Anton Kupricka tem preguiça. De fazer a barba e cortar os cabelos: “Fica mais simples assim”, sorri. A preguiça termina aí. Vontade de correr não falta. Começou bem cedo, aos 11 anos e, aos 12, completou a primeira maratona. “Soube imediatamente que esse era o tipo de atividade que me deixava feliz. Ocorre algo quando se está no meio de um bom treino (longo), que simplesmente parece ser a coisa certa a fazer e sempre há uma grande vontade de recriar esse momento. No meu caso, descobri isso muito cedo e não parei mais”, disse. Kupricka veio ao Brasil no final do ano passado para o lançamento oficial de tênis minimalistas da New Balance – a série Minimus. Conheça um pouco mais desse “ultramaratonhista” americano.
Quando foi que você descobriu que você era bom em longas distâncias e que poderia vencer provas? Em 2006 eu corri a Leadville (100 milhas ou 10 km). Foi minha primeira ultramaratona e venci com o segundo melhor tempo já feito por lá. Foi quando percebi que poderia ter uma carreira pela frente. Sempre corri muito em montanhas, com alta quilometragem semanal, e foi aí que tive a noção de estar no nível para realmente competir com qualquer um nesse esporte. Ao ser campeão em uma competição dura, você ganha confiança, essencial para qualquer um que deseja ser bem-sucedido: saber e acreditar que você pode vencer.
Você faz parte da sua quilometragem semanal descalço… Eu corro cerca de 240 km por semana e 50 deles descalço. Faço isso para ter certeza de que meus pés e a parte inferior das pernas permaneçam fortes, e para que eu me mantenha conectado com a postura e o estilo de correr que essa técnica proporciona. Não é algo que eu queira fazer o tempo todo, mas serve para que me lembre de estar “afiado”, basicamente.
Você usava tênis convencionais antes, com palmilhas ortopédicas, e agora um tênis com pouquíssimo amortecimento. Como isso aconteceu? Em 2004, quando ainda estava na universidade, passei a ler coisas diferentes – tinha alguma informação na internet naquela época a respeito de correr de uma forma que podia ser menos lesiva. Estava tendo algumas fraturas por estresse e acho que acontecia porque (hoje há pesquisas que confirmam isso), quando você tem um solado muito grosso, você bate com o calcanhar no chão e envia mais choque por todo o seu corpo do que quando você corre com tênis mais finos e leves, acarretando uma pisada mais suave e mais curta. Eu tentava diminuir o número de lesões que ocorriam comigo.
Você não faz nenhum trabalho de velocidade, não é mesmo? O que eu faço mesmo é correr nas montanhas o máximo que puder. Então isso significa subir e descer muito e tentar não me lesionar. Se você não está bem fisicamente, você não pode competir. Minha filosofia é: a corrida é nas montanhas, eu gosto das montanhas, então vou treinar nelas. Eu não gosto de treinar em pista, então não vou perder meu tempo lá.
Você tem uma abordagem mais minimalista não só para a corrida, como também no seu cotidiano, como morar na sua caminhonete por alguns dias, correr sem camiseta… Meus pais sempre me ensinaram como ter uma vida simples e não se preocupar com as coisas materiais. Eu tento manter isso na minha vida adulta porque é um jeito de me lembrar do que realmente é importante. Sobre correr sem camiseta, não tem jeito, se está calor, eu não uso – é como me sinto confortável. Não é uma “bandeira” minha. Se estiver frio, é lógico que eu vou vestir algo. Mas, em geral, não gosto de ficar carregando coisas e acredito que a experiência seja mais compensadora e mais rica quando há menos interferência entre você e o chão – sua relação com a corrida fica mais íntima.
Acredita que o seu melhor ainda estar por vir? Com certeza. Eu ainda estou aprendendo a correr provas de 100 milhas. Todas as vezes que faço uma prova, aprendo algo diferente ou volto a aprender o que eu tinha esquecido. A grande razão de eu correr é o desafio que isso representa. Se você não se desafia, será difícil crescer e aprender. E correr foi o melhor jeito que encontrei para fazer isso. Então, estou certo de que terei mais oportunidades de ter mais sucesso no futuro.
Você ia tentar correr a Ultra-Trail de Mont Blanc, não é mesmo? Sim, eu estava inscrito para a prova de 2011, mas quebrei minha perna em junho e ainda estou trabalhando para voltar a correr em alto nível. Eu fiquei engessado por dois meses e minha perna ficou fraca.
Você costumava cortar a solado dos tênis que usava para sentir mais o chão. Como foi que começou essa parceria com a New Balance para o desenvolvimento de novos tênis? Eu comecei a correr com os NB há quatro anos e desde o início nós começamos a trabalhar em um novo tênis, não o Minimus, mas uma série nova de tênis. E a ideia era desenvolver um modelo que eu não precisasse cortar o solado do calcanhar. Agora eles chegaram lá com o Minimus e outros modelos. Eles sempre foram muito receptivos às minhas ideias e acredito que os resultados foram bons tanto para mim como para a New Balance.
Você faz parte de uma nova geração de ultramaratonistas que tem uma relação diferente com o esporte, como Scott Jurek, por exemplo. Esse não parece ser o caso do Dean Karnazes, que lançou livros, filmes e outras coisas. O que você acha dele? Dean está fazendo grandes coisas pelo esporte e pelos EUA por causa de sua campanha contra a obesidade na juventude e esse é um ponto importante. Ele apenas tem uma visão diferente da que eu tenho sobre corrida. Dean faz muito autopromoção, enquanto eu estou mais preocupado em ficar nas montanhas, treinar e tentar ir bem nas competições. Mas como ele tem um perfil mais público, tem usado o fato de ser uma celebridade para fazer boas ações.