Dia 14 de outubro, corri a Meia-Maratona de Pavia, que è uma pequena cidade perto de Milão, Itália, onde moro há mais de um ano. Decidi contar um pouco dessa história e dividir a emoção de ter chegado ao final, jà que se tratou de um verdadeiro desafio, que considero (bem) alcançado.
Já fiz dezenas de meias maratonas quando estava no Brasil e também já participei de quatro maratonas no exterior. Entretanto, esta prova de Pavia teve um significado muito especial para mim, pois o motivo da minha vinda a esta cidade foi que o meu filho Ricardo, hoje com 14 anos, submeteu-se a um transplante de medula óssea realizado no Ospedale San Matteo desta cidade, no dia 25 de novembro de 2006.
Não cabe, neste espaço, comentar as inúmeras dificuldades enfrentadas por nós, desde o momento que resolvemos sair do Brasil para esta grande aventura que ainda vivemos, mesmo passado quase um ano da operação. Apenas acho importante salientar que aqui chegamos, sem falar italiano, estranhos à Comunidade Européia, desconhecendo o que poderia ser feito e sem saber, sequer, onde ficava esta cidade. Foi tudo muito mais difícil do que qualquer pessoa possa imaginar.
Entretanto, neste longo percurso, fomos encontrando algumas pessoas, verdadeiros anjos (para os que acreditam), as quais foram fundamentais para nós concretizarmos essa história, que constitui uma verdadeira "maratona", que já dura quatro anos.
Passados os primeiros meses depois do transplante, que foram muito dramáticos, conseguimos sair do hospital e muito tempo depois senti que poderia voltar a correr um pouquinho, já que perto de minha casa existe um rio (Ticino), ladeado por árvores. Nessa época, correr meia hora para mim era verdadeira tortura, pois eu estava há anos sem qualquer preparo físico, período no qual mal tive tempo de organizar um pouco minha vida, entre tantas e tantas internações que meu filho se submeteu.
Antes desse problema surgir, corri todos as manhãs por mais de 20 anos e perdi a conta de quantas provas participei, sozinha ou com meu grupo de corrida da 4any1, de São Paulo. Assim, bem devagar e com muita força de vontade, fui vencendo as dores musculares, perdendo alguns quilinhos acumulados, melhorando o fôlego e conseguindo correr mais e melhor.
Há uns dois meses, vi anúncio dessa prova (www.corripavia.it) e devo dizer que quando aqui cheguei, ano passado, foi a propaganda dela que primeiramente me chamou a atenção na cidade e assim, imaginei que com um objetivo desse, teria mais motivação para melhorar minha performance.
Inscrição complicada. Fazer a inscrição foi complicado, pois sou uma estrangeira que vive na cidade e havia exigências que eu não preenchia. Por exemplo, os corredores por aqui devem ser filiados a uma entidade (Fidal) para participarem de qualquer prova, denominada "competitiva". Vencida a burocracia, com a ajuda de inúmeros amigos, nem acreditei quando fui buscar meu chip e número.
Com o cuidado de um artesão, coloquei o peitoral na camiseta, escrita Brasil e no dia da prova me juntei aos outros corredores (mais ou menos 1.000), todos da região onde estamos, que é a Lombardia. Muitos amigos que fiz por aqui estavam na largada, na chegada e durante o percurso, dando a maior força para mim que, assim, revivi a emoção, já sentida tantas outras vezes, de ser estrela protagonista desse espetáculo que é a corrida.
Meu tempo foi de 1h57 e fiquei muito contente, embora diversas vezes anteriormente eu tenha conseguido me sair bem melhor. No final, lágrimas e abraços. Todas as pessoas daqui que souberam que corri e conhecem as circunstâncias da minha jornada vieram me cumprimentar. Meu filho Ricardo (e o outro Raul, 16 anos, que também está aqui) ficaram muito orgulhosos de mim. Eu… na verdade, não tenho palavras para falar da minha alegria, ou de quanto a corrida acerta o prumo da minha vida, ou ainda de como através dela pude encontrar pessoas tão especiais em várias partes do mundo, notadamente aqui, onde me sinto meio italiana e onde meu filho teve outra chance de viver.
Ele está muito bem, estamos acertando os últimos detalhes para voltar para casa e considero importante apelar para as pessoas se interessarem por saber um pouco sobre o significado desse transplante, da importância da doação de medula, que constitui a única oportunidade de vida para muitas pessoas sobreviverem, a exemplo do meu filho. Meu e-mail é vemoyses@terra.com.br e estou disponível para contar, ajudar, somar e esclarecer quem se interessar. Ainda tenho muito que andar com meu filho nesta história, mas procuro pensar que também tenho muito que correr, o que facilita as coisas e me mantém forte para seguir até onde for preciso…



