Notícias admin 23 de junho de 2015 (0) (214)

Agora, o tipo de pisada pouco importa

Um tênis com muita tecnologia empregada, grande nível de amortecimento e controle de pisada irá garantir uma longa vida na corrida, sem lesões, certo? Bem, essa é a ideia "vendida" pelo mercado e propagada durante muitos anos, mas que, na prática, o avanço das pesquisas científicas mostra uma relação muito menor. "Os tênis são menos importantes do que a maioria pensa", explica a fisioterapeuta Raquel Castanharo, mestre em Biomecânica da Corrida e Caminhada na Universidade de São Paulo (USP).
De acordo com Raquel, grande parte dos corredores acha que, para não se machucar, precisa usar um tênis com muito amortecimento para estar "protegido". Porém, na realidade, o resultado final está bem distante disso. A começar que os calçados são apenas um complemento, um acessório, como as meias de compressão, as roupas, o GPS, os cronômetros… "Tudo é secundário. Pode até adiantar, mas na verdade o que determina é a forma (a mecânica) como se corre."
Um fator também importante na análise do tênis diz respeito ao drop (a diferença de altura entre a parte da frente e a do calcanhar). Assim, Raquel explica que modelos com drop zero ou menor do que 6 mm acabam sendo a melhor opção para permitir que o pé suporte o peso do corpo normalmente durante a corrida (essa informação está sempre disponível pelas marcas).
Outro ponto citado pela profissional nessa análise envolve os modelos com controle de pisada. "Todos os pés pronam. Pronação e supinação são movimentos naturais do corpo, combinado com os do tornozelo e do pé. Fazemos isso o dia todo. Quando a gente aterrissa (na pisada), o pé bate um pouco de lado; isso é a supinação, ou seja, quando o pé inclina um pouco para fora. Quando o corpo vem em cima do pé, jogando todo o peso, inclina um pouco para dentro, na chamada pronação. Mesmo em uma pisada supinada, o pé prona. Assim, os corredores devem esquecer essa questão de tênis para pisada supinada ou pronada. A literatura específica mostra que o ideal é um tênis neutro", afirma Raquel.
Inclusive, a recomendação dela aos leitores da Contra-Relógio é bem simples: "Cuide do seu pé, da mecânica, do volume de treinamento…" Raquel cita quatro partes essenciais nesse panorama: a aterrissagem da passada perto do corpo, iniciando com o médio pé, com passadas mais curtas, em um aumento da cadência; corpo ereto, com o tronco erguido, "vencendo" a gravidade (em outras palavras, a postura ao correr); a redução do impacto, com a aterrissagem com o médio pé; e a impulsão na panturrilha e no glúteo.
"Na aterrissagem com o meio do pé (médio pé), o calcanhar também toca o chão, apenas ele não é o primeiro a fazer isso. É preciso sentir o pé inteiro em contato com o solo", orienta a profissional. "Com um passo mais curto, a aterrissagem fica próxima ao tronco. Isso facilita a pisada com o médio pé e atenua o impacto sobre o corpo. Quanto mais longe a perna estiver do tronco no momento da aterrissagem, maior será a sobrecarga sobre o joelho. Dessa forma, um passo mais curto poupa o joelho, um dos alvos preferidos de lesão na corrida."
Resumindo, de acordo com Raquel, uma boa mecânica de corrida é o que realmente auxilia no desempenho e prevenção de possíveis lesões. "Você pode ter isso correndo com qualquer tênis, ou até sem eles, não importa. O investimento então deve ser no seu corpo e padrão de corrida", diz a fisioterapeuta. No restante, claro, há a individualidade de cada pessoa, que também é levada para o dia-a-dia da corrida. "Devemos trabalhar de forma simples. Com uma ou duas semanas de exercícios para melhorar a mecânica de corrida, isso se torna natural, automático, como é a corrida", explica Raquel.

SÓ NAS LESÕES – Outro ponto citado pela entrevistada é que esse trabalho da fisioterapia é visto pela maioria somente como uma resposta às lesões. Ou seja, os profissionais são procurados apenas quando o corredor está machucado e não para um trabalho preventivo, como deveria ser, mas que ainda não entrou no cotidiano das pessoas.
Tanto que, no consultório (ela atende em Jundiaí e São Paulo, na Movere Fisioterapia Funcional, www.moverefisioterapia.com), apenas de 10 a 20% dos pacientes dela são desse grupo. A ampla maioria, literalmente, corre atrás de um tratamento quando o problema (a lesão) já apareceu e não em como evitá-lo. Esse trabalho preventivo, na explicação da profissional, deveria ser visto como uma parte do treinamento, biomecanicamente falando, mas no Brasil ainda é muito recente.
Quem tiver dúvidas ou quiser mais informações pode acessar o site www.raquelcastanharo.com.br.

 

Três formas de aterrissagem
Mais do que o tipo do tênis, a forma com quem o corredor aterrissa na corrida está diretamente ligada ao amortecimento do impacto e pode ser um dos principais causadores de lesões, de acordo com Raquel Castanharo.
São três formas de aterrissagem:
Com o calcanhar: A mais comum (muitas vezes, influenciada também pelo drop e pela quantidade de amortecimento de um tênis). Ocorre quando a primeira parte do pé que toca o chão é o calcanhar. É o que gera o maior impacto.
Com o meio do pé (médio pé): Calcanhar e a parte da frente do pé tocam o chão quase simultaneamente. O impacto é menor do que na aterrissagem como calcanhar, pois os músculos do corpo, principalmente da panturrilha, o amortecem. Passadas curtas costumam gerar esse tipo de aterrisagem.
Com a ponta do pé (antepé): Uma minoria usa essa técnica em provas longas, sendo mais comum em distâncias curtas (ou quando fazemos treinos de tiros). O impacto também é menor, mas por outro lado há grande sobrecarga da panturrilha.

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