O impacto da grande presença de corredores sem inscrição (ou com numeração falsa), os chamados “pipocas”, na Corrida Internacional de São Silvestre, gerou inúmeras discussões no meio esportivo, principalmente nas redes sociais. O que foi acirrado após medidas anunciadas primeiramente pela Yescom para coibir essa prática e depois pela Spiridon, responsável por provas no Rio de Janeiro, como a maratona carioca.
Um dos principais “argumentos” de quem defende a prática dos “pipocas” é de que a rua é pública e que, então, podem entrar, participar e sair das provas na hora em que bem entenderem ou quiserem, sem serem “importunados” pelos organizadores. “É meu local de treino e estarei sempre lá”, “a rua é pública, pago imposto e corro a hora que quiser” e por aí vai. Basta verificar comentários em textos na internet ou nas redes sociais sobre o tema para ler essas “justificativas”.
Outros corredores argumentam contra os “pipocas”, por exemplo, citando então que quando houver um jogo de futebol ou um show musical no Estádio do Pacaembu, em São Paulo (que é um bem público), que então vá lá e entre sem ingresso, com essa justificativa, para ver o que ocorre. Ou no Autódromo de Interlagos durante a Fórmula 1. Basta isso para que os xingamentos comecem e, em muitos casos, o nível baixe muito.
Agora, sempre há a dúvida: se a rua é realmente “pública” o tempo todo, por que os veículos não podem entrar durante uma corrida? O argumento dos “pipocas” não pode ser usado também pelos “motoristas”? “Eu dirijo aqui todo dia e vou passar com eu carro (moto, caminhão…), cadê o meu direito de ir e vir”… Se isso for levado ao pé da letra, já imaginou estar acelerado na corrida em uma prova e ter de parar no semáforo ou esperar o ônibus sair do ponto e cruzar na sua frente?
Brincadeiras à parte, como Direito não é minha área, fui pesquisar, mas nada melhor do que um advogado, Ricardo Nishizaki, o Nishi, corredor, colaborador do canal do Youtube “Corrida no Ar”, para explicar se realmente a “rua é pública”.
“É simples, a via pública é um bem público. Pode ser usada por qualquer pessoa em situações normais. Mas existem inúmeras situações em que o Estado define uma limitação ou uso específico. Os exemplos são corriqueiros. Uma rua pode ser fechada para que uma concessionária faça serviços (tubulação, rede elétrica etc). Uma rua pode ter limitações de uso (tráfego de carros) para uma feira livre, por exemplo”, afirma Nishi. Que prossegue. “Qualquer um pode usar a rua para instalar a barraca? Não, só feirante que tem a autorização (ou permissão) de uso pode montar barracas e se beneficiar do comércio em dias certos nas feiras livres. Uma banca de jornal é um objeto privado instalado uma calçada. Pode? Ele usa com exclusividade aquele pedaço de logradouro! Pode, porque o Estado emite uma permissão de uso.”
Dessa forma, de acordo com Nishi, o Estado também pode autorizar o uso de vias públicas para eventos especiais, como a Parada Gay, corridas de rua, ciclismo, Carnaval etc. “Neste caso, os organizadores podem limitar ou não, de acordo com a natureza do evento, o acesso ao evento realizado em vias públicas. Em São Paulo, quando o desfile de Carnaval do Grupo Especial era organizado na Avenida Tiradentes, os organizadores (a Liga de Escolas de Samba) não deixavam, compreensivelmente, pessoas transitarem livremente pela via pública porque havia um desfile em andamento. Em corridas de rua ou de ciclismo o organizador pode impedir que pessoas não inscritas participem e atrapalhem a competição”, afirma Nishi.
Dessa forma, continua o advogado, “uma via pública pode sim ter limitações de uso, inclusive para eventos particulares”. “Basta que esteja normatizado e autorizado pelo Poder Público. E o organizador tem todo o direito de não permitir a participação de uma pessoa não inscrita. Afinal, naquele momento, naquele evento, a rua tem o seu uso cedido para isso, conforme a lei prevê”, completa Nishi.
Assim, durante aquele evento em si, no caso de uma corrida de rua, não importando a distância, os organizadores (quaisquer que sejam) pagam taxas à Prefeitura (que são definidas por leis municipais) e “alugam” aquele espaço, ou seja, as ruas e avenidas, para a prova, podem sim vetar a entrada/participação de quem não está inscrito, mesmo que a justificativa do “pipoca” seja de que não vai consumir nada, nem pegar medalhas. Os “pipocas” podem se defender com inúmeros outros argumentos (como o valor cobrado pela inscrição com pouco ou nenhum retorno, às vezes, nem com aferição do percurso, o que é tudo verdade em alguns casos), porém, ao citar que a “via é pública e faço o que bem quiser”, não há qualquer respaldo jurídico nem é uma verdade.
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Pipoca tinha que ter vergonha na cara e nem aparecer no evento
Muito esclarecedor esse texto. Todos os pipocas deveriam lê-lo e aprender…
Concordo plenamente. Em 2016 comecei a participar das corridas de rua, não tinha nenhum conhecimento sobre com era a participação nessas corridas. Um amigo meu falou que podia correr sem inscrição (os famosos pipocas), aí fui lá e participei de 7 provas com inscrição e algumas na pipoca. Mas comecei a pesquisar sobre esse corredores pipocas, para ver se isso era legal. Li vários artigos e realmente acho essa prática ilegal. Muitos alegam que os preços das corridas estão abusivos e então acham que tem esse direito de correr sem pagar. Não é bem assim, os organizados tem todo o direito de coibir essa prática, pois estão autorizados pelo Poder Público para interditar essas vias pública aonde vão ser realizadas as provas. Portanto hoje eu estou consciente, eu não tenho esse direito e não vejo graça nenhuma em participar de uma corrida sem inscrição. Só participo com inscrição. Deus abençôe a todos!
O argumento “a via é pública” é de fato muito falho. Há respaldo legal para o isolamento de áreas públicas e proibição de passagem civil.
Todavia essa reserva não pode ocorrer a torto e direito, para benefício de grupos pequenos.
Exemplo exagerado: O filho de um empresário bilionário reserva um quilômetro da avenida paulista para fazer uma festinha particular a céu aberto. Só entrará quem ele quiser.
Isso seria um absurdo.
Esse exemplo foi bem exagerado, claro. Mas é pra mostrar que não é correto dizer que o Estado pode isolar vias públicas como bem entender, para o benefício de ínfima minoria.
Concordo com a visão do Vitor, somente isso irá me convencer não porque um advogado falou, mas sim a lei que descreve o direito público pode ser reservada para alguma instituição privada. A atividade desenvolvida na via de circulação retira o direito de ir e vir do cidadão. Art. 5º, inc. XV da Constituição Federal de 1988, e pelo que sei essa é a lei maior do nosso país e não pode se infligida.
Eu corro prova de rua a muitos anos ,a SS a 22 anos sem interrupção, nao sou contra pipoca nessa provq e diferente das outras prova a SS virou praticamente uma festa popular! O que falta e organização na hora da hidratação e entrega das medalhas só para quem pagou ! O q faz a SS ser o que é hoje é o povo!