Notícias admin 4 de outubro de 2010 (0) (186)

Uma meia-maratona à milanesa

É plana, rápida, bem organizada e dá ainda para unir duas coisas que todo mundo adora: corrida e turismo. A edição de 2008, que aconteceu no dia 6 de abril, foi um evento feliz para brasileiros, já que proporcionou a primeira vitória em terras internacionais da paulista de sertãozinho Maria Zeferina Baldaia e a segunda conquista do país na competição. Em 1988, o gaúcho Diamantino dos Santos já havia sido campeão da Stramilano. Pela primeira vez, tivemos também a participação de um grupo de brasileiros. Foram oito no total. E a CR traz aqui o depoimento de um deles. A corredora e executiva de marketing Claudia Pagnano, de 40 anos, foi conferir de perto a 37ª edição dessa tradicionalíssima prova italiana pouco conhecida por aqui, mas que pode ser uma opção e tanto para quem quer correr uma meia na Europa no segundo semestre.

"Nunca pensei que um dia conseguiria correr. Em maio de 2006, assumi o marketing do Grupo Pão de Açúcar e lá encontrei a oportunidade para começar. Foi quando conheci minha atual técnica, a Simone Machado. Estabeleci a Maratona de Revezamento como primeiro objetivo. Treinei sem regularidade. Terminei meu trecho, de 5 km, emocionada e descobri ali o prazer por esse esporte. ‘O que dá para correr agora?', perguntei à minha técnica. ‘Quer encarar a Meia de Lisboa?', disse ela. Conversei com o Fernando, meu marido, e com a Adriana, uma amiga, e os dois, que já corriam, toparam. Treinei basicamente em esteira, com a meta de apenas chegar. Em março de 2007, terminei minha primeira meia em 2h37 e ali tive a certeza de que a corrida viraria um hábito na minha vida.

Não demorei muito para estabelecer um objetivo para 2008. Escolhi a Stramilano Agonistica Internazionale, uma meia-maratona que acontece simultaneamente com duas provas mais curtas (a Stramilanina, de 6 km, e a Stramilano dei 50.000, de 12 km). Os companheiros de viagem e de corrida aceitaram a indicação. Um amigo português me ajudou com as inscrições, que podem ser feitas também pela internet (http://www.stramilano.it/), a 20 euros. É muito fácil e sem burocracia.

Por causa das minhas atribuições profissionais, não me sobrava tempo para treinar. Por ironia do destino, consegui o tempo necessário para os treinos quando deixei a empresa, no final de fevereiro. Faltavam 45 dias para a prova. Estava num momento de mudanças e a preparação para Milão era o que eu precisava para colocar minha cabeça focada. Em março, passei a me dedicar aos treinos de pista e fiz meu melhor 10 km: 1h02. Embarquei para a Itália para correr a meia em 2h17.

Viajamos na quinta num vôo diurno da Alitalia. Foram 11 horas para chegar ao destino. Desembarcamos em Milão às 6h da manhã de sexta, com uma diferença de 5 horas a mais e uma temperatura de 12 graus. Cheguei exausta. Tomei banho e dormi. Acordei às 10h e fui retirar o kit no Centro Stramilano, uma feira de esportes montada na Piazza Duomo, onde há uma monumental catedral, que representa o auge da arquitetura gótica italiana e levou 511 anos para ser construída. A feira era pequena, mas muito bem organizada. No kit, nenhuma novidade a não ser o chip, que vinha num compartimento colado atrás do número de peito. Aproveitamos o restante do dia para passear e ir às compras.

No sábado, uma corridinha de 30 minutos perto do hotel num horário próximo ao da largada, que aconteceria às 10h45, para sentir a temperatura. Senti-me cansada após a corrida. Mesmo assim, aproveitamos o sábado para curtir a cidade. Conhecemos o Duomo, a galeria Emanuele Vittorio, as lojas da Via Montenapoleone e ainda o lindo Castello Sforzesco, onde é a largada da prova. Construído no século 14, já serviu de fortaleza, palácio e hoje abriga obras de arte como a Pietà Rondanini, escultura inacabada de Michelangelo.

No jantar da noite anterior, queríamos tomar vinho, mas nos abstivemos, com exceção do Sergio, marido da Adriana, que não correria a prova e que tomou um delicioso Barollo. Voltamos para o hotel muito tarde, perto da meia-noite. Mesmo assim, dormi como uma pedra. Acordamos às 8h30, tomamos café, nos trocamos, pegamos o metrô bem do lado do hotel e fomos para a largada. Tudo muito tranqüilo. Descemos na parada Piazza Castello às 9h45, já na ‘boca' da concentração. Ficamos aguardando no jardim do castelo a chamada para nossa baia de acesso. Eram cinco no total, divididas por nível técnico. Eu e a Adriana estávamos na última e o Fernando, uma à frente. O comentário era de que estava mais frio do que o esperado. Para nós, estava perfeito. Cerca de 16 graus.

Às 10h45, um tiro de canhão deu a largada da meia, que reuniu cerca de 5 mil inscritos. As outras duas provas largaram mais cedo, em horários e pontos diferentes, mas todas chegavam ao mesmo lugar. A rua era larga e não demorei para começar a correr tranquilamente. Perdemos 2min30 em relação ao chip. Como saímos atrás, não houve aquele tumulto inicial de corrida, quando os mais rápidos procuram espaço para ultrapassagem. Passei o km 1 acima do esperado e segundo quilômetro certinho. Tentei descontar no quilômetro seguinte e saiu muito rápido. A Adriana, que prefere correr mais lentamente no início, segurou um pouco e me alertou sobre meu ritmo. Consegui correr o km 3 mais perto do ritmo e a partir daí minha prova começou a fluir.

Estava programada para tomar um sachê de carboidrato a cada 5 km, nos postos de hidratação de prova, que ofereciam água e isotônico. Aproveitei o km 4, em descida, para aumentar o ritmo. No km 6, encontrei uma pequena subida, mas estava tudo sob controle. Lembrei de algumas dicas sobre postura e fui embora, focada e curtindo o percurso, um tour pela cidade de Milão, que mesclava lugares turísticos com regiões mais comerciais. Como é começo de primavera na Europa, os prédios, que não têm mais que cinco andares, já estavam com suas varandas repletas de flores e as paredes tomadas por trepadeiras.

A essa altura da prova, já dava para notar a animação da torcida. Havia muitas famílias ao longo do percurso. Como tínhamos a identificação do Brasil na camisa, os milaneses gritavam: ‘dale, brasiliana'. Era emocionante. Já os corredores, diferentemente dos portugueses, que gostam de papear e fazer festa no meio da prova, correm concentrados e, quando muito, esboçam um olhar ou um sorriso.

Quando pensei que minha prova estava controlada, no km 8 senti um desconforto. Perto do km 10, parei no banheiro. Lá se foram 2min30 do meu tempo total. A Adriana me esperou. ‘Olha que amiga!', pensei. Descontando o tempo perdido, passei os 10 km para 1h03, perto do programado, mas tive dificuldade para retomar o ritmo. Mais uma pequena subida no km 12, dessa vez numa ponte, a única da prova. Não era tão íngreme, mas era uma parte feia da cidade, em obra. No entanto, foi ali que voltei a me sentir melhor. Depois disso, era praticamente um retão para voltar à Piazza Castello, local de chegada. A partir do km 15, a marcação passa a ser a cada 500 metros e de forma regressiva. Adorei.

Quando chegamos à Piazza Castello e pensei estar perto de entrar no portão principal, somos desviados para um lindo e chique bairro residencial, com seus edifícios baixos e suas varandas coloridas, tomadas de flores. Começamos a ladear o castelo e aí sim entramos na grandiosa Arena Cívica. Para minha surpresa, uma pista de atletismo dentro do palácio. É de arrepiar. Poucos metros antes do final, meu marido, que terminou a prova em 1h39, me aguardava para me acompanhar até a chegada. A emoção foi tão grande que dei um tiro no final. Corri 200 metros de pista até cruzar o pórtico de chegada com o público gritando e incentivando. Cruzei a linha de chegada em 2h21, 4 minutos acima do planejado, mas feliz e satisfeita. A Adriana terminou um pouco à minha frente.

Claro que os resultados mereciam uma comemoração em grande estilo. À noite, aproveitamos para assistir à Orquestra Sinfônica de Milão no Teatro alla Scala, o teatro lírico mais importante do mundo. Um programa imperdível. De lá, seguimos para um restaurante, onde pedimos um típico risotto alla milanese, receita mais tradicional da região da Lombardia, onde fica Milão. Para brindar, nada melhor do que um bom vinho italiano, o maravilhoso Brunello di Montalcino."

CURIOSIDADES DA STRAMILAMO

Amadores: A partir de 2004, com a chamada "Corri con i campioni", os organizadores abriram oficialmente a participação da meia aos amadores, que antes só podiam correr a prova de 12 km, realizada no dia anterior.

Mulheres: O público feminino também tem uma história recente na meia milanesa. A prova foi aberta às mulheres somente em 2006.

Recordes: A prova já foi palco de dois recordes mundiais e já teve assim seus dias de glória no passado. Em 1993, o queniano Moses Tanui sagrou-se como o primeiro atleta a quebrar a barreira da uma hora na distância, com 59:47. Em 1998, foi a vez do queniano Paul Tergat quebrar o recorde mundial, com 59:17. O mesmo Tergat, hexacampeão da prova e atleta com maior número de títulos em Milão, correu a prova em 1996 para 58:51, recorde não homologado pela IAAF, já o percurso tinha 49 metros a menos que os 21.097 m oficiais.

Veja também

Leave a comment