Quem me conhece, sabe que gosto de treinar, de baixar meus tempos, de velocidade. O gostoso da corrida é esse, desafiamos a nós mesmos. Mas, ao mesmo tempo, adoro estar nas montanhas, em contato com a natureza. É uma relação antagônica, pois, nas pirambeiras da vida, muitas vezes, correr fica impossível. Porém, dá uma sensação diferente, que não tem a ver com o tempo. Entretanto, tão gostosa quanto reduzir o tempo em uma maratona no asfalto. Foi assim no final de semana, na K42 Ubatuba.
Nas montanhas, não dá para comparar tempos. Isso não existe. Você pode usar como referência a mesma prova, percurso e condição climática (uma prova com sol é totalmente diferente de uma com chuva ou piso molhado, o que pode significar muitas vezes mais de 1 hora). Agora, nesta vida de corredor, o máximo que tinha ficado em movimento foi na minha primeira maratona, a de estreia, em 2010, quando completei São Paulo com 3h47. Depois disso, seja em provas ou treinos, nunca superei as 3h30 (3h27 na segunda maratona, em Curitiba, e 3h20 em um longão de 44 km no primeiro semestre).
Imaginava, fazer algo perto das 4h, 4h10 em Ubatuba. Acima disso, que já seria muito para mim, sabia que o corpo iria gritar, pedir água literalmente. E fomos para a prova, meio que no escuro. Primeira edição no Litoral Norte paulista, após cinco anos em Bombinhas, e sem muitas informações, pois o congresso técnico não esclareceu nada (esse, adiantando, um dos pontos que precisa de melhora para 2015). Mas estava animado. Ubatuba faz parte de minha vida, da época de criança e início da adolescência, principalmente.
E a prova foi inesquecível. Por dois motivos. Tornou-se (até agora, pelo menos), a mais difícil e mais longa que já participei, com 4h30. Passamos por areia dura e fofa, subidas por asfalto, terra e trilha, uma mais íngreme que a outra. Chequei com a organização, 56% e até mais de inclinação! Travessia de rios (eu, com todo esse tamanho, afundei bastante), mangue (com lama até o joelho e, se o tênis não estivesse bem amarrado, seria “doado” à mãe natureza), trilhas no meio da mata sem caminho, com o “socorro” de galhos, cipós e cordas para tentar se manter em pé, outros trechos fazendo “esquibunda”…
Passei a primeira metade com 1h55, tranquilo, mantendo uma estratégia do início ao fim. Parar em todos os postos de hidratação, bebendo bastante água, jogando muito no boné, cabeça e nuca. Intercalando, isotônico em um ponto e gel de carboidrato. Foram mais três paradas ainda extras: uma com ajuda de moradores, após o mangue, para literalmente lavar as pernas e o tênis. Outras duas, para tirar as pedras e barro dos rios cruzados. O primeiro terço tem um visual de tirar o fôlego, lindíssimo, seja pelo litoral quanto pela vista do alto. Algo para apreciar e guardar na memória.
Até a passagem pela Praia do Tenório (de lembranças familiares também, pois minha avó Letícia adorava o local e corri o trecho todo recordando dela e como era feliz ali, dos momentos únicos que só passamos com os avós), no km 35, tudo dentro dos conformes. Fecharia com 4h tranquilamente… depois, ri muito de minha estratégia.
Começou, então, a subida do Morro da Antena (se bem que a palavra subida não explica bem o que era), mas sabia, se estamos indo para o alto, vamos despencar para baixo, ou seja, conseguirei acelerar um pouco ainda. E realmente despencamos, no meio do mato, sem caminho (aí, um ponto a se destacar, durante os pouco mais de 42 km da prova, a sinalização esteve perfeita, corri muitas partes sozinho e não tive dúvida alguma de onde tinha que ir). Resumindo, 34 minutos para dois quilômetros! Isso mesmo, 18 minutos em um e 16 no outro (chequei no GPS ao final da prova). Tive muitas câimbras nas duas panturrilhas no final da subida e em toda a descida. Nunca tinha sentido isso, a perna endurecia. E uma garota do staff avisou: “está todo mundo assim”.
O engraçado é que nessa parte final, não olhei no relógio, curti as dificuldades, enfrentei a sobrecarga do corpo e me diverti. Em nenhum momento, pensei em parar. Era ir em frente, chegando quando chegasse. Acabei fazendo uma boa prova, em 12º no geral e segundo na faixa etária dos 40-44 anos (com um belo troféu voltando para Jundiaí), mas isso ficou em segundo plano: a satisfação foi única por ter enfrentado de frente a prova mais longa e difícil que já corri.
A K42 Ubatuba tem muitos pontos para melhorar (congresso técnico, que já falei; uma melhor organização da largada/chegada pois ficaram bem longe uma das outras; arena da chegada; agilidade na premiação e a festa de encerramento, uma tradição do evento, que acabou não ocorrendo neste ano), mas a impressão foi bem positiva.
Fotos: Marcos Viana Pinguim/Patagônia Eventos
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Olá André!!!
Me lembro que na véspera e no dia da prova você me disse que não continuaria acima de 4 horas de prova, justamente pelo motivo de nunca ter corrido acima desse tempo, me lembro que fiquei incentivando você e sua esposa para continuar até o fim ou enquanto vocês estivessem se sentindo prazer em continuar a correr na prova, lendo este texto percebe-se que foi justamente isso que aconteceu. Fiquei feliz em saber que você completou e quebrou de vez essa barreira de tempo (de não correr acima de 4 horas), mesmo assim pelo fator de existir vários trechos impossíveis de correr seu tempo de 4h30m é considerado de elite, creio que participando de mais maratonas desse tipo você tem possibilidade de muito em breve poder disputar um pódium geral. Um grande abraço!!!
Parabéns André pela bela conquista!