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Catabolismo em maratonistas! Cata… o que?

Notícias do corpo – Luiz Carlos de Moraes  lcmoraes@compuland.com.br – Junho de 2008

 

Quando a gente gosta de uma determinada modalidade esportiva, principalmente as contagiantes como é a corrida, muitas vezes não nos damos conta que deveríamos usar o esporte e o exercício físico como um todo para preservar a nossa própria saúde. Sendo assim, é comum vermos adeptos defenderem com “unhas e dentes” suas paixões. A corrida é o melhor esporte. A musculação é melhor. Que nada! Aeróbica é a escolha!

Por si só, numa visão técnica científica, nenhuma modalidade esportiva é completa, nem mesmo a natação como defendem os mais ferrenhos.

Levando-se em consideração a saúde, defendo um treinamento mais completo, incluindo pelo menos três valências físicas importantes: força, condicionamento aeróbio e flexibilidade. Isso, desde o cidadão comum, que é a maioria, até os atletas de elite. Em condicionamento aeróbio, diminuição do percentual de gordura e prevenção das doenças cardiovasculares, a corrida é campeã, mas, desenvolve pouco a força e a flexibilidade.

Outro ponto de discussão é a questão da intensidade e duração de cada modalidade relacionada com os benefícios e supostos malefícios. Afinal, deve-se correr sempre forte para acostumar o corpo com os rigores da prova? Ou será melhor mesclar treino forte com fraco?

 

Testosterona e cortisol

Existe um fator que deve ser levado em consideração nessa questão. Entre os vários hormônios que o corpo produz, alguns são ativados e outros inibidos conforme a intensidade e duração do exercício. Entre eles, a testosterona e o cortisol têm fundamental importância no resultado do desgaste físico.

A testosterona é o hormônio masculino, que a mulher também produz em menor quantidade, cuja função principal é construir a massa muscular e é estimulado com exercícios de alta intensidade e curta duração, assim como nos exercícios de força. Nos exercícios de longa duração, acima de 2 horas, alguns trabalhos mostraram claramente uma queda desse hormônio, permanecendo por mais de 20 horas após o término da atividade.

O cortisol é um hormônio renal ligado ao estresse que estimula o estado de alerta no corpo e, através de vários processos durante o exercício, participa da mobilização das gorduras na obtenção de energia. Entretanto, quando produzido em grandes quantidades destrói as proteínas.

Ao contrário da testosterona, nos exercícios de longa duração o cortisol permanece em quantidades altas por muitas horas depois da atividade. Em estado de repouso a diferença entre os dois hormônios presentes no corpo após uma corrida é o que determina o balanço entre ganho e perda de massa muscular, respectivamente anabolismo e catabolismo. Essa diferença também serve para determinar o tempo de recuperação de atletas após uma atividade física qualquer.

Exatamente por ser uma atividade extenuante, o maratonista entra constantemente, sem perceber, nesse processo chamado de catabolismo, ocasionando a perda de massa magra (músculos). Essa talvez seja a razão dos corredores terem baixo percentual de gordura, “secos” como se diz no popular, o que não acontece com o atleta de força.

 

Ganho e perda de músculos

O treinamento de força, que comprovadamente sugere o anabolismo (crescimento dos músculos) seria uma das formas de evitar isso porque estimula a produção natural de substâncias anabolizantes na medida certa. Essas substâncias são os hormônios testosterona, o GH (hormônio de crescimento) e a insulina. A testosterona é o hormônio sexual masculino produzido pelos testículos. O GH pela hipófise e a insulina pelo pâncreas.

A testosterona é estimulada pelos exercícios de força e ingestão adequada de gorduras e proteínas. O GH é sintetizado a partir de aminoácidos e estimulado pelo treinamento de força em especial durante o sono, na fase conhecida por paradoxal, o REM (Movimento Rápido dos Olhos). O cansaço gerado pelo treinamento na dose certa, aumenta essa faixa de sono e consequentemente a liberação maior de GH. A insulina também é sintetizada a partir de aminoácidos e estimulada pela ingestão de carboidratos na quantidade adequada.

O catabolismo também pode ocorrer no treinamento de força principalmente em decorrência dos erros de treinamento, seja na questão da intensidade ou na recuperação insuficiente. As situações de estresse, físicas ou emocionais, liberam o cortisol, como citado, contribuindo para a degradação do tecido muscular e desidratação dos músculos durante os exercícios prolongados. Daí a sugestão que o treinamento de maratonista e/ou ultramaratonista deva ser bem dimensionado nessas questões de exercícios de força conjugados com os de curta e longa duração e os tempos de recuperação entre as seções que são diferentes para cada indivíduo.

O nosso corpo, seja em situação de repouso ou de treinamento, pode estar em catabolismo em qualquer momento, perdendo massa magra. Esse “perde e ganha” músculos, segundo os especialistas, está intimamente ligado ao processo de síntese e degradação de proteínas, chamado pelos estudiosos de ciclo de turnover ou simplesmente de ciclo de proteínas, representando um total de aproximadamente 125 a 300g/dia, ou seja, um bife.

 

Não esqueça das proteínas

Boa parte dos aminoácidos gerados pela degradação é reaproveitada, mas não chega a 100%. Isso justifica a importância da ingestão de proteínas na alimentação. De um modo geral, o corredor conhece muito bem o valor dos carboidratos porque é muito bem difundido. É macarrão pra cá, macarrão pra lá, e depois da corrida também. O jantar de massas antes de maratona tornou-se uma tradição. Isso está pra lá de certo porque diminui a participação das proteínas para fornecer energia, o que não quer dizer dispensar carnes etc do nosso cardápio.

Entretanto, quando o atleta cansa dentro de uma prova ou treinamento longo as proteínas começam a se perder, dando início ao processo do catabolismo. Para se evitar essa perda, também chamada de balanço nitrogenado negativo, normalmente associado à queda de rendimento, os especialistas recomendam a ingestão de aproximadamente 2g por kg de peso corporal de proteínas ao atleta. Ou seja, um bife para um atleta de 70 quilos. Claro, se o treinamento inclui modalidade de força a necessidade aumenta na mesma proporção do ganho de massa muscular.

Para saber se o atleta está ou não perdendo massa muscular, a forma mais prática é fazer avaliações funcionais, hábito pouco freqüente entre os corredores. Hoje em dia, essas avaliações são bastante acessíveis à classe média e toda boa academia tem. Existe também o método de medição de nitrogênio uréico em coleta de urina durante 24 horas, método mais utilizado para atleta de elite que dispõe de equipe multidisciplinar. Da mesma forma a coleta de sangue quatro dias antes de uma maratona, após a chegada e novamente 20 horas depois é outro método acessível a poucos.

A nós, simples mortais, resta usar bom senso e prazer nos treinamentos não treinando demais nem de menos. A presença ou não da dor muscular e do cansaço pode ser um sinal de alarme. Treinar muito nem sempre significa ganho e treinar pouco pode ser improdutivo.

 

Algumas regras para evitar o catabolismo

* Treine usando o bom senso, ou monitor de freqüência cardíaca. Perceba se o treino está fraco, moderado ou forte. Com o monitor use a freqüência cardíaca mais adequada estabelecida em teste ergométrico ou nas conversas com o seu treinador.

* O treino forte é importante, mas não abuse. Dê o descanso necessário a seu corpo, geralmente entre 48 a 72 horas. Um treino fraco nesse período também funciona bem para acelerar a recuperação.

* Procure dormir em torno de oito horas por noite. O sono de boa qualidade em ambiente tranqüilo é reparador.

* Não descuide da alimentação e nem pule refeições. O ideal é fazer cinco ou seis pequenas refeições diárias, comendo de tudo um pouco. As proteínas são necessárias na reparação do músculo sacrificado na corrida. A opção de não comer carne vermelha é pessoal, não comer carne nenhuma pode ser intolerância.

* Procure administrar o estresse emocional do dia-a-dia. Ele é inevitável, mas pode-se conviver melhor “esquentando a cabeça” somente com as coisas realmente importantes. O cortisol é liberado na corrente sanguínea toda vez que nos aborrecemos ou nos deparamos com uma situação de perigo e decisão de luta ou fuga. Se você tiver um dia ruim e nesse mesmo dia ainda for treinar forte, os músculos poderão pagar a conta.

* Faça uma variação de treinamento, conjugando força, resistência e flexibilidade. As três valências físicas são importantes para quem deseja correr sem estar às voltas com lesões.

* Procure estar de bem com a família, com os colegas de trabalho e da corrida. Reforçando: o estresse emocional também faz um estrago considerável.

E para terminar, três recadinhos: a competência de prescrever dieta alimentar é do nutricionista; ao treinador cabe o planejamento e orientação do exercício e se manter informado; e medicamentos devem ficar por conta de médicos.

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