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Performance e Saúde admin 10 de março de 2015 (0) (572)

Saindo do plano para o sobe e desce

Se por um lado provas em terreno plano são ideais para iniciantes e para a quebra de recordes pessoais, por outro elas podem se tornar monótonas para alguns e muitos passam a buscar novos desafios, sejam em montanha ou simplesmente com altimetria mais variada.
A grande questão é que, ladeira acima ou abaixo, a corrida em inclinação é bastante diferente, e essa peculiaridade pode facilmente frustrar os objetivos dos menos avisados. Por isso, é preciso estar consciente de algumas das características de se correr em rampa, o que permitirá uma melhora do treinamento, da performance e do dia seguinte ao evento.

CUSTO ENERGÉTICO. Comparado ao esforço dispendido em trecho nivelado, o custo metabólico de correr com inclinação positiva é maior e o de correr em inclinação negativa é menor, como poderia ser esperado. Uma boa regra geral é que o custo metabólico de cada 2,5% de aclividade equivale a correr em cerca de 1 km/h mais rápido no plano. Já para a descida, o benefício é menor do que o prejuízo da subida. É preciso cerca de 4% de declividade para reduzir o custo energético ao equivalente de 1 km/h a menos no plano.
Além disso, o acúmulo de lactato é maior durante a subida, ainda que o corredor diminua o ritmo, tentando manter a mesma percepção de esforço, o que indica um maior estresse metabólico. Durante as descidas, mesmo com o aumento de velocidade, o consumo de oxigênio e a frequência cardíaca dificilmente alcançam aqueles obtidos durante a corrida em lugares mais retilíneos.
Assim, é importante para o corredor ter em mente de que a curva do estresse metabólico terá, em termos práticos, o formato da curva de altimetria, e não o da curva de velocidade: ou seja, quando a altimetria sobe, o custo metabólico sobe mesmo que a velocidade caia; quando a altimetria é negativa, o custo metabólico cai mesmo que a velocidade suba.

ATIVAÇÃO MUSCULAR. Durante a corrida em rampa, a musculatura das pernas age de forma distinta em aclives e declives. Nas subidas, em parte devido à inclinação à frente para estabilizar o centro de massa do corpo, a musculatura dos flexores e extensores do quadril trabalha de forma mais acentuada. Os extensores do quadril (parte de trás da coxa) são mais exigidos durante a recuperação da passada, tornando os passos mais curtos e frequentes. Na subida há ainda uma tendência de se correr tocando o solo com a parte dianteira dos pés, o que sobrecarrega os músculos das panturrilhas.
Já nas descidas, o cenário é outro: aqui a gravidade "empurra" o corpo, facilitando a velocidade. Assim, a musculatura precisa trabalhar mais de forma excêntrica, quando o músculo se estende sob tensão ao invés de contrair, que é o trabalho de frenagem de um movimento. Este tipo de contração muscular é mais agressivo para as fibras musculares do que as contrações "normais" (chamadas de concêntricas) e são responsáveis pela chamada dor muscular tardia, que costuma aparecer entre 24-72h após uma corrida extenuante, principalmente quando há descidas no percurso.

TREINAMENTO. Com base nas diferenças que vimos acima, um dos principais erros de corredores que buscam competições com altimetrias variadas é o de treinar apenas as subidas. Um exemplo típico desse cenário é o de incluir séries de subidas nos treinos intervalados (descendo trotando e/ou caminhando) e dar por concluída a sessão de altimetria variada.
É vital para a performance, e também para a recuperação pós-prova, que o treino de descidas também seja realizado, de preferência em ritmo e/ou volume ou pouco superior àquele do dia da disputa. A musculatura deve ser preparada não apenas para o trabalho extra realizado durante as subidas, mas também para a carga mecânica adicional imposta pelas descidas.
O treinamento de descidas propicia uma adaptação mais ampla dos tecidos conjuntivos que envolvem os músculos, e também oferece o estímulo necessário para que a ativação muscular durante as contrações excêntricas seja aperfeiçoada, de forma a melhor distribuir a carga e minimizar o dano causado às fibras musculares.

NAS PROVAS. O primeiro ponto é aprender a ler a altimetria de uma competição! Esta normalmente pode vir em graus ou em porcentagem. Apesar de os valores em graus serem mais intuitivos para alguns, na maioria das vezes o que se vê são os valores em porcentagem ou simplesmente o gráfico da altitude em função da distância.
Para calcular a altimetria em % é muito simples: basta dividir o quanto se sobe (ou desce) pela distância que esta variação leva para ocorrer. Por exemplo, em um trajeto de 10 km com subida constante em que o ganho de altitude seja de 400 m, a inclinação do percurso é de 400 m/10.000 m = 4%.
Uma vez entendido como calcular a variação de altitude, fica mais fácil estimar o custo energético dessas mudanças ao longo de toda a prova, conforme descrevemos acima. De posse desse tipo de informação, pode-se prever com mais precisão o quanto o rendimento irá sofrer, e em que tipo de terrenos a preparação deve ser feita.
Também é importante lembrar que em competições de altimetria variada a performance irá sofrer, mesmo que a variação final de altitude seja zero (por exemplo, com largada e chegada no mesmo ponto). Isso porque, como vimos, os "benefícios" da descida não pagam os prejuízos da subida, além de trazerem um aumento do dano (e dor) muscular.
Por último, é importante perceber também que em função das diferenças metabólicas, tentar estimar o ritmo de prova com base em parciais de ritmo ou em zonas de frequência cardíaca poderá não funcionar, e a sensação de esforço poderá ser um parâmetro mais confiável.

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