Sem categoria admin 7 de setembro de 2016 (0) (96)

Para a elite e nem tanto

Esta é a segunda matéria reunindo interessantes trabalhos e apresentações do encontro sobre Bases Biomédicas da Performance de Elite (tradução livre), ocorrido na Inglaterra durante o mês de março, e que contou com a participação do colunista Fernando Beltrami.
Ao longo dos quatro dias de evento, centenas de trabalhos foram expostos, em que pesquisadores novatos mostravam seus resultados mais recentes e veteranos apresentavam um apanhado dos principais marcos de suas carreiras.
Apesar do título, a conferência tratou de uma série de áreas relacionadas ao esporte, do rendimento à saúde, e apresentamos aqui três tópicos.

EXERCÍCIO E PRESSÃO ARTERIAL
Porque é interessante:
Muitas pessoas procuram a corrida buscando uma vida mais saudável, frequentemente por recomendação médica. Além de modificações crônicas (positivas) no sistema cardiovascular, cada sessão de exercícios pode gerar uma pequena queda de pressão arterial sistólica, que dura por até 24 horas. Assim, uma rotina de treinos constante confere um benefício extra no combate à hipertensão.

Achados recentes: Como a maioria das recomendações de corrida para a saúde ainda se baseia na antiga ideia de exercício moderado, cerca de 30-60 minutos por dia, grande parte dos trabalhos sobre o efeito da hipotensão pós-exercício era feita com este tipo de atividade. Com o ganho de popularidade de treinamento intervalado para pessoas sedentárias, os efeitos destas sessões de treinos mais intensas, porém bem mais curtas, também estão sendo investigados.
Um trabalho apresentado mostrou que comparando o intervalado de altíssima intensidade e curta duração (8 x 1 min), com treinos intervalados de alta intensidade (4 x 4 min) e treino contínuo (30 min), o formato 4×4 se mostrou superior aos demais, reduzindo a pressão arterial sistólica em cerca de 10 mmHg, mais que as outras sessões.

Veredito: O treinamento intervalado vem se firmando como uma alternativa segura e mais eficiente para ganhos de saúde, do que o treinamento contínuo, mesmo para pessoas com baixo condicionamento. No caso da corrida, que gera uma carga muscular maior do que uma bicicleta ergométrica, é aconselhável uma fase de adaptação, com treinos em baixas cargas que aumentem gradualmente. A ausência de progressão adequada e a empolgação dos iniciantes com os ganhos rápidos, constatados nas primeiras sessões de treino, é o caminho mais rápido para lesões, e não para saúde.

ASMA, ATLETAS E DOPING
Porque é interessante:
Em condições normais, o exercício induz uma dilatação das vias aéreas, para que os sistema respiratório consiga lidar com os grandes volumes que são ventilados. No entanto, cerca de 40% das pessoas desenvolve uma resposta de constrição das vias aéreas, que aumenta o esforço requerido dos músculos respiratórios e pode levar a quedas de performance. Indivíduos com este sintoma são comumente diagnosticados como asmáticos, e podem receber recomendação para o uso de uma classe de medicamentos chamados de beta2-agonistas.

Achados recentes: Nas últimas olimpíadas, uma tendência interessante foi encontrada. Se dividirmos todos os atletas entre asmáticos e não asmáticos, se descobriu que os asmáticos ganham proporcionalmente mais medalhas do que os não asmáticos! Uma possibilidade para explicar o fenômeno é que a asma seja uma consequência dos treinos mais intensos de atletas de sucesso. A outra é que medicações para asma tragam benefícios para performance.

Veredito: Em função dos treinamentos e do estresse ao sistema respiratório, muitos atletas podem apresentar sintomas de broncoconstrição induzida por exercício, sem serem necessariamente "asmáticos". Assim, existe a possibilidade de falsos-positivos para estes atletas, que ganham autorização médica para o uso de beta2-agonistas. Mesmo dentro das doses permitidas pela agência mundial antidoping, contudo, esta classe de medicamentos pode trazer benefícios à performance, como tem sido constatado por diversos estudos. Assim, a regulação antidoping possivelmente terá de ser revista nos próximos anos, para evitar abusos por parte de atletas.

TREINAMENTO INTERVALADO
Porque é interessante:
Correr menos e mais forte, para correr melhor. A quantidade de atletas que negligencia treinos de alta intensidade em favor de volumes semanais absurdos ainda é muito alta. Contudo, em função da quase infinita quantidade de variações possíveis, é muito difícil estabelecer qual o rotina ideal de treino intervalado para o aumento do rendimento em provas de resistência.

Achados recentes: A quantidade de estudos sobre o treinamento intervalado tem crescido muito, principalmente com foco em pessoas sedentárias e moderadamente ativas (ou não-atletas). Mesmo dentro das variações de treino intervalado, a intensidade continua sendo considerada a chave para adaptações, quando comparada ao volume. Duas séries de 4 minutos em 90-95% da frequência cardíaca máxima, por exemplo, já bastam para trazer benefícios em uma sessão de treino. Da mesma forma, 6-12 séries de apenas 1 minuto também são eficientes para a melhora de performance (pelo menos em 95% dos corredores pelo mundo).

Veredito: Se um corredor faz 20, 30, 40 séries de 400 m, por exemplo, é porque possivelmente deveria realizar apenas 10-15 em um ritmo mais intenso, ou não considerar este treino como efetivamente um intervalado, do ponto de vista do objetivo de treino. Para atletas de mais alto nível, a mais recente "receita" inclui 10-15% do volume semanal feito de forma intervalada, em alta intensidade, e o restante em baixa intensidade, sem muitos treinos intermediários (o chamado treino polarizado). Para quem corre 100 km semanais, por exemplo, isso seria o equivalente a 5 x 1 km em ritmo intenso, feitos duas vezes por semana.

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