Quando corremos utilizamos como energia uma mistura do carboidrato (presente nos músculos e no fígado na forma de glicogênio) e da gordura estocada em nossas células adiposas. A utilização desta mistura varia com a intensidade e o tempo do exercício. Em geral, quanto mais curto e intenso for o exercício, mais dependentes ficamos dos carboidratos e quanto mais longo for o exercício mais utilizamos as gorduras.
No entanto, independentemente do tempo da atividade, a falta de carboidratos limita o desempenho. Corridas curtas e em ritmo forte consomem o estoque de glicogênio rapidamente (entre 15 e 30 minutos de exercícios intervalados intensos) inibindo a realização da atividade. É por isto que não conseguimos manter intensidades máximas por muito tempo. Entretanto, quando corremos em ritmo moderado utilizamos mais gordura, conservando o glicogênio por mais tempo, o que permite uma maior duração da atividade. Os estoques de glicogênio duram entre 2 e 3 horas (quanto melhor for o condicionamento, mais duram); assim, durante treinos ou provas longas o mesmo precisa ser reposto com alimentos, bebidas ou géis para que a atividade seja mais confortavelmente realizada.
Além desta reposição de carboidratos durante a atividade, o aumento dos estoques de glicogênio é uma estratégia que também pode ser utilizada a fim de melhorar o desempenho. Por isto, para atletas em geral, faz sentido ingerir maiores quantidades de carboidratos, já que os períodos usuais de treinamento, durante horas ou dias, diminuem ou até acabam com os estoques, comprometendo treinos e provas. A prática que visa o aumento dos estoques de glicogênio no fígado e nos músculos é denominada sobrecarga de carboidratos ou dieta de supercompensação de carboidratos.
A mesma consiste em aliar por alguns dias exercícios exaustivos com dieta pobre em carboidrato, seguida de dias de repouso com dieta rica em carboidratos. Como ambas as fases podem se mostrar sofríveis para muitos atletas, foram desenvolvidos programas que não utilizam a fase de depleção dos estoques dos carboidratos, mas que também conseguem ganhos de glicogênio de 40% ou até mais quando comparados aos níveis normais do atleta. É importante destacar que a sobrecarga de carboidratos não é utilizada rotineiramente por corredores de elite, porque as estratégias citadas a seguir só fazem sentido em indivíduos que precisam competir por períodos superiores a 90 minutos.
A supercompensação original. A idéia da supercompensação é que quando os estoques de glicogênio são depletados ou esgotados, fígado e músculo conseguem estocar mais do que o normal, quando o consumo de carboidratos retorna aos patamares normais. O procedimento original consiste em depletar o corpo por 3 dias (com um consumo de 10% ou menos de carboidratos) e exercício intenso. Por outros 3 dias uma dieta com até 90% de carboidratos é administrada e a intensidade do exercício é reduzida ao mínimo.
Uma outra linha de pesquisa recomenda um treino curto, porém intenso, um dia antes do evento, aliado a um alto consumo de carboidrato nas 12 horas subseqüentes. Este esquema poderia resultar em aumento de até 90% dos estoques de glicogênio. O problema é que quanto mais glicogênio armazenado de uma vez, mais líquidos também são estocados, aumentando o peso corporal, o que induziria às sensações de peso e rigidez muscular.
A supercompensação modificada. Estudos recentes vêm demonstrando que consumos moderados de carboidrato (dieta mista com 50 a 65% de carboidratos, 10 a 20% de proteínas e 20 a 25% de lipídios), seguida por 3 ou 4 dias com consumo de dieta hiperglicídica (70% de carboidratos), funcionam tão bem quanto o esquema clássico.
Considerações importantes. A principal orientação antes de uma prova longa, como maratona, não é quanto à dieta, e sim quanto ao treino. Se você não der tempo para seu corpo descansar (pelo menos 1 ou 2 dias), o mesmo não conseguirá repor os estoques de glicogênio, mesmo consumindo um percentual alto de carboidratos. Por isto, resista à tentação de fazer mais um treino longo!
Após semanas de treino, você não vai querer estragar tudo com alimentação inadequada. Por isto, cuidado: seguir uma dieta de supercompensação não é sinônimo de se encher de macarrão! Você precisa de mais carboidratos, mas não de mais calorias do que consome normalmente. Mudanças drásticas de última hora podem causar diarréia (muita fruta, suco ou outras bebidas adoçadas), gases (muita verdura ou cereais integrais) ou constipação intestinal (muito pão ou macarrão feitos com farinha branca).
Cuidado também com molhos para macarrão, queijos, manteiga, patês e pães recheados ou com coberturas, que podem ser muito gordurosos. A gordura fornece calorias, aumenta a quantidade de células adiposas, mas não repõe os estoques de glicogênio no fígado e músculos.
Não se assuste com o ganho de peso. Repleções adequadas de glicogênio podem aumentar o peso entre 1,5 e 3 kg de água. Isto porque para cada quilo de carboidrato armazenado estocamos 3 kg de líquidos.
Exemplos de cardápios. O primeiro passo é estimar o seu gasto energético. Os exemplos das tabelas são baseados em uma dieta de aproximadamente 3.000 Kcal. Para personalização você pode consultar um nutricionista ou acessar um dos sites: www.saudeemmovimento.com.br/saude/calorias/gasto_kcal_i.htm ou www.cdof.com.br/nutri1.htm.
Para outros alimentos, seus valores calóricos e de carboidratos consulte uma tabela de composição de alimentos, como a desenvolvida pela Unicamp (www.unicamp.br/nepa/taco/contar/taco_versao2.pdf).