Em uma época de proliferação dos recursos tecnológicos em nosso cotidiano, vamos deixando as sensações e o foco em segundo plano. Não só na corrida. No dia a dia como um todo. Ficamos tão dependentes desses “mecanismos” que, na falta de um, cria-se uma sensação de perda, de confusão, de não saber o que fazer. Não nos concentramos nas tarefas. Fico feliz quando vejo ações que visam modificar esse panorama, como os treinos cognitivos na segunda edição do Desafio Pharmaton. Todo corredor (com ou sem treinador) deveria frenquentemente disputar provas e treinos sem relógio, GPS, iPod e o que mais de tecnológico existir. Controlando o corpo, as passadas, a mente… Só tende a ganhar.
Atletas da assessoria esportiva Saúde & Performance, comandada pelo técnico Cláudio Castilho (que levou Adriana Aparecida da Silva à Olimpíada de Londres), participaram dos treinos cognitivos. A iniciativa envolverá as oito equipes participantes da edição deste ano do Desafio. A proposta é que os corredores descubram como controlar o desempenho sentindo o próprio corpo. Concentrando-se na passada, na respiração, na técnica, nos movimentos como um todo, na sensação de esforço (se podemos manter o ritmo, apertar, reduzir…). Excelente.
Entre os exercícios, houve uma programação com quatro séries de três minutos correndo à vontade para, em seguida, encarar mais 15 segundos da atividade na qual deveriam contar as passadas. Tudo isso com o tempo sendo controlado pelo treinador. Depois, foram mais quatro séries de dois minutos de corrida com a meta de tentar diminuir o número de passadas a cada 15 segundos. Dessa forma, os praticantes mantiveram foco total no movimento e no ritmo, com possibilidade de enormes ganhos no processo de aprendizagem motora.
“Foi uma atividade bastante esperada por todos os alunos participantes do Desafio Pharmaton. O tema é rico e propõe muitas possibilidades de trabalho. Todos ficaram bastante impressionados com a rápida resposta a este tipo de estímulo”, disse Claudio Castilho. “O estímulo cognitivo é fundamental no processo de autoconhecimento e domínio dos movimentos e gestos corporais, sem dizer que isso é parte importante da formação do corredor.”
Costumo fazer treinos de ritmo e provas sem qualquer controle de tempo, mas buscando completá-las dentro do esperado. É difícil? Claro que sim. Mas confesso que, até, na questão da busca por recordes pessoais, a meu ver, quebra-se uma “barreira mental”. Um exemplo: você está se sentindo bem na prova, mas olha para o GPS ou frequencímetro e vê que está em um ritmo mais forte do que o previsto. Daí, mentalmente, cria um bloqueio e reduz com medo de quebrar. Mas nenhuma sensação diz que iria quebrar… Se estivesse sem um controle rígido, manteria o ritmo pois estava sentido-se muito bem…
Pessoalmente, fiz por exemplo 39:37 nos 10 km da Tribuna, em Santos, sem qualquer controle, correndo somente. Claro que estava treinado, mas corri conforme minhas sensações no momento. Ontem, em Bragança Paulista, pelo resultado extraoficial, fiz 40:29. Estou em período de base, recuperando do pós-maratona, fui para fazer um treino de luxo, pensando em algo em torno de 43 minutos, mas acabei me sentindo bem e deixei o corpo me controlar… sem forçar, considero um ótimo tempo, ainda mais em um percurso com subidas… Faça essa experiência, sempre, você só tem a ganhar. Saber “ouvir” o corpo é fundamental na corrida. E no dia a dia também!
Foto: Luiz Doro/Adorofoto