Blog do Corredor Notícias Redação 12 de julho de 2011 (0) (108)

Maratona de Nova Jersey

A Maratona de Nova Jersey, não muito conhecida pelos corredores brasileiros, é realizada sempre no primeiro domingo de maio pelo mesmo grupo que organiza, dentre outras provas mais famosas, a Maratona e Meia de Miami em janeiro, e a Meia de Chicago em setembro.  O evento começa no sábado com uma Family Run de 5 km e uma Kid`s marathon de 2 km, num evento com animação infantil e outros atrativos para a família. No domingo, além da maratona, são realizadas uma meia e um revezamento de meia-maratona para dois atletas, mobilizando entre 10 e 15 mil corredores. Nesta edição foram 11 mil corredores de 22 países e de 47 dos 50 estados norte-americanos.  A prova é qualificatória para Boston e foi uma das 50 maratonas feitas em 50 dias na famosa jornada de Dean Karnazes.

Este ano meu plano era correr Porto Alegre e Chicago.  Eu estava com sangue nos olhos depois de ter quebrado na fria e chuvosa Berlim 2010, quando completei com 3h42, enquanto tinha o objetivo de fechar abaixo de 3h30. Por esse motivo queria provas "planinhas" em 2011.  Contudo, em dezembro de 2010 minha mulher me fez mudar radicalmente os planos – "Bruno, você vai ter que trazer a maratona de Chicago para o 1º semestre. Estou grávida, o bebê vai nascer em julho e quero aproveitar para fazer umas comprinhas…".  Óbvio que fiquei radiante e comemoramos muito a futura chegada de nossa Carolina. Mas a notícia me faria ter que rever radicalmente os planos. Pela minha periodização eu não estaria pronto antes de abril e, considerando a gravidez da Patrícia, eu teria que estar de volta ao Brasil antes do final de maio. Precisava arrumar uma prova nesse período que atendesse a ambos os planos – minha meta pessoal na maratona e o objetivo de compras do enxoval nos EUA.

Comecei a pesquisar as maratonas planas nos EUA no 1º semestre e encontrei Nova Jersey – na época que eu precisava e supostamente mais plana, menos gelada e menos lotada que a de Nova York. A prova é realizada numa cidade a 80 km de Manhattan, com bons outlets e com impostos mais baixos. Fiz minha inscrição e comecei a planejar minha viagem e a treinar forte. Meu objetivo era correr a maratona abaixo de 3h30.

Ficamos em um bom hotel na orla marítima de Long Branch, a 200 metros da largada e chegada da maratona – posição estratégica considerando a gravidez da minha esposa. Infelizmente 10 dias antes da prova peguei uma gripe e logo ao chegar à cidade me assustei com o vento frio que vinha do mar. A temperatura durante o dia beirava os 20 graus, porém cedo pela manhã e no cair da tarde era bem mais baixa.

Visitei a feira da maratona no sábado à tarde. Bem modesta, havia estande de apenas uma grande marca de tênis e os outros eram de revendedores multimarcas com algumas promoções interessantes.  O kit era simples, composto de material promocional e uma boa camiseta manga longa de material reciclado produzido por uma organização beneficente. Chamou-me atenção o número de peito com chip plástico colado no verso, semelhante ao fornecido na última São Silvestre.

 

LARGADA FÁCIL. O domingo amanheceu lindíssimo, sem nuvens. A largada aconteceu às 8 h e com temperatura de 13 graus (a meia-maratona e o revezamento partiram juntos 30 minutos após).  Situei-me bem à frente e com 15 segundos já havia passado sob o pórtico. No início houve a aglomeração de corredores que é normal para esse porte de prova, mas na primeira milha (não havia marcação em quilômetros) já era possível correr sossegado.

A maratona divide-se em dois trechos principais. O primeiro é feito junto com a meia-maratona e percorre o interior da cidade de Oceanport, então retornando para Long Branch. Esta é uma região menos favorecida economicamente, onde encontramos aquele modelo tradicional nos EUA de casas simples, pré-fabricadas em madeira e sem grades ou cercas no terreno. Havia muitas pessoas em todo o percurso apoiando bastante os corredores. Neste trecho passamos sobre três pontes com subidas leves. 

Nesse primeiro trecho corremos num mormaço gostoso, com temperatura em leve ascensão e sem vento. Na altura do km 15 passei por trás do hotel onde nos hospedamos – como combinado, lá estava minha esposa com seu sorriso lindo me enchendo de energia. Havia muitas pessoas apoiando os corredores naquela esquina e vários gritaram para mim "Go Brazil!". Bateu uma euforia tão grande que num gesto impensado abri os braços como se estivesse abraçando a todos e fiz a curva repetindo o "aviãozinho" do nosso querido Vanderlei Cordeiro. Eu estava correndo fácil, dentro da meta e muito confiante, apesar de estar expelindo muita secreção pelo nariz. Esse primeiro trecho termina no km 18,5 quando, a meia-maratona faz o retorno para o ponto da largada e os maratonistas continuam sua rota para o sul de Nova Jersey. 

 

SEGUNDO TRECHO BEM DIFERENTE. Neste ponto inicia-se o segundo trecho, com diferenciais marcantes. Após contornarmos o fedorento lago Takanassee, passamos por regiões visivelmente mais abastadas, com enormes casas de veraneio e residências nobres. O outro lado desta moeda é que a região é bem mais deserta e, portanto, corremos bons trechos sem apoio do público. Nesta parte nada de subida, mas muito vento e gelado, que passou a ser meu maior desafio. Cruzamos as pequenas cidades de Deal e Allenhurst, e por volta do km 28 contornamos o bonito lago Deal, onde por causa do vento meu ouvido direito já estava completamente tapado e doendo, assim como minha cabeça – mas segui firme na minha meta. Passei os 30 km com 2h28, portanto dentro do alvo.

Contudo, o retorno foi um suplício. Em função do vento, as dores no ouvido e na cabeça se intensificaram. A partir do km 34 não consegui mais manter o ritmo de 4:55/km e pouco conseguia admirar o percurso. Os três quilômetros finais são literalmente na beira-mar, num trecho lindíssimo, repleto de apoio popular, o que foi fundamental para que eu me mantivesse focado. Eu só pensava que não havia treinado tão pesado durante 4 meses para amolecer no final. Estava louco para chegar logo! Meu tempo líquido foi de 3:35:10, com meu Garmin marcando 42,6 km (o que sabemos ser absolutamente normal, em função das várias curvas que percorremos numa maratona). A temperatura na chegada era por volta de 18 graus e minha alegria tanta que nem lembrava mais da dor. Confesso que antes da prova eu tinha medo de não completá-la em função da gripe. Então, fechar apenas 5 minutos acima da meta foi muito bom. Quanto ao sub 3h30 fica para uma outra vez, e vou buscar.

Um detalhe importante da prova foi o abastecimento extremamente eficaz. Havia Gatorade e água a cada 2,5 km, sempre nesta ordem, com fartura e sem tumulto. A organização disponibilizou ainda, em 4 pontos, carboidrato em gel. Durante todo o percurso o asfalto era um verdadeiro tapete e em alguns trechos na orla marítima corremos sobre um deck de madeira absolutamente estável. A prova foi vencida pelos americanos Oz Pearlman, de 28 anos, em 2h28, também campeão em 2008, e Bronawyn Oleary, de 35 anos, em 3h02.

ENTREVISTA COM O ORGANIZADOR

No intuito de enriquecer esse artigo me aventurei como "repórter por um dia" e fiz uma entrevista com o diretor da prova, Art Castellano.  Art foi extremamente receptivo e, mesmo muito atarefado, quando soube tratar-se de uma matéria para uma revista brasileira me recebeu com muita cordialidade. Art já correu 118 maratonas, pretende correr sua próxima no Rio de Janeiro neste ano e afirma que, quando se aposentar da organização de eventos esportivos, vai correr muito mais.

Perguntei a ele o porquê dessa prova tão agradável e bem-organizada não atrair atletas profissionais, assim como questionei quais ele considerava os grandes diferenciais dessa maratona. Art então fez uma revelação que demonstrou a verdadeira grandeza da Maratona de Nova Jersey. A prova tem como principal objetivo a caridade. Os organizadores a promovem sem fins lucrativos e todos os recursos arrecadados, após cobrirem os custos do evento, são destinados a instituições de prevenção, combate e pesquisa na cura de doenças.

Diversas das instituições beneficiadas estavam representadas na prova, com tendas e dezenas de corredores uniformizados. Com os bons patrocinadores que a prova tem e os recursos provenientes do pagamento da taxa de inscrição dos corredores (que não é barata – 135 dólares) cerca de 2 milhões de dólares são arrecadados! Art afirmou que eles poderiam destinar uma parte para a premiação dos vencedores e assim transformar essa numa prova de grande atratividade para atletas profissionais, mas estes recursos fazem total diferença para as instituições beneficiadas. Um belo exemplo que infelizmente não conseguimos repetir no Brasil. Maiores informações no site www.njmarathon.org.

* BRUNO PIRES BANDAROVSKY é assinante de São Paulo

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