Notícias admin 4 de outubro de 2010 (1) (168)

158 km pelas montanhas de Mont Blanc

Tudo começou em dezembro de 2005 quando eu (Décio Ribeiro) e André Arruda descobrimos esta prova no site da Petz (marca de equipametos de escalada) e ficamos logo apaixonados. Fizemos a inscrição mesmo sem ter certeza que iríamos.

Apesar de nossa paixão (e experiência) pela corrida, ultramaratona e corridas de aventura, decidimos fazer vários treinos específicos para enfrentar o desafio de Mont Blanc. Ao longo do 1o semestre realizamos treinamento na Serra Fina (conhecido como trekking mais difícil do Brasil) na região da Serra do Mar, entre as cidades mineiras de Itamonte e Passa Quatro, subimos o pico da Pedra da Mina, (4º mais alto do Brasil com 2.797m), o de Agulhas Negras no Parque de Itatiaia, entre os estados do Rio e Minas, a travessia Itaguaré Marins, alem dos treinamentos para a Comrades (90 km) na África do Sul (em junho), onde o André participou pela 4a vez consecutiva.

Mesmo assim, com 1.600 km de treinamento, ainda não tínhamos certeza se estávamos devidamente preparados. Isto porque as poucas informações que dispúnhamos sobre a prova nos deixavam assustados, pois na Europa, apesar do trekking (caminhadas longas em percursos difíceis) ser muito praticado, especialmente na região de montanhas (Alpes) onde está o Mont Blanc, apenas um terço dos inscritos terminam o Ultra Trail. Em 2005 haviam sido 2.000 inscritos e apenas 700 concluíram a prova dentro do tempo limite de 45 horas.

Para tentar ter uma melhor visão do que iríamos enfrentar, decidimos comprar pela internet os DVDs da prova de 2004 e 2005, o que nos informou bastante, porém o medo ainda persistia, pois os DVDs só mostravam as partes boas e bonitas.

Treino final na Suíça. Enfim, devidamente preparados ou não, viajamos dia 19 de agosto para Chamonix, na França, só que para nos dar um pouco mais de segurança fizemos uma parada em Interlake e Zermat, na Suíça, onde dia 21 realizamos um último treino especifico de 4 horas de subida, com desnível de 1.800m, a 3.000 m de altitude.

Dia 22 seguimos para Chamonix, passando pelo túnel do Mont Blanc de 11 km de extensão – uma maravilha de tecnologia. Ao chegar estávamos ansiosos para sabermos noticias da prova, porém fomos informados que a feira e o congresso técnico para a passagem das informações sobre a prova para os participantes seria somente dois dias depois. Então aproveitamos para passear e conhecer um pouco mais de perto a famosa montanha; de bondinho subimos até Agulhas de Midi a 3.842 m de altitude, onde dá para ter uma visão mais próxima do famoso Mont Blanc, que fica 4.882 m, a mais alta montanha da Europa. O lugar é realmente fascinante.

Enfim, na quinta fomos à feira do evento, onde pegamos nossos números, fizemos nossa checagem de material obrigatório (ver quadro), e encontr amos a brasileira Maxilene, casada com o francês Franck, experiente na prova e em outras do mesmo gênero pelo mundo, que nos deram várias dicas.

Do lado da checagem obrigatória havia um ginásio onde se podia deixar dois sacos de apoio (com roupas, tênis, alimentos), que ficariam à disposição em dois em locais estratégicos (Courmayeur no km 72, já na Itália, e em Champex-Lac, na Suíça, km 117). O que nos chamou a atenção na perfeita organização foi a integração entre os povos dos três paises, a solidariedade das pessoas em querer ajudar e a excepcional infra-estrutura durante a prova.

Largada à noite. Dia 25, enfim, a largada, às 19h05. A prova começa com trecho de 8 km no plano pelas trilhas de Chamonix, porém logo após a passagem do primeiro PC em Lês Houches, os bastões de trekking já seriam sacados para enfrentar a primeira subida sentido a Contamines (km 25).

Optamos por sair com mochila um pouco mais cheia de água (2 litros) e uma caramanhola (garrafinha de plástico) de isotônico para não parar logo nos primeiros PCs para abastecimento, por causa do congestionamento, e concordamos também em correr no plano e caminhar forte nas subidas.

Os postos de abastecimento eram fartos e muito bem organizados, algo realmente impressionante, com Coca Cola, água com e sem gás, frutas variadas, chocolate em barras ou quente, sopa, macarrão.

Aqueles dois pontos estratégicos, Courmayeur km 72, e Champex-Lac km 117, onde estavam os sacos para reposição de roupa e alimento, eram ainda mais completos, pois havia um grande espaço pra massagem, banho, podólogo, enfim, um suporte total.

A intenção focada em terminar a prova nos deixava preocupados apenas em não pegar os pontos de corte que havia em alguns PCs. Fazíamos bem o papel de dupla, com um "puxando" o outro em determinados trechos da prova, incentivando e orientando na hora certa. Isto sempre esteve presente em nossa estratégia, apesar do receio do André por nunca ter ficado duas noites sem dormir, como acontece em corridas de aventura de longa distância. Parávamos poucas vezes, por 5 ou 10 minutos no máximo. para abastecimento e descanso e seguíamos em frente, com exceção daqueles dois pontos estratégicos, em que paramos por 1 hora.

Acompanhamento pelo site. Apesar dos vários pontos de controle, a tecnologia está presente nesta prova, com cronometragem por chip, sendo ele fixado ao número levado pelo atleta no peito. Graças a esse suporte informático, amigos e parentes podiam ir acompanhando a atuação dos corredores pelo site da prova, que informava, on line, o tempo e o local que cada participante está durante a prova.

Como acontece em toda prova longa, imprevistos, lesões, acidentes estão sempre presentes, e conosco não foi diferente. Próximos de completar 100 km do percurso, André começou a sentir fortes dores em seu joelho direito, obrigando-nos a diminuir um pouco o ritmo. Mas estávamos com uma vantagem de quase 7 hora do corte, detalhe que nos mantinha um pouco mais tranqüilos. As dores se agravavam nas descidas, devido ao impacto, porém as dificuldades aumentaram quando, por volta das 20 horas de sábado. saindo de Champex-Lac, pegamos chuva por toda noite, deixando os trechos bem mais escorregadios e perigosos, principalmente em Bovine e Vallorcine, km 126 a 142 respectivamente, onde levamos 7 horas pra cumprir esta etapa.

Sabemos que tudo que é mais difícil também é mais gostoso, e dessa forma, ao passamos por Vallorcine rumo a Argentiere (km 149), a contagem regressiva já começava, e nem aquela longa e fria madrugada nos desanimou.

Nos últimos 9 km, de Argentiere a Chamonix, onde tudo começou, era questão de manter a calma, pois os quilômetros não passavam, e não dava pra aumentar o ritmo; então vinha a experiência de contar o tempo a cada km vencido, pois nossa missão de concluirmos a prova e representar bem nosso país já estava se tornando realidade. Às 7h44 do domingo rompemos a linha de chegada em Chamonix, empunhado a bandeira de Brasil e nos tornando os primeiros brasileiros a concluir os 158 km do Ultra Trail Tour de Mont Blanc, imponente, assustador, porém fascinante! Terminamos na 357ª e 358ª posição, em 36h44.

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One Comment on “158 km pelas montanhas de Mont Blanc

  1. Serra Fina, é na serra da mantiqueira e não na serra do mar.

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