas o povo repetia o gesto que eu devia pendurar de qualquer jeito, e quando fiz isso, todos gritaram e comemoraram".

Na segunda vez na África, um fato curioso aconteceu, lembra Auxiliadora. "Perto do final comecei a ver que o público falava alguma coisa para mim, mas eu não entendia. Então, o staff que me acompanhava de carro (desde a largada), me explicou que as pessoas estavam me pedindo garra, para que eu me esforçasse em conseguir subir ao pódio, uma vez que as cinco que estavam na minha frente eram todas brancas e dessa forma não haveria nenhuma negra entre as primeiras. Aí, não sei de onde busquei forças para aumentar o ritmo, fui em busca do 5º lugar, e consegui!"

 

CORRIDAS E DINHEIRO. "Eu comecei um pouco tarde minha carreira de atleta e só consegui ganhar um bom prêmio (um carro) quando venci minha primeira corrida importante, a Maratona de Brasília de 1995, aos 37 anos. Então a corrida não rendeu dinheiro para Auxiliadora? "Não tanto como para alguns maratonistas. Ganhei pouco, mas soube aproveitar bem; eu construí minhas duas casas com o que ganhei, principalmente em maratonas e na Comrades. Mas passei por alguns momentos difíceis, como quando tive que bancar o tratamento de saúde de minha mãe, o que me obrigou a vender as duas medalhas de ouro da Comrades."

Ela não tem muita certeza, mas acha que correu mais de 130 maratonas e ultras, sendo vitoriosa em duas dezenas maratonas. Seu melhor resultado aconteceu na de Porto Alegre 1996, quando completou em 2h46. Já nos 10 km, seu recorde foi na prova da Tribuna, em Santos, com 38:25, em 1987.

 

ESPORTE COMO TRABALHO SOCIAL. Atualmente Auxiliadora é técnica de atletismo da Secretaria Municipal de Esporte de Taboão da Serra. "Hoje só corro maratonas que não conheço. Isso para avaliar o grau de dificuldade e organização. É dessa forma que posso indicar as melhores para meus colegas e alunos maratonistas participarem".

A corrida continua fazendo parte sim dos projetos da nossa "formiguinha", que trabalha com atletas competitivos e de terceira idade, que cuida da inscrição em campeonatos e realiza treinos, caminhadas, alongamentos. "Represento a Secretaria no Conselho Negro municipal e também no das pessoas portadora de necessidades especiais, além de fazer parte das 180 promotoras legais populares, voluntárias que ficam à disposição das mulheres em situação de risco e violência doméstica."

 

ALGUNS DOS PÓDIOS DE AUXILIADORA

– Maratona de Ribeirão Pires 1990 1º lugar / 1992 1º lugar

– Maratona do Rio de Janeiro 1991 4º lugar / 1992 3º lugar / 1994 4º lugar

– Maratona de Brasília 1993 3º lugar / 1995 1º lugar / 1996 2º lugar

– Maratona de São Paulo 1995 4º lugar

– Maratona de Buenos Aires 3º lugar

– Maratona de Curitiba 1996 1º lugar

– Maratona de Blumenau 1996 2º lugar

– 100 Km Santander – Espanha 1996 3º lugar / 1999 1º lugar / 2000 1º lugar

– 100 Km Madri 1997 1º lugar (recorde sul-americano) / 1999 1º lugar

– 100 Km Brasil 1997 1º lugar (recorde sul-americano)

– 100 Km Brasil 1998 1º lugar (recorde sul-americano e mundial de veteranos / 4ª marca do mundo)

– 100 Km Nakanura – Japão 1998 3º lugar

– Comrades (89 km) África do Sul 1999 4º lugar (6h40) / 2001 5º lugar (6h39)

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3 Comments on “Auxiliadora Venâncio, nossa dama de ferro

  1. além de ser sua sobrinha sou sua fã numero 1 sua força e superação é um exeplo para mim te amo,obrigada por tudo que a senhora fez por mim.

  2. Auxiliadora,acabo de ver suas proezas…isso é lindo tem mesmo que ser divulgado em letras garrafais..como tú o é…uma grande mulher..exemplo pra toda essa galera desanimada…
    parabens..

  3. Maria Auxiliadora Venancio,como está você,tem boa saúde?ainda realiza corrida a nivel de manter a saúde?quando leio o nome dessa galera do passado,sinto saudades correm lagrimas no meu rosto voces foram minha inspiração,fui minha época também,doces recordações que eternizadas,sejamos felizes sempre mesmo que o tempo nos limite,esse adversário ninguém pode derrotar.Thiau

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