Com corridas praticamente todos os finais de semana pelo Brasil, cresce a concorrência entre as empresas organizadoras e as exigências dos participantes. Nessa equação, os kits estão na parte central da discussão, surgindo uma dúvida: "Corre-se para ganhar o kit ou pelo prazer de correr?" Muitos corredores, principalmente os que começaram no esporte há mais de dez anos, lembram com saudosismo do tempo em que o kit nem fazia parte das conversas. Por outro lado, os organizadores citam uma maior exigência nos dias atuais e afirmam que, se não montarem um kit recheado e de qualidade, incluindo camisetas em tecidos ditos "tecnológicos", além de outros mimos, a crítica é mais do que certa, especialmente se a taxa cobrada for alta, como acontece hoje nas capitais e grandes cidades brasileiras.
"Desde o começo, nunca me preocupei com kits, até porque no início nem tinha. Sempre me inscrevo nas corridas por prazer, para sentir o meu corpo ser exigido ao máximo, rodeado de pessoas que fazem o mesmo. De todas as corridas que já participei, tenho poucas camisas e algumas medalhas e troféus de recordação, mas as melhores e mais significativas lembranças que tenho estarão eternamente comigo, em minha memória", afirma Félix Luis Borges Vieira, de 39 anos, de Fortaleza, que corre há 14 anos e levantou a polêmica sobre os kits no Portal do Corredor (www.portaldocorredor.com), sugerindo esta reportagem para a Contra-Relógio.
Por outro lado, o custo das provas é cada vez mais elevado, e com isso os patrocinadores são fundamentais, mas que buscam exposição para suas marcas, o que é garantido, em parte, pelo kit de participação. De acordo com Adélio Demeterko, coordenador da Meia-Maratona das Cataratas, dia 3 de julho em Foz do Iguaçu, financeiramente uma prova é viabilizada com receitas de inscrições (25%) e patrocínios (75%). A projeção de receitas para a edição 2011 dessa prova é de aproximadamente R$ 500 mil (veja a tabela de custos). E vocês sentem que os atletas estão mais exigentes em relação aos kits? "Sim, se algum item do kit não tiver qualidade, é reclamação na certa", afirma Demeterko.
Edgard dos Santos, da Corpore de São Paulo, lembra que hoje o mercado tem uma grande quantidade de organizadores (Corpore, JJS, Latin Sports, Yescom, Spiridon, Corpa, Ecofloripa, Procorrer, Iguana, Vetor…), oferecendo ao atleta inúmeras oportunidades de participação em provas. "O orçamento doméstico do corredor é um balizador importante e interfere na decisão sobre em qual prova se inscrever e participar. Assim, é natural que o atleta busque a melhor alternativa (custo x benefício) para aplicar seu dinheiro, procurando aliar prazer de correr, integrar-se à equipe, correr com amigos, participar de evento atraente (distância, percurso, local etc.)", afirma Edgard.
Obrigado, só o kit… Mas dependendo da prova, há realmente quem se inscreva apenas para retirar o kit. "Quando realizamos as provas da Nike (Run Americas, Human Race), pelo preço da inscrição e pela qualidade da camiseta oferecida, registramos muitos casos (2% dos inscritos) em que o atleta apresentava-se para retirar seu kit e declinava em levar o chip, alegando que não iria correr e que só se inscrevera pelo kit", diz Edgard. No geral, na Corpore, em torno de 6% a 10% dos inscritos deixa de participar dos eventos. "Mas não temos o mapeamento das causas", explica o diretor da entidade.
Esse número é parecido com o do Clube dos Corredores de Porto Alegre (Corpa). "Normalmente, de 7% a 10% não retiram os kits e o número de quem não participa chega fácil entre 15% e 20% (dos inscritos). Só nas provas de revezamento, porque há aquele comprometimento com os colegas, esse índice praticamente não existe, é muito baixo", afirma Paulo Silva, presidente do Corpa. Também é expressiva a não participação em provas da TV Globo, organizadas pela Yescom, com muita gente se inscrevendo apenas para pegar a camiseta, como se fosse um troféu a ser exibido depois.
Os organizadores são unânimes ao afirmar que o investimento nos kits se torna fundamental porque, a cada ano, o nível de exigência dos participantes aumenta. Assim, num mercado cada vez mais competitivo, a criatividade é fundamental. "Tivemos recentemente a prova da Farmácia Pague Menos que ofereceu um kit bem recheado de itens (tanto no pré quanto no pós evento) e por certo os participantes foram atraídos por ele. Na próxima edição, o boca-a-boca irá fazer com que o número de inscritos cresça", prevê o diretor da Corpore, complementando: "Entendemos que o kit é um elemento de atração e sempre buscamos junto aos patrocinadores brindes que possam valorizá-lo".
Mas apesar dessa tendência, em muitos locais ainda se faz corrida "à moda antiga", com taxas por valores bem baixos, mas também nada ou quase nada é oferecido, além do número de peito e água no percurso e chegada, como pode ser visto em Pernambuco, onde o Clube dos Corredores do Recife (Corre) organiza a corrida mais barata do Estado, como faz questão de dizer o presidente da associação, Alexandre Montenegro. "Estamos sempre procurando melhorar a qualidade do apoio oferecido ao corredor, mas não temos um kit, apenas o número do atleta", lembra Montenegro. Para 2011, estão previstas 12 corridas do Corre.
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