Cada maratona tem uma história. Difícil (diria quase impossível) fazer comparações. Condições climáticas são determinantes. Tanto para nós, simples mortais, quanto para a elite, incluindo a nata da nata, quenianos e etíopes, seres de outro mundo. Hoje, Solonei Rocha da Silva escreveu a história dele na Maratona de São Paulo. Sem comparações com outros atletas ou provas. Um feito para comemorar. Muito. Quem sabe, o início do ciclo para Rio-2016.
Não dá para fazer relações com a Maratona de Londres, quando Solonei não obteve o tempo que esperava, ficando fora da equipe olímpica brasileira. A altimetria de São Paulo é mais complicada que a da prova londrina? Não muito, mas sim. Só que as condições climáticas foram totalmente adversas em abril, com vento contra a partir do km 25. Em São Paulo, hoje, o clima ajudou. Pode não ter sido 100%, mas foi bom. Dessa forma, Londres foi bem mais difícil do que São Paulo nesta temporada. Em 2013, pode mudar…
Boston em 2011, com muito frio e vento a favor em boa parte do percurso. Neste ano, 27°C na largada, pico de 34°C e média de 32°C. Um forno por 42.195 m. Impossível comparar as duas provas, mesmo sendo disputadas no percurso idêntico. Em um ano, Geoffrey Mutai cravou 2:03:02, a maratona mais rápida da história. No seguinte, não aguentou o calor e abandonou… Se não conseguimos comparar uma prova no mesmo local, como fazer com cidades e percursos diferentes?
Toda essa introdução é para chegar em um ponto. Solonei mereceu demais a vitória de hoje. Tive o prazer de correr dois dias com ele na pista do Bolão, quando relaxava após tiros. Assim, consegui acompanhá-lo! Ficou realmente muito chateado por ficar fora da Olimpíada. Recomeçando os trabalhos, estava longe do nível técnico que chegou a Londres. Não sabia como seu corpo reagiria na Maratona de São Paulo. Disse isso em visita ontem ao estande da Contra-Relógio na entrega dos kits. Assim, a vitória na capital paulista tem uma importância psicológica fundamental.
Solonei sabe se expressar, é atuante nas redes sociais, simpático, brincalhão, tem uma história de vida que cativa as pessoas, humilde… Ou seja, carrega todas as características que o eleva à categoria de ídolo. Os resultados estão vindo. Vitória na Maratona de Porto Alegre, no Pan-Americano de Guadalajara, agora em São Paulo… Possui todas as possibilidades para evoluir demais (tem uma carreira muito recente) e chegar em 2016 no melhor momento da carreira. Só depende dele. Será suficiente para estar na Olimpíada e brigar por uma ótima posição? O tempo dirá.
Só um erro não podemos cometer. Marilson Gomes dos Santos, Paulo Roberto de Almeida Paula e Franck Caldeira estão classificados para Londres-2012 com justiça. Por méritos. Fizeram os três melhores tempos. Não há comparações ou injustiças. Marilson tem seu nome consolidado. Paulo Roberto e Franck lutaram muito para chegar lá. Merecem ser respeitados. Não podemos esquecer disso.
Franck deu a volta por cima, quando poucos acreditavam. Só para lembrar, esteve em Pequim-2008 e também já foi campeão pan-americano e vencedor da Maratona de São Paulo, além da São Silvestre de 2006 (foto). Poucos sabem (leiam a ótima entrevista da Fernanda Paradizo na edição deste mês de junho da Contra-Relógio com o técnico Marco Antonio de Oliveira), mas Paulo Roberto pagou do bolso para competir em Pádova, quando garantiu a terceira posição e ratificou a vaga olímpica. Também tem uma história de superação, de garra, de luta, origem humilde…
Em um país onde sobreviver do atletismo exige uma luta praticamente diária, Solonei, Marilson, Paulo Roberto, Franck estão de parabéns. Merecem aplausos e respeito. São Brasileiros assim mesmo, com B maiúsculo. Vão escrevendo a história deles maratona após maratona.
Fotos: Fernanda Paradizo e Sérgio Shibuya/ZDL