Fisioterapia – Alessandra Arkie e Kenia Guerra Baumann
fisio-rpg@uol.com.br – Maio 2008
Existem muitas dores que rondam atletas e esportistas em geral, sendo que algumas têm características que chegam a ser confundidas com outras patologias. Nestes casos, o diagnóstico correto é imprescindível para que o tratamento dê resultado. Uma dessas dores é a pubalgia, que incomoda alguns corredores e que precisa ser tratada para não atrapalhar os treinos e as competições.
O termo pubalgia denomina dor no púbis (o osso que se localiza no final do músculo do abdome, sob a região genital; faz parte do osso do quadril) (Figura 1). Essa denominação é muito abrangente, o que muitas vezes gera confusão, pois seus sintomas podem se assemelhar a outras patologias. Para alguns autores este termo é usado para a ocorrência da lesão do canal inguinal, mais conhecida como hérnia inguinal.
Outras patologias que têm sintomas parecidos são: hérnia inguinal, doenças geniturinárias, osteítes púbicas (síndrome do músculo grácil e síndrome do músculo piriforme), prostatite, bursites na região do quadril ou artrite do quadril. Porém, mais de uma causa pode estar associada à dor no quadril. Abordaremos nesta matéria somente a dor na virilha relacionada à tensão da musculatura dessa região com ou sem alteração do osso do púbis e sem hérnia inguinal.
A dor na região do púbis ou na virilha é muito comum em atletas e pode ser aguda ou crônica. Acomete principalmente jogadores de futebol e tênis, mas também corredores de longa distância (maratonistas) quando em treinos de tiro, ou corredores de aventura. É mais freqüente em homens do que em mulheres devido à quantidade proporcional de praticantes de futebol e também às diferenças anatômicas e biomecânicas dessa região do corpo (a bacia da mulher se adapta melhor aos impactos dos esportes).
Mecanismos de lesão e causas
Os mecanismos de lesão podem incluir alterações rápidas de direção, movimentos repetidos de corrida associados a desequilíbrios musculares, traumas diretos, diferenças no comprimento dos membros inferiores, prática esportiva em pisos duros, uso de calçados inadequados e excesso de treino.
A causa mais comum da dor na virilha é a distensão ou tensão exagerada da musculatura que envolve esta região, abrangendo os músculos adutor longo, reto abdominal, iliopsoas, pectíneo e reto femoral. Pouca flexibilidade da musculatura da região do quadril e pélvis, assim como instabilidade de quadril e desequilíbrio muscular entre adutores e músculos do abdômen, também podem contribuir para o surgimento da pubalgia.
Quando a pubalgia tem sua causa na musculatura, o músculo e tendão mais acometido normalmente é o do músculo adutor (porção longa), podendo apresentar uma inflamação crônica ou até uma lesão das fibras (ruptura de uma parte do tendão ou músculo). Outro músculo comumente acometido é o reto abdominal na porção que se insere no osso púbis. A tensão nestes dois músculos desequilibra o quadril, pois o músculo reto abdominal traciona o osso do quadril para cima, enquanto o adutor puxa para baixo.
Sintomas
A dor é bem localizada na virilha e pode acometer apenas um lado ou os dois. Normalmente ocorre durante a corrida (ou outro esporte), mas se o atleta continuar correndo a dor pode aparecer durante outras atividades como sentar-se e levantar-se de uma cadeira, subir e descer escadas, agachar, mudanças de direção abrupta, aceleração e chute. Corredores normalmente apresentam dor localizada e forte desde o início da doença.
Se houver irradiação da dor, o atleta pode sentir incômodo na região de abdome inferior, adutores, região genital e lombar, caso haja associação com alterações da articulação sacroilíaca (junção do quadril e porção final da coluna).
Diagnóstico
Quanto mais demorado for o início do tratamento maior será o tempo de recuperação. Quando diagnosticado e tratado rapidamente o corredor tem a chance de não se afastar da corrida, tendo apenas o seu treino modificado até a recuperação total. O tempo de afastamento do esporte depende de cada caso.
O diagnóstico médico é de extrema importância. Além do exame físico, os exames de imagem auxiliarão o médico a fazer o diagnóstico correto. O raio X pode mostrar lesão do osso púbis, calcificação dos tendões acometidos, osteoartrite ou instabilidade pélvica. Já a tomografia computadorizada e a ressonância magnética podem evidenciar outras causas da dor na virilha, como a existência de hérnia inguinal ou lesões musculares e tendíneas.
Tratamento
O tratamento para dor na virilha decorrente da hérnia inguinal é, na maioria das vezes, cirúrgico. Já o tratamento para pubalgia decorrente das alterações musculares e ósseas é conservador. Esse é o principal motivo de escolhermos o segundo tipo para aqui abordarmos. Além do tratamento médico, a acupuntura e a fisioterapia auxiliarão a completa recuperação.
O objetivo do tratamento fisioterápico consiste em diminuir a dor e a inflamação, aumentar a resistência do tendão ou tendões acometidos, restabelecer o equilíbrio muscular, melhorar a estabilidade do quadril e da coluna. É recomendada a aplicação de bolsa de gelo por 20 minutos no local da dor, duas a três vezes por dia, desde o início do aparecimento da dor até o final do tratamento.
No início da patologia não se deve correr com dor. Muitas vezes, após a realização do tratamento correto, no retorno ao esporte pode acontecer um pouco de dor durante a corrida, mas essa dor pode ser descrita mais como um incômodo do que dor. A musculatura acometida precisa de um tempo de adaptação, o que justifica esse incômodo, bem diferente da dor durante a pubalgia.
EXERCÍCIOS
Não inicie esta série de exercícios para tratar uma dor sem diagnóstico. Os exercícios relacionados nesta matéria servem para mostrar a abrangência do tratamento fisioterápico necessário para um bom resultado. Infelizmente, muitas vezes, a abordagem consta apenas de aparelhos como ondas curtas e microondas, sendo que os exercícios são indispensáveis para o retorno à corrida. Portanto, estes exercícios não devem ser utilizados isoladamente como tratamento.
Observação válida para os exercícios 1 e 2: estes exercícios têm o objetivo de melhorar o movimento da articulação do quadril. Durante a realização deles você pode sentir um incômodo na virilha ou na lateral do quadril, o que será normal.
EXERCÍCIO 1
Sentado numa cadeira, cruze a perna direita sobre a esquerda e lentamente empurre o joelho direito em direção ao chão. Atenção para não deixar a nádega desencostar da cadeira.
3 repetições com cada perna, mantendo a posição por 30 segundos
EXERCÍCIO 2
Deitado de barriga para baixo, com uma caneleira de 1 kg em cada tornozelo, dobre os dois joelhos a 90 graus e mantendo os joelhos juntos deixe seus pés tombarem para as laterais (se aproximando do colchão). Tente relaxar nessa posição. Se for difícil relaxar, você poderá tirar os pesos do tornozelo e pedir para que outra pessoa o auxilie, empurrando delicadamente um pé para cada lado. Cuidado para não aumentar a curvatura da lombar; mantenha o seu abdome contraído.
5 repetições, mantendo por 20 segundos
EXERCÍCIO 3
Deitado de barriga para cima com braços ao longo do corpo levemente afastados e palmas das mãos voltadas para cima, junte as plantas dos pés afastando os joelhos, mantendo-os apoiados em um travesseiro para relaxar a musculatura interna da coxa. Mantenha o abdome contraído para que a região lombar fique totalmente apoiada no chão.
3 repetições, mantendo por 30 segundos
EXERCÍCIO 4
Deitado de barriga para cima na beira de uma maca, abrace a perna direita em direção ao tronco, mantendo os ombros próximos da maca e a coluna lombar apoiada (contraindo o abdome). Deixe a perna esquerda relaxada e peça para alguém dobrar seu joelho esquerdo levando a coxa em direção ao chão.
5 repetições com cada perna, mantendo por 30 segundos
EXERCÍCIO 5
Deitado de barriga para cima, com braços relaxados ao longo do corpo, dobre os joelhos mantendo pés apoiados no chão. Aperte uma bola entre os joelhos, mantendo a contração por 10 segundos.
20 repetições
EXERCÍCIO 6
Deitado de barriga para cima com as mãos sob os quadris, levante as pernas até que estejam formando um ângulo de 90 graus com o tronco. Mantendo os joelhos levemente relaxados (um pouquinho dobrado), abra lentamente as duas pernas contando até 5 e feche em 2 tempos (ou seja, contando até 2). Inicie esse exercício sem peso e abra a perna até um ponto que você não sinta dor. Quando sentir que está fácil pode acrescentar peso no tornozelo (o ideal é que a progressão ocorra de meio em meio quilo).
30 repetições
EXERCÍCIO 7
Deitado de barriga para cima no colchonete, com dois travesseiros apoiando a cabeça e os ombros (até a altura das escápulas), dobre a perna esquerda apoiando o pé no chão e deixe a direita esticada, rodada para fora e o pé fletido. Mantendo esta posição, eleve a perna direita tomando cuidado para não deixar a nádega desencostar do chão. Desenhe com o calcanhar 10 círculos do tamanho de uma laranja no sentido horário e 10 círculos no sentido anti-horário, sem deixar que seu joelho dobre ou vire para dentro e abaixe a perna.
2 séries de 10 círculos em cada sentido com cada perna
EXERCÍCIO 8
Deitado sobre o lado esquerdo, com a cabeça apoiada na mão esquerda e a mão direita apoiada à frente do corpo, deixe suas pernas levemente à frente da linha do tronco e esticadas. Estenda o pé direito, rode o joelho direito para fora (em direção ao teto), levante um pouco a perna direita (o suficiente para desencostar da perna esquerda), desenhe 10 círculos no sentido horário e 10 círculos no sentido anti-horário e abaixe a perna. Lembre-se de manter o joelho esticado e rodado para fora durante todo o exercício.
2 séries de 10 círculos em cada sentido e com cada perna (deite sobre o lado direito para trabalhar a perna esquerda)
EXERCÍCIO 9
Prenda um elástico (garrote ou faixa elástica) numa mesa ou espaldar. Sentado numa cadeira com o seu lado direito próximo ao elástico (como na foto), enganche-o no tornozelo direito. Mantendo o joelho esticado, aproxime a perna direita da esquerda, mantendo a posição por 5 segundos. Este exercício vai trabalhar a região interna da coxa.
30 repetições com cada perna, invertendo o lado para repetir com a perna esquerda
EXERCÍCIO 10
Prenda um elástico (garrote ou faixa elástica) numa mesa ou espaldar. Sentado numa cadeira com o seu lado direito próximo ao elástico (como na foto), enganche-o agora no tornozelo esquerdo. Mantendo o joelho esticado, afaste a perna esquerda da direita, mantendo a posição por 5 segundos. Este exercício vai trabalhar a região externa da coxa.
30 repetições com cada perna, invertendo o lado para repetir com a perna direita
EXERCÍCIO 11
Usando uma bola para exercícios, deite de barriga para cima sobre ela, mantendo os pés e as mãos em contato com o chão e relaxe. O objetivo deste exercício é relaxar a musculatura abdominal.
3 repetições de 30 segundos
EXERCÍCIO 12
Em pé, apóie o pé direito numa barra ou cadeira, mantendo os dedos apontados para frente. O objetivo é alongar a musculatura interna da coxa; caso não sinta alongar é sinal que o apoio do pé está muito baixo.
3 repetições com cada perna, mantendo por 30 segundos
EXERCÍCIO 13
Em pé, apóie o pé direito numa barra ou cadeira, mantendo agora os dedos apontados para cima. Alonga a musculatura interna da coxa incluindo os rotadores do quadril. Como no exercício anterior, caso não sinta alongar é sinal que o apoio do pé está muito baixo.
3 repetições com cada perna, mantendo por 30 segundos
A pubalgia é um grande desafio na medicina esportiva. Não é apenas um problema para ser diagnosticada, mas também de difícil tratamento. Se não tratada corretamente pode se tornar crônica e atrapalhar a vida esportiva dos atletas. É uma patologia que requer um acompanhamento multidisciplinar. Siga a orientação do seu médico e procure um profissional capacitado para acompanhar a sua reabilitação. O fisioterapeuta poderá utilizar técnicas de terapia manual e correções posturais como RPG (Reeducação Postural Global) para proporcionar uma recuperação segura e completa (sem recidivas). Dessa forma você não sentirá tantas saudades da corrida…