Performance e Saúde admin 24 de maio de 2016 (0) (220)

Um novo conceito na escolha dos seus tênis

Os calçados esportivos, e os tênis de corrida em especial, são alvo de constantes inovações. A cada ano modelos são atualizados e surgem novas tecnologias, sempre prometendo diminuir as chances de lesões ou mesmo aumentar a performance. Impossível, por exemplo, esquecer um modelo vendido ali pelo ano 2000 que prometia aumentar a passada do corredor em 2 cm.
Mesmo que os calçados utilizados hoje em dia sejam muito diferentes daqueles utilizados há 40-50 anos, quando a corrida ainda era um esporte pouco difundido, fato interessante é a prevalência de lesões em membros inferiores, supostamente o ponto alto de pesquisa no desenvolvimento de calçados, que parece não ter diminuído ao longo dos anos.
Claro, existe o argumento dizendo que recentemente cada vez mais pessoas menos preparadas estão se arriscando na corrida, o que aumentaria a quantidade de lesões. É um ponto válido, mas o fato é que a grande maioria dos estudos feitos na área jamais conseguiu comprovar a efetividade de qualquer tecnologia na redução de lesões.
Desde o boom do mercado de corrida, lá pelos anos 70, se acreditava que dois fatores eram os responsáveis pelas lesões dos corredores, pelo menos do ponto de vista da pisada: o primeiro seria a pronação excessiva e o segundo as forças de impacto causadas pelo contato com o solo.
Visando combater o primeiro, surgiram os calçados adequados para cada tipo de pisada, com diferença de densidade entre as várias partes da sola e outros sistemas que visavam restringir o movimento do pé ao considerado ideal. O problema do impacto com o solo foi inicialmente resolvido com o amortecimento, e aí surgiram as mais diversas tecnologias – desde cápsulas de ar até molas, passando por todo o tipo de espuma e polímeros – e mais recentemente a onda da corrida descalça ou minimalista, que promove uma corrida "mais natural".
A falta de efetividade dos calçados (ou ausência deles, no caso da corrida descalça) em reduzir a prevalência de lesões parece ter diversos motivos. Quanto ao controle de pisada, por exemplo, já foi demonstrado que os movimentos do esqueleto não se alteram em função do calçado. As forças de reação do solo apresentam um cenário igualmente confuso: estudos mostram que corredores chegam a ter forças de impacto maiores quando acreditam estar correndo com calçados mais tecnológicos, talvez em função de não se preocuparem conscientemente com a pisada no mesmo nível de quando acreditam estar utilizando calçados ruins.

NOVO CONCEITO. Tendo decidido abandonar o tipo de pisada e o impacto com o solo como fatores que determinam se um calçado irá aumentar ou reduzir as chances de lesão, um grupo de pesquisadores da Universidade de Calgary, no Canadá, sugeriu recentemente uma teoria baseada no que eles chamam de "filtro de conforto" e "padrão de movimento favorito".
Segundo os pesquisadores, o sistema músculo-esquelético de cada corredor possui um determinado padrão mecânico para correr, o seu padrão de movimento favorito. Assim, diferentes calçados terão diferentes influências sobre o quanto os músculos terão que trabalhar de forma diferente para manter o seu padrão favorito de movimento em função do calçado.
Em outras palavras, não é o calçado que muda a sua corrida, mas você muda a maneira como seus músculos trabalham para manter sua corrida com qualquer calçado. Neste ponto, entra em cena o "filtro de conforto". O calçado (ou ausência dele) que oferecer a menor dificuldade para que este padrão favorito ocorra será percebido como confortável pelo corredor, e resultará em uma menor incidência de lesões.
Os pesquisadores acreditam que corredores naturalmente irão sentir os calçados que necessitem de menos intervenção do sistema músculo-esquelético como confortáveis, e esta sensação deveria guiar a escolha do calçado.

TESTANDO O CONCEITO. Um dos principais fundamentos para esta teoria é um estudo que avaliou o efeito do uso de diferentes palmilhas na prevalência de lesões em soldados. Ao contrário de investigações em que as palmilhas são feitas de acordo com a pisada ou geometria dos pés dos participantes, nesta os pesquisados podiam escolher entre seis diferentes tipos de palmilhas, com base puramente no conforto.
O resultado, ao final de um ano de acompanhamento, foi que o grupo das palmilhas teve 50% a menos de lesões que um grupo controle! É importante salientar ainda que das 6 palmilhas oferecidas 5 foram escolhidas por uma quantidade parecida de participantes, mostrando que a definição de "conforto" é altamente individual, e que não houve um tipo específico de palmilha responsável pelo menor índice de lesões.
Por fim, existem também evidências mostrando que o consumo de oxigênio (ou gasto de energia, em outras palavras) é reduzido quando participantes correm com calçados considerados confortáveis, o que dá crédito à ideia de que o calçado confortável diminui o esforço necessário para o sistema músculo-esquelético manter seu padrão de movimento.

NA PRÁTICA. Obviamente que estudos mais robustos são necessários para comprovar se realmente o conforto é superior aos outros métodos (análise de pisada etc) na determinação do calçado ideal. Independente disso, mesmo a questão do conforto ressalta a grande variabilidade que existe na definição de cada pessoa sobre o que é "confortável".
Ao mesmo tempo, esse detalhe abre espaço para que um grande leque de produtos continue a ser necessário, bem como para que ninguém se ache no direito de convencer outro corredor que um ou outro tipo de calçado será o ideal para ele.
Experimentar o calçado em uma loja, de preferência que ofereça um test-drive para uma breve corrida, parece ser de longe a melhor escolha. O truque está em não perguntar ao vendedor qual o calçado correto e sim experimentar diversos dentro daquela gama (por exemplo, somente modelos para pronadores com drop alto), ou modelos e tecnologias completamente diferentes antes de tomar sua decisão.

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