Notícias admin 4 de outubro de 2010 (1) (116)

Marathon des Sables: 245 km em 7 dias, pelo deserto do Sahara

Desde o começo do ano passado venho tentando patrocínio para me ajudar com os custos, que são bem altos, e também porque existe um prazo-limite para pagar a inscrição, e quando consegui, em março do ano passado, o sonho já começava a se transformar. Meu contato lá fora foi a empresa No limit, em Barcelona, que me ajudou em tudo que era preciso.

Minha preparação específica começou somente em janeiro deste ano, mas em 2007 tinha corrido a Maratona de São Paulo, depois em agosto do Tour do Mont Blanc na França (163 km) noticiado na CR 169, depois em outubro do Ecomotion pro 550 km (corrida de aventura), e no final do ano a tentativa do pico do Aconcágua, na Argentina.

Comecei então em janeiro aumentando o volume de corrida em ritmo bem moderado (trote) a 7 min/km, porém já com mochila de 8 a 10 kg, sendo este treinamento específico, porque na prova do Sahara você tem que levar tudo que precisa, desde equipamentos obrigatórios (ver anexo), como também toda sua comida para 7 dias de sobrevivência no deserto. Da organização somente recebíamos água, e de uma forma racionada. Meus longos variaram de 30 a 62 km, nos finais de semana, e durante a semana realizava treinos de 1 a 2 horas com mochila e também treinos de 1 hora nas caixas de areia do Parque Taquaral, duas vezes na semana.

Embarquei para Madri dia 26/3, para me juntar ao grupo espanhol; de lá fomos para Quarzazate, via Casa Blanca, no Marrocos, onde no dia 28 saímos em comboio de ônibus, juntamente com todas as outras delegações, entre elas a inglesa, americana, francesa (maiores grupos) para o ponto de largada já no Deserto do Sahara, em viagem de 6 horas

Chegando ao acampamento, fiquei na tenda 13, juntamente com participantes da Espanha, Colômbia e México. Neste dia nos foi servido um excelente jantar, assim como no sábado, com direito a vinho e cerveja, porém cercado de areia por todos os lados, pois os ventos eram fortíssimos, mas tudo com muita alegria e descontração entre os competidores.

No dia seguinte, sábado, a partir das 12 h éramos chamados para a checagem obrigatória, onde nos separávamos das nossas bagagens (a receberíamos de volta em Quarzazate) e pegávamos um sinalizador de regaste, além de apresentar nossa mochila com o mínimo de 6,5 kg e assinar termo de compromisso e pegar o chip de controle. Ao por do sol, o diretor da prova nos reuniu para passar as últimas informações.

Às 6h30 do dia 30 os marroquinos responsáveis pela desmontagem das barracas nos acordaram aos gritos de iala, iala, (eles tinham que montar o mesmo acampamento onde iríamos terminar a 1ª etapa, rotina que repetiria todo dia). Ainda com frio, levantamos para fazer nosso café da manhã, esquentando água para nossas comidas iolinizadas, tipo macarrão instantâneo, e em poucos minutos tudo pronto. Daí últimos preparativos, cuidados com os pés, protetor solar, labial, boné, óculos escuros, máquina fotográfica .

Às 9 horas nos posicionamos na largada, e com muita festa, música e energia, saímos para a 1ª etapa da 23ª Marathon des Sables.

1º dia: 31 km.  Aparentemente curta, não foi nada fácil, pois já de cara pegamos 15 km de dunas, de uma beleza fascinante, porém de extrema dificuldade de locomoção (areia muita fofa), e que mesmo com as polainas de neoprene, a areia entrava em nossos pés. Depois desse trecho, pegamos um plano, mas com muitas pedras soltas, e depois um pouco mais de dunas. Terminei a etapa com 4h35, com um calor muito forte por volta das 14 horas e termômetro marcando 46 graus. Fui direto para minha tenda descansar.

2º dia: 38 km. Considerei a etapa mais fácil, com poucas dunas e muito trecho plano, porém me excedi um pouco e terminei com 4h45, muito cansado com fortes dores nas pernas. Comecei a ficar preocupado, com medo de não agüentar, de não dar tempo para me recuperar. O nosso organismo vai ficando mais fraco, o desconforto vai aparecendo, como dormir no chão duro, choque térmico, calor x frio, além da expectativa do 4º dia onde seriam 75,5 km.

3º dia: 40,5 km. Etapa duríssima, com calor de 48 graus, sendo um total de 19 km de dunas. Daí alguns problemas começaram a aparecer, pois as tiras onde se fixavam as polainas, se soltaram, e a areia entrava direto nos meus pés, e também fortes ventos, atrapalhavam muito a locomoção, contudo terminei com  pouco mais de 6 horas. À noite foi terrível, com a ventania que tomou conta neste dia, quase derrubando nossa barraca, ficando praticamente sem dormir a noite toda, pois o vento e o barulho eram intensos.

4º dia: 75,5 km. Fomos acordados com famoso iala iala e às 9 h demos a largada da temível etapa, onde no km 7, uma verdadeira "escalaminhada" nos obrigava a usar até cordas. A descida também foi difícil com muitas pedras soltas na areia. No km 46 fiz uma parada de 20 minutos para limpar e hidratar meus pés, descansar, comer um pouco, e repeti a dose no km 59. Com muito cuidado, revezava entre trote e caminhada, até o fim desta etapa que completei às 23h, muito cansado, porém muito feliz, pois sabia que estavam faltando só duas etapas.

5º dia: descanso. Após a desgastante 4ª etapa, o tão merecido descanso. Não era preciso acordar cedo, preparar mochila, simplesmente descansar e descansar. Neste dia tivemos um calor por volta de 50 graus, e duas ótimas surpresas. A primeira foi receber no meio da tarde uma pepsi gelada cada um, realmente um prêmio naquele calor imenso. E no começo da noite, nos passaram um vídeo dos melhores momentos da prova até aquele momento. Depois fomos jantar e descansar.

6º dia: 42,2 km. Uma maratona de verdade, sendo um trecho muito técnico, com dunas, subidas muito fortes, descidas escorregadias, com um calor que chegou a 55 graus. Parava 10 min em cada posto de abastecimento de água para descansar; finalizei em 6h05. À noite, uma surpresa incrível: tivemos um show nada mais, nada menos do que da Orquestra Sinfônica de Paris, realmente um show inesquecível, emocionante, inacreditável, no meio daquele deserto todo.

7º dia 17,5 km. Uma festa, quase terminando, um trecho curto no plano, rumo a Tazarine, pequena cidade do Marrocos, onde termina a Marathon des Sables. A ansiedade era grande, parecia não terminar, mas faltando 2 km, pegamos pela primeira e única vez só asfalto. Começou a passar um flash na minha cabeça, de todo o treinamento, do apoio dos meus amigos, daquela longa semana, do calor, do frio, da saudade de minha esposa Carol, da insônia, do desconforto, uma semana sem tomar banho, sendo o único brasileiro na prova neste ano, terceiro na história da competição. Concluí o meu grande sonho na 245ª posição muito emocionado, feliz, chorando, com uma sensação de missão cumprida.

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One Comment on “Marathon des Sables: 245 km em 7 dias, pelo deserto do Sahara

  1. Parabéns, sem dúvida um grande desafio, que eu um dia também queria realizar. Grande esforço, mas chegar ao fim depois destas etapas, é proeza. Abraço e bons desafios.

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